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2006-06-30
Quase 700 espécies de animais e plantas do Pará estão concorrendo em uma eleição que nenhuma delas quer ganhar. A disputa vale uma vaga na primeira lista de fauna e flora ameaçada do Estado, que deve ser concluída hoje por um grupo de especialistas reunidos em Belém.

O levantamento, que consumiu mais de dois anos de trabalho, é o primeiro realizado especificamente para um Estado da Amazônia. Foram analisadas 674 espécies de mamíferos, aves, anfíbios, lagartos, aranhas, serpentes, peixes e plantas, que agora passarão por um crivo final dos especialistas para determinar se estão ou não ameaçadas.

"É apenas uma amostra da biodiversidade do Estado", diz o biólogo Alexandre Aleixo, pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi e coordenador do projeto Biota Pará, realizado em parceria com a organização Conservação Internacional (CI). "Não é a lista perfeita, mas é o melhor que podemos fazer com o conhecimento que temos."

A expectativa, segundo ele, é que cerca de 80% das espécies fiquem fora da lista de ameaçadas. Para muitas, o nível de conhecimento sobre distribuição e condições populacionais ainda é muito escasso para chegar a uma classificação. Aquelas que forem "eleitas" para a lista, entretanto, passarão a receber mais atenção de pesquisadores e autoridades em algumas das regiões mais conflituosas da Amazônia.

O projeto conta com apoio direto da Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Sectam) do Pará, que deverá homologar a lista assim que ela for apresentada pelos cientistas. A idéia é que a relação sirva como guia para orientar as políticas de conservação no Estado, apontando espécies e hábitats com necessidade mais urgente de proteção.

A aplicação mais imediata, segundo Aleixo, será na elaboração do plano de Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) do Estado. "Há uma pressão muito forte para que o ZEE seja concluído. Ao mesmo tempo, sabemos que esse zoneamento tende a ser muito mais econômico do que ecológico", diz o pesquisador. "A lista pode ser usada como uma ferramenta para dar um pouco mais de equilíbrio ao processo."

Por uma questão de coerência, a lista paraense incluirá automaticamente as espécies que ocorrem no Estado e já estão na lista nacional de espécies ameaçadas do Ibama. Mas é natural que haja diferenças. "Uma espécie que não está ameaçada no cenário nacional pode estar criticamente ameaçada dentro do Pará e vice-versa", aponta o especialista em morcegos e gerente de projetos da Amazônia da CI, Enrico Bernard.

"O fato de uma espécie existir em outros Estados não significa que podemos acabar com ela no Pará. Cada um tem de tomar conta do seu quintal." Entre as árvores, um exemplo é a copaíba (Copaifera reticulata), que não consta na lista do Ibama, mas está sendo proposta como "vulnerável" dentro do Pará.

Os grandes desafios deverão ser as espécies raras ou endêmicas, que só existem no Estado e podem ter passado despercebidas na lista nacional. É o caso do morcego Diclidurus ingens (veja acima), uma espécie de pêlo branco cujo único registro conhecido no Brasil foi feito por Bernard há seis anos, em Alter do Chão. Nesses casos, com tão poucas informações, pode ser difícil chegar a uma classificação.

A espécie é conhecida em outros países amazônicos e consta como "vulnerável" na lista global de espécies ameaçadas da União Mundial para a Natureza (IUCN), mas não aparece na lista do Ibama.

O mesmo ocorre com várias espécies de aranhas da região metropolitana de Belém, como a Taczanowskia trilobata, cujo único registro data do fim do século 19. Na lista do Ibama, ela é considerada "vulnerável" (uma das três categorias de ameaça, junto com "em perigo" e "criticamente em perigo"). "Várias das espécies são muito pouco conhecidas", diz o especialista em aranhas Alexandre Bonaldo, do Museu Goeldi. "É provável que muitas delas tenham distribuição mais ampla, mas que não conhecemos por falta de amostragem."

No reino das plantas, o desconhecimento também é grande. Mas no Estado com a maior indústria madeireira do País, algumas espécies têm lugar garantido entre as ameaçadas. Entre elas, o mogno, o pau-rosa e o cedro. "Há espécies que certamente vão entrar, mas o critério é que, se não houver informações suficientes, não entra. Não vamos dar tiro no escuro", diz o especialista Dario Dantas do Amaral, do Museu Goeldi.
(Por Herton Escobar/O Estado de S. Paulo, 29/06/2006)
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