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2006-07-04
O Maranhão geme de dor. “É o gemido das matas e do cerrado devastados pelo avanço acelerado e violento das monoculturas da cana e da soja, do eucalipto e do bambu; é o gemido das matas que são transformadas em carvão para o abastecimento das usinas de ferro-gusa; é o gemido de milhares de famílias do Baixo Parnaíba, que, neste ultimo ano, assistiram impotentes à grilagem e à devastação anunciada de quase dois milhões de hectares de cerrado”.

Esse é um dos trechos da dramática carta que os fiéis, diáconos, padres e bispos de todas as Dioceses do Maranhão, reunidos em assembléia regional, em São Luiz, de 22 a 25 de junho, encaminharam aos chefes dos três poderes da Republica e ao governo estadual pedindo providências para aliviar a situação de grave instabilidade social em que vivem hoje as famílias camponesas daquele estado.

Na carta, os religiosos falam também do gemido dos povos indígenas maranhenses, que choram pelo assassinato e criminalização de suas lideranças. “À violência explícita junta-se o descaso com a saúde dos indígenas: entre 2005 e 2006, vinte e duas crianças Guajajara, das aldeias Bananal e Ipu, morreram por desnutrição e falta de atendimento médico”, diz a carta, ao lembrar ainda o descaso para com a reserva indígena Awá-Guajá, onde o governo federal ainda não cumpriu a decisão judicial de retirar os não índios que ali se encontram ilegalmente e nem a Justiça Federal julgou definitivamente o processo de demarcação do território destes grupos étnicos ameaçados de extinção.

Devastação e ameaças de morte
Outros graves gemidos são lembrados pelos religiosos. “É o gemido dos ribeirinhos da Baixada Ocidental, que assistem à devastação dos campos e às ameaças mortais a sua economia pelos criadores de búfalos. Enquanto isso, o Estado os criminaliza por intermédio do aparelho policial e se omite quanto à garantia de direitos por parte das autoridades judiciais locais”, diz a carta. O documento também destaca que nenhum juiz das comarcas da Baixada Ocidental deu andamento às ações civis públicas ajuizadas pelos promotores de justiça, visando a retirada dos búfalos dos campos naturais, assim como determinam a Constituição estadual e a legislação ambiental brasileira.

Os religiosos falam, ainda, dos gemidos dos posseiros do povoado Estirão Grande, no município de Arari, que correm o risco de perder as suas terras embora vivam em área pública há mais de cem anos. Atualmente, os posseiros encontram-se criminalizados e ameaçados de morte. “O despejo é um evento terrível pela desumanidade com a qual jagunços e até policiais destroem e queimam dezenas de casas, quintais, roças, criações de famílias de posseiros, que moram e trabalham em suas terras há muitas gerações”, denunciam os religiosos.

A carta da Igreja Católica maranhense também critica as práticas de juizes do estado que, ao expedirem liminares em ações possessórias, costumeiramente a favor dos “proprietários”, desconsideram a realidade e os direitos de posseiros antigos e recentes. “Parece estar ausente a preocupação de levantar a cadeia dominial dos imóveis em questão e, sobretudo, a suspeita sobre a legalidade dos títulos, num Estado em que muitas propriedades se constituíram, após 1969, a partir da grilagem”, assinala o documento.

“Deploramos que as liminares funcionem como sentenças definitivas, dispensando, nestes casos, o esgotamento da via processual e contando com o reforço do aparelho policial para que se tornem irreversíveis pelos danos físicos e morais que causam. Tomamos a liberdade de apontar o uso indevido das liminares num Estado onde a maior parte da população pobre vive no campo, habitando, via de regra, povoados tradicionais, cujos moradores, pelo tempo de posse, já teriam o direito de usucapião garantido”, completa a carta.

Ao final, os religiosos conclamam as autoridades do executivo federal e estadual a destinarem recursos orçamentários privilegiando a promoção da dignidade das pessoas que habitam o campo acima dos interesses econômicos dos grandes projetos. “Os pobres são juizes da vida democrática de uma nação e, por isso, a expressão histórica do julgamento de Deus sobre qualquer sociedade humana. O direito das pessoas, sobretudo dos mais pobres a uma vida digna, é o verdadeiro bem supremo ao qual todos os outros direitos devem ser orientados e submetidos, inclusive o direito da propriedade privada da terra que não se constitui para ninguém um direito incondicional e absoluto”, conclui a carta.
(Agência KaxiANA, com informações do Conselho Indígena Missionário, 01/07/2006)
http://www.ecoagencia.com.br/index.php?option=content&task=view&id=1693&Itemid=2

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