Há 20 anos, esgoto tortura moradores em Campo Grande (MS)
2006-06-28
Dores de cabeça, mal-estar e estresse estão entre os principais incômodos
enfrentados pela comunidade que reside próxima a estações de tratamento
de esgoto ou de aterros sanitários. Uma situação que em Campo Grande ainda
não chegou a se transformar em problema de saúde pública, mas há décadas
vem influenciando na qualidade de vida dos habitantes de regiões com esse
tipo de "vizinhança".
É o caso de quem mora nos bairros Marcos Roberto e Taquarussu, que têm
como divisa o Córrego Anhanduizinho, na Avenida Ernesto Geisel (Norte-Sul),
onde funciona há cerca de 20 anos a estação de tratamento de água e
esgoto Salgado Filho, atualmente gerida pela empresa Águas Guariroba. No
auge da indignação, moradores desses bairros foram para a avenida
protestar, reivindicando uma solução para o problema do mau cheiro.
Uma desconfortante sensação que tem como causa o gás sulfídrico, principal
componente resultante da decomposição da matéria orgânica que constitui o
esgoto, explica o engenheiro civil e mestre em hidráulica e saneamento
Jorge Gonda, também professor da Universidade Federal de Mato Grosso do
Sul (UFMS) e presidente da Fundação de Conservação da Natureza de Mato
Grosso do Sul (Fuconams).
No caso das estações de tratamento, onde o sistema mais comum utilizado é
o anaeróbico, o mau cheiro é recorrente. "Trata-se de um processo de
decomposição incompleta, por isso há emissão de gás. Por mais que se faça
tratamento, haverá alguma exalação de odor", afirmou.
Processos
Em linhas gerais, no sistema de tratamento de esgoto existem dois
processos, o aeróbico e o anaeróbico. Neste último, as bactérias não
precisam de oxigênio livre para viver e atuar no processo de decomposição
do esgoto.
Já no processo aeróbico, mais comumente utilizado no País, os
microorganismos que atuam nessas estações necessitam de muito oxigênio, o
que requer mecanização, implicando portanto e mais gasto de energia em
investimentos em equipamentos.
Como exemplos de sistemas aeróbicos, o engenheiro cita o sistema de
tratamento da Ilha do Governador (RJ), que é de lodo ativado, e de
Curitiba (PR), onde foi adotado sistema de lagoas com aeradores.
"Dentro das soluções técnicas da engenharia, é possível zerar a emissão
desse tipo de odor, porém na prática se torna impossível, por ser
economicamente inviável", disse, acrescentando que todas as soluções
possíveis visam minimizar os impactos, sempre buscando-se a alternativa
mais adequada para as características de cada estação.
Ele lembra que na época em que a Sanesul era responsável pela estação de
tratamento de água e esgoto do Cabreúva, a empresa amenizou o problema
mergulhando a saída de gás dentro do leito do córrego. "A quantidade de
moscas que tinha e o mau cheiro diminuíram, mas alguma coisa (odores)
sempre vai ter", disse.
Engenheiro defende maior conscientização
Engenheiro Jorge Gonda alerta para respeito ao meio ambiente
Para o engenheiro e ambientalista Jorge Gonda, a expansão da rede de
tratamento de esgoto em Campo Grande tem que vir acompanhada de amplo
trabalho em outra frente, o da conscientização ambiental. "Se você andar
em torno dos córregos, vai perceber que mesmo em dias secos, as galerias
pluviais estão soltando água, o que significa que existe alguém lançando
resíduos nos córregos, através de um sistema que deveria servir para
escoar somente água de chuva. As bactérias também estão atuando nessas
ligações e vai haver emissão de gás", alerta.
Aliado à expansão da rede para resolver o problema de ligações
clandestinas de esgoto, ele destaca que o investimento em fossas sépticas
também se mostra bastante eficiente, além de simples, desde que seja de
acordo com as possibilidades de cada região. Na área central, exemplifica,
o problema é que por causa da grande concentração de edifícios passa a
existir o problema de infiltração.
Da mesma forma, também é desaconselhado o uso de tanque séptico em regiões
onde o lençol freático é superficial. Nesses casos, o aspecto preventivo é
fundamental, sendo necessário melhor planejamento da administração
pública e concessionária do serviço para restringir ou mesmo impedir a
instalação de loteamentos residenciais em áreas com essa característica,
promovendo outro tipo de ocupação. (Por Daniella Arruda e Álvaro
Rezende, Correio do Estado, 26/06/2006)
http://www.correiodoestado.com.br/exibir.asp?chave=132492,1,5,26-06-2006