Finlândia, que assumiu a presidência semestral da UE, destaca que a propagação da energia nuclear não faz parte da política conjunta do bloco
2006-07-05
Em entrevista à DW-WORLD, o ministro finlandês do Exterior, Erkki Tuomioja, fala das relações com a Rússia e afirma que enfrentará o ceticismo de seu povo a fim de preservar a legitimidade do projeto europeu. A Finlândia assumiu, neste sábado (01/07), a presidência semestral da União Européia com as metas de inovar na política interna e fortalecer a cooperação com a Rússia, seu poderoso vizinho, no âmbito externo.
DW-WORLD: Um dos temas centrais da Finlândia na presidência da UE são as relações com a Rússia. Como a o país pretende conduzir as negociações com o vizinho oriental e quais experiências pode partilhar com as demais nações européias?
Erkki Tuomioja: Nós tivemos experiências muito positivas com a Rússia, inclusive na questão energética, que se tornou significativa nas relações dos europeus com os russos. Somos a favor de uma política aberta e transparente e de preços normais de mercado. Afinal de contas, a dependência é sempre bilateral: enquanto, por um lado, nós dependemos do gás natural russo, eles dependem do nosso mercado. A Rússia precisa de investimentos e tecnologias que venham da Europa, para poder manter e ampliar sua produção energética.
A Finlândia é o primeiro país do oeste europeu a construir uma usina nuclear depois do acidente de Tchernobil. O país pretende propagar o uso deste tipo de energia na Europa?
Alguns políticos podem até fazê-lo, mas isso não faz parte da política conjunta européia. A energia nuclear sempre foi e ainda é uma questão controversa na Finlândia. A opção por este tipo de energia cabe a cada país, que também decide como irá utilizá-la. Não existem possibilidades nem motivos para aspirarmos a uma política conjunta. A questão da segurança nuclear é, entretanto, um dos pontos em que todos os países-membros da UE devem seguir altos padrões estabelecidos internacionalmente.
Um segundo foco da política externa, ao lado da Rússia, é a Sérvia. As relações da União Européia com o país balcânico ficaram tensas em virtude da falta de cooperação com o Corte Internacional de Justiça, em Haia. O ex-presidente finlandês e mediador, Martti Ahtisaari, auxilia na resolução do impasse?
Na realidade, não. Ele é um representante das Nações Unidas, não da União Européia. Mas a UE terá um papel no processo de paz. Independentemente da questão do Kosovo, é importante que mantenhamos o diálogo e a cooperação com os sérvios. A Sérvia é um país europeu, que precia ter a possibilidade de se vincular às estruturas européias. No momento, a insuficiente cooperação com a Corte de Haia é um lamentável obstáculo, que esperamos poder eliminar em breve.
O povo finlandês é um dos mais críticos da UE, segundo pesquisas de opinião pública. A presidência finlandesa vem na hora certa diante crise no bloco, com seu abalado projeto de Constituição?
Talvez, sim, pelo fato de termos uma relação pragmática com a UE. Apesar de muitos de nossos cidadãos adotarem uma posição crítica em relação à UE, isso nunca foi um problema político. Nós conseguimos conduzir a política do bloco de forma tranqüila no Parlamento nacional e no governo. Assim, pretendemos dar continuidade às coisas na nossa presidência. O ceticismo dos finlandeses é um reflexo do desenrolar da questão em outros países.
Quanto à Constituição, muitos finlandeses pensam assim: "Por que devemos dizer sim, se os franceses e holandeses já disseram não?" Mas isso não significa necessariamente que os finlandeses rejeitam o tratado. O Parlamento decidiu no começo de junho passado dar início ao processo de ratificação. Qual é o risco de que o pragmatismo finlandês em relação à burocracia caia por terra, se os próximos seis meses forem vistos apenas como um período de transição? Muitos na Europa esperam ansiosamente pela próxima presidência, que será alemã. O período até lá transcorrerá sem grandes decisões?
Nós vamos continuar trabalhando, e é claro que decisões também serão tomadas. Mas nenhuma presidência, seja o país grande ou pequeno, fará milagres. Um país grande pode decidir, no máximo, por pagar mais. O dinheiro desempenha um papel importante e a Alemanha é o maior contribuinte líquido da UE.
Em que medida a Finlândia pode e quer tentar obter vantagens próprias e para os demais países menores durante sua presidência?
Eu acredito que um ponto forte do bloco é que as decisões são tomadas de acordo com as regras do jogo comuns – os países pequenos e grandes têm a mesma participação. O número de habitantes não é um critério de separação, e só vem à tona em questões como as negociações constitucionais, onde nós nos posicionamos a favor dos países menores. Eu não acredito que a Finlândia tenha interesses ou objetivos nacionais que tenhamos de impor contra os objetivos da União Européia.
(Deutsche Welle, 04/07/2006)
http://www.dw-world.de/dw/article/0,2144,2078572,00.html