A decisão final sobre a
guerra dos pneus deve ser anunciada até amanhã (7) pelo Órgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC), ao final da reunião que teve início ontem.
Uma coalizão de ONGs, entre elas o Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais (FBOMS), o Greenpeace Brasil e a Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA), apóia a decisão do governo brasileiro e faz pressão para que a União Européia reveja sua posição e retire a queixa contra o Brasil.
O país proibiu em 1991 a importação dos pneus usados por causa dos riscos que esses produtos trazem ao meio ambiente e à saúde pública. A coalizão de ONGs, que conta também com a participação da Conectas Direitos Humanos e do WWF Brasil, acredita que o contencioso na OMC enfraquece os acordos multilaterais como a Convenção da Basiléia sobre o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e a Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs).
As ONGs exigem que a União Européia, que exportou cerca de 40 mil toneladas de pneus reformados e 138 mil toneladas de pneus usados em 2005, dê o exemplo de responsabilidade ambiental e gerencie seu próprio lixo perigoso.
“A UE deveria dar um exemplo para o mundo de responsabilidade ambiental e gerenciar seu próprio passivo. Despachar pneus velhos para o Brasil ou qualquer outro país em desenvolvimento é uma prática de comércio ilegal de lixo perigoso disfarçada de reciclagem”, afirma Marcelo Furtado, do Greenpeace Brasil.
Enquanto o Brasil reforma os pneus consumidos no mercado interno, a UE remodela muito pouco dos pneus consumidos no próprio bloco (a Itália, 14%, a Alemanha, 11%, a Bélgica e a Suécia, 4% cada, e Áustria, Hungria, República Tcheca e Eslovávia não reformam pneus).
Por outro lado, a UE acabou de aprovar uma nova legislação, que entra em vigor a partir de julho, que proíbe armazenamento e descarte de pneus em lixões em todos os seus países membros. O bloco terá portanto que encontrar outra solução para seus pneus usados, e com a disputa na OMC fica claro que a União Européia considera a exportação de pneus usados a solução para seu lixo.
“Levando a disputa à OMC, a União Européia está sinalizando ao resto do mundo que sua defesa do meio-ambiente é meramente oportunista e secundária a seus interesses comerciais”, disse Karen Suassuna, do WWF Brasil.
A destinação de pneus usados, conforme as ONGs, representa um sério perigo à saúde pública, já que, quando estocados, oferecem condições perfeitas para a reprodução do mosquito que transmite a dengue, além de significar riscos de disseminação da febre amarela, malária e outros problemas relacionados. A incineração, outra forma de destinação, aumentaria os riscos à saúde ao contribuir para o desenvolvimento de doenças como o câncer, lesões cerebrais, anemia, disfunções endócrinas, asma e diabetes.
“A UE não está considerando esse caso sob a perspectiva de proteção ambiental e da saúde, embora clame pela defesa desses valores na OMC”, acrescenta Temístocles Marcelos, coordenador do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS).
Representantes do FBOMS estarão em frente ao prédio da OMC em Genebra durante toda a reunião, e entregarão à entidade uma declaração assinada por 80 ONGs de 23 países.
A Coalisão
A coalizão é coordenada por: Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS), Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA), Conectas Direitos Humanos, Greenpeace Brasil e WWF-Brasil. Mais de 80 ONGs de 23 países assinam a declaração. A declaração, em 5 línguas, está disponível para download em www.rebrip.org.br .
Em 20 de janeiro de 2006 a União Européia peticionou o Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) da Organização Mundial do Comércio para estabelecer um Painel contra o Brasil questionando a restrição na importação de pneus reformados. A UE baseou sua demanda nos Artigos I:1, III:4, XI:1 e XIII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), embora centralize seu argumento em questões comerciais: a falta de compatibilidade entre restrições e os princípios internacionais que ditam o comércio.
A Convenção da Basiléia postula que pneus usados são resíduos não-desejados e reconhece, em seu manual, as dificuldades enfrentadas na destinação destes produtos.
A dengue, reconhecida pela OMC como "uma das maiores preocupações internacionais em saúde pública", atingiu o auge no Brasil em 1998 com 528.388 casos, e novamente em 2002 com 794.00 casos. Para combater a epidemia o Brasil coletou pneus descartados e fumegou estoques dos mesmos despendendo R$ 4,5 bilhões (US$ 2 bilhões - EUR 1,7 bilhões) de seu orçamento para controle da dengue.
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(Com informações do Fórum Brasileiro de ONGs)