Questão de prioridade: fome ou aquecimento global?
2006-06-27
Dois anos atrás, o ambientalista dinamarquês Bjorn Lomborg teve uma idéia. Todos queremos fazer do mundo um lugar melhor, mas, dados os recursos finitos, deveríamos olhar para caminhos menos custosos para realizar isso.
Lomborg convenceu um punhado de economistas, incluindo três ganhadores do
Prêmio Nobel, a rascunhar uma lista de prioridades. Eles descobriram que os
esforços para combater fome e doenças poderiam salvar muitas vidas com muito
menos, enquanto a luta contra o aquecimento global consumiria um montante
colossal em resultados incertos e distantes.
A conclusão decepcionou vários ambientalistas. E, nesta semana, outra pessoa
que costuma decepcionar muita gente com freqüência abraçou essa causa. John
Bolton, o embaixador dos EUA na ONU, disse que o chamado Consenso de
Copenhague, de Lomborg, joga luz sobre um caminho para a comunidade
internacional pôr em foco suas prioridades.
Assim, no fim de semana, Bolton sentou-se com diplomatas de sete outros
países - incluindo China e Índia, mas nenhum europeu - para montar um
ranking de 40 maneiras de lidar com dez crises globais. Eles discutiram
problemas como mudança climática, doenças transmissíveis, má nutrição,
migração, governança, água potável e barreiras comerciais.
Pensando-se hipoteticamente em US$ 50 bilhões, como os embaixadores
gastariam esse dinheiro para tornar o mundo melhor? A conclusão foi
curiosamente parecida com o Consenso de Copenhague. Após as apresentações
dos especialistas para cada problema, montou-se a lista de prioridades. Os
quatro principais temas foram saúde, qualidade de água e saneamento, mais
escolas e mais nutrição para crianças. Evitar mudanças climáticas ficou em
último lugar.
Os embaixadores acreditam ser mais sábio gastar o dinheiro com coisas que
eles sabem que irão dar certo. Promover a amamentação, por exemplo, custa
muito pouco e comprovadamente salva vidas. Também ajuda as crianças a
crescerem mais fortes e inteligentes, o que significa que elas ganharão mais
como adultos. Suplementos de vitamina A custam US$ 1, salvam vidas e evitam
que as pessoas fiquem cegas. E assim por diante.
Para os problemas climáticos, embora pouca gente duvide que eles estão
ocorrendo, ninguém sabe quão severo isso será ou que tipos de danos
causarão. E as soluções apresentadas são absurdamente caras. Lomborg
acredita que os benefícios da implementação do Acordo de Kyoto provavelmente
superariam os custos, mas não antes de 2100. O cálculo não deverá agradar Al
Gore, ex-candidato democrata à Presidência dos EUA. Derrotado por George W.
Bush em 2000, Gore classifica o aquecimento do planeta como "uma catástrofe
avassaladora" e argumenta enfaticamente que mudar isso é o mais urgente
desafio moral da humanidade.
Lomborg faz objeções. "Precisamos compreender que há muitas verdades
inconvenientes", disse ele. Mas ninguém sabe se ele e Bolton conseguirão
convencer a ONU a respeito. Mark Malloch Brown, o vice secretário-geral da organização, disse no início
deste mês: "Há hoje a percepção de que qualquer coisa que os EUA apóiem deve
conter algum interesse secreto... e assim deve ser rejeitada sem qualquer
discussão real sobre se a proposta faz ou não sentido".
(The Economist, 23/06/2006)