Pelo menos 16 países correm pela vacina contra a gripe aviária
2006-06-28
Mais de 16 países desenvolvem, a toque de caixa, experimentos para prevenir a gripe aviária, que até agora matou 120 pessoas. A rápida produção de vacinas efetivas e baratas não impedirá uma pandemia, mas poderá reduzir seu impacto. Em cerca de 28 experiências clínicas diferentes, estão sendo testadas várias formas do vírus H5N1 da doença para criar vacinas pré-pandêmicas, que poderiam ajudar nestes momentos quando ainda não ocorreu a temível mutação para uma cepa de fácil transmissão entre humanos.
“Um vírus desconhecido (mutado) pode aparecer a qualquer momento, e alguns destes esforços (contra a gripe do frango) ajudarão”, disse ao Terramérica John Treanor, especialista em vírus da Escola de Medicina da Universidade de Rochester. Novas cepas do H5N1 tornaram-se altamente infecciosas nos últimos meses entre aves domésticas e selvagens, mas não em humanos. Entretanto, cerca de 120 pessoas morreram por causa desse vírus desde 2003. O H5N1 evolui rapidamente, tornando difícil prever se haverá, ou não, uma pandemia, disse Treanor.
Se houver, os modelos informáticos sugerem que, em três meses, um vírus pandêmico poderia chegar a todos os continentes e em 69 meses a todos os países. Poderia matar tanta gente quanto a pandemia de gripe espanhola, de 1918 e 1919, quando morreram mais de 50 milhões de pessoas, explicou o especialistas. Uma vez identificado o vírus mutado, o desenvolvimento de uma vacina eficaz poderia demorar cerca de seis meses. As vacinas requerem que parte da cepa do vírus real seja injetado em nossos corpos para permitir ao sistema imunológico construir uma defesa contra o vírus em pleno funcionamento.
“A produção não pode começar antes que surja uma cepa pandêmica da gripe aviária”, explicou ao Terramérica Klaus Stör, diretor do programa global contra a gripe da Organização Mundial da Saúde (OMS). Por isso, tais esforços para criar vacinas pré-pandêmicas devem ser apoiados. Há duas semanas, houve um anúncio esperançoso: a evidência de que furões imunizados com uma vacina baseada em uma variante do H5N1, isolada em Hong Kong em 2003, os protegia contra uma cepa mais nova.
“As vacinas pré-pandêmicas podem estimular uma resposta imunológica melhor do que se pensava, e têm o mérito de poderem ser armazenadas como vacinas pandêmicas iniciais”, disseram os pesquisadores encarregados dos testes com furões do Hospital St. Jude de Pesquisas Infantis, em Memphis, e da Universidade do Tennessee. Provas de outras vacinas contra o H5N1 em humanos estão em curso em outras partes, incluindo três experimentos em fase final realizados atualmente pela empresa GlaxoSmithKline, com cinco mil pessoas na França, Alemanha, Holanda, Rússia, Espanha e Suécia.
Este ano, o laboratório australiano CSL Limited também estuda a segurança e efetividade de sua nova vacina em humanos. E o francês Sanofi Pasteur informou, em maio, que sua vacina produzia uma boa resposta imunológica em dois terços dos voluntários e que era preciso mais pesquisa. Entre os desafios está reduzir a quantidade de inoculações necessárias para conferir imunidade, a fim de que o medicamento esteja disponível para mais pessoas. A manufatura mundial de vacinas esteve em queda por vários anos, sobretudo porque era pouco rentável fornecê-las para doenças infantis comuns.
Por outro lado, os laboratórios se centraram em remédios para populações mais velhas de países em desenvolvimento.Inclusive, vacinas para a gripe estacional estiveram escassas nos Estados Unidos pela baixa capacidade de fabricação. Atualmente, o resultado combinado dos fabricantes mundiais da vacina contra a gripe é de, aproximadamente, 900 milhões de doses de 15 miligramas de antígeno. A vacina do Sanofi Pasteur contra o H5N1 requer duas doses de 30 miligramas, e se for totalmente efetiva, apenas 225 milhões poderiam, teoricamente, ser protegidos. Para enfrentar essa escassez, vários países e empresas fazem novos investimentos.
Em maio, o governo dos Estados Unidos outorgou cinco contratos superiores a US$ 1 bilhão para desenvolver tecnologias baseadas em células, com a finalidade de elaborar vacinas contra a gripe. Tradicionalmente, as vacinas são feitas injetando o vírus em ovos de frango, dentro dos quais embriões se reproduzem. O método é lento, requer espaço e um ou dois ovos por dose, o que constitui um problema se a gripe aviária dizimar as populações avícolas. Produzir vacinas contra a gripe em cultivos de células, como se fez com a da poliomielite, hepatite A e varicela, será mais rápido e flexível. Os gigantes farmacêuticos aproveitam esta nova oportunidade, comprando e construindo instalações para manufaturá-las. Entretanto, poucas destas fábricas ficam fora do mundo desenvolvido.
O Brasil anunciou, no mês passado, que investirá US$ 13,6 milhões para construir uma nova unidade destinada à elaboração de vacinas contra a gripe comum. Sua inauguração está prevista para 2007 e será “de nível mundial, a primeira em um país em desenvolvimento”, disse Jarbas Barbosa da Silva Júnior, subsecretário de Controles Sanitários do Ministério da Saúde. Além disso, este mês uma unidade-piloto começará a produzir uma vacina contra a gripe aviária baseada no H5N1, informou Barbosa em uma declaração escrita. Mesmo que a temida pandemia de gripe do frango não se materialize, os milhares de milhões de dólares investidos em pesquisas e manufatura não terão sido gastos em vão, assegurou Treanor.
(Por Stephen Leahy, Envolverde, 27/06/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=19016&edt=34