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emissões de co2
2006-06-26
A energia nuclear está voltando com toda a força, apoiada, inclusive, por renomados ambientalistas, a partir do simples argumento de que ela é uma energia limpa. Será realmente limpa? O discurso de que a energia nuclear é "limpa" porque não emite gases estufa é uma meia verdade e, como toda meia verdade, também é uma meia mentira. A energia nuclear gera resíduos radioativos significativos. Após o descomissionamento de uma usina nuclear deve-se levar em conta que seus resíduos classificados como altamente radioativos permanecerão ativos por 10 mil anos.

Ou seja, por 10 mil anos, estes resíduos altamente radioativos exigirão cuidados, gerenciamento, controle e segurança. Ao longo de nossa história nem civilizações duraram 10 mil anos, quanto mais empresas, governos e, até mesmo, países.

No famoso caso alemão, no qual as suas usinas nucleares serão fechadas ao longo de 32 anos, nada mais significa que não construirão novas usinas para substituir as que serão normalmente descomissionadas ao longo destes 32 anos. O "fechamento" das usinas nucleares alemãs também é uma meia-verdade que já se transformou em mito ambientalista. Infelizmente um mito, com muito pouco de verdadeiro. A Alemanha é o maior importador de energia elétrica da França, sendo 78% como de origem nuclear. A França lança os seus rejeitos nucleares em fossas abissais, como se isto fosse uma real solução e isto não incomoda o governo alemão, a população e os verdes alemães. Ou seja, radioatividade no vizinho pode, sem qualquer problema ético ou moral.

Este conceito é conhecido como nimby - abreviatura de "not in my backyard" (não no meu quintal), que descreve claramente a atitude dos alemães. No entanto, é surpreendentemente que o apoio à energia nuclear também surja dentre as fileiras ambientalistas, com notório destaque para James Lovelock, o criador da Hipótese Gaia. Seus motivos merecem reparo, mas não podem ser meramente desqualificados. Seu argumento primário está na urgente necessidade de substituição das usinas termelétricas a carvão ou óleo, evidentes vilãs do aquecimento global.

A maior fonte de emissão de CO2 nos EUA é a queima de combustíveis fósseis, respondendo por 97% do total, de acordo com US Climate Action Report 2002, publicado pela US Environmental Protection Agency (EPA). Em 1999, aproximadamente 84% da energia consumida nos Estados Unidos era proveniente da queima de combustíveis fósseis. De 1990 a 1999 a emissão de CO2, em razão da queima de combustíveis fósseis nos EUA, aumentou à taxa média de 1,4% ao ano. De 1999 até 2005 superou a taxa de 2% ao ano.

Em termos de energia elétrica isso fica mais visível se observamos a matriz de geração:

Carvão - 56,2% (?)
Nuclear - 21,0%
Gás natural - 9,6%
Hidrelétrica - 9,5%
Petróleo - 3,4%
Outras - 0,2%

A geração de origem termelétrica a carvão, petróleo e gás natural é intensa emissora de CO2, além de dióxido de enxofre e oxido nitroso. Por outro lado, o consumo mundial per capita de energia elétrica, de acordo com dados de 1999, é da ordem de 2.700kWh/ano (no Brasil, 1.970kWh/ano) enquanto que nos EUA o consumo per capita é da ordem de 11.900kWh/ano e continua crescendo a taxas superiores a 1% ao ano. Os EUA não podem ser utilizados como modelo ou referência, porque são insustentáveis, equivalendo ao triplo da capacidade de suporte do planeta.

Em termos estratégicos é importante destacar que, mantidos os níveis de consumo de 2000, os EUA possuem reservas de carvão para mais 500 anos, com custos de exploração há muito amortizados, o que facilita a compreensão de que a geração termelétrica a carvão equivale a 56,2% em sua matriz de geração. Mesmo se apenas consideramos a questão da energia elétrica e desconsideramos outras fontes de emissão de CO2 (automóveis, indústria etc.), ainda assim podemos compreender melhor as implicações na redução da emissão.

Para reduzir as emissões de CO2 originadas de termelétricas a carvão e gás natural (69,2% de toda a geração) os norte-americanos teriam que reduzir a oferta de energia ou substituir estas fontes de geração, modificando o modelo de sua matriz energética. Reduzir o consumo significa impor grandes modificações culturais e sociais, com relevantes impactos na economia. O atendimento ao aumento de demanda significa aumentar a capacidade de geração, ampliando o problema. Por outro lado, reduzir a oferta, racionando a energia disponível para consumo, naturalmente desarticularia toda a economia, com sérios impactos em emprego e renda, o que traria um custo político incalculável.

Substituir a geração termelétrica a carvão por outra também seria complicado. Em primeiro lugar, substituir pelo quê? A possibilidade de expansão da geração hidrelétrica é limitada e não iria efetivamente repor o volume de geração a ser substituída. As fontes alternativas, tais como eólica e fotovoltaica, no atual estágio tecnológico, ainda não são eficientes a ponto de permitir a substituição. A única alternativa tecnicamente viável seria a intensiva utilização da energia nuclear. É este, em essência, o argumento de Lovelock - a energia nuclear é a única viável para substituir a energia termelétrica a carvão.

Os Estados Unidos já operam 104 reatores nucleares, que respondem por 21% da geração. Embora não seja emissora de gases-estufa a energia nuclear gera resíduos radioativos extremamente tóxicos, para os quais ainda não existe um processo realmente seguro e eficaz de armazenamento. A posição de Lovelock foca a questão, essencialmente, a partir da ótica dos EUA, Canadá e Austrália, ignorando todos os demais. O criador da Hipótese Gaia esqueceu que o planeta é uno, necessitando de soluções sistêmicas. E este é o primeiro reparo.

O segundo argumento é que um acidente nuclear é um risco potencial, enquanto que o aquecimento global é um fato, Este é o segundo reparo. O risco de acidentes nucleares, embora estatisticamente pequeno, não é desprezível, o que aumenta a rejeição por parte da população. E o aquecimento global é um fato de amplo consenso na comunidade científica que, uma vez iniciado, exigirá imediatas ações, mas ainda assim apresentará seus efeitos, mais ou menos severos, ao longo dos próximos dois séculos. Ou seja, não evitaremos o desastre no longo prazo, apenas podemos moderar os seus efeitos.

O terceiro argumento é que os resíduos nucleares são um problema diante da atual tecnologia, mas que, no futuro, isto pode ser resolvido, transformando um passivo ambiental em ativo. Pode parecer lógico, mas é apenas um exercício de futurologia, sem qualquer indicativo de que realmente venha a acontecer. Vejam, ao final do artigo, um interessante roteiro do atual estágio do gerenciamento dos resíduos nucleares.

Outra questão a ser considerada é a utilização militar da energia nuclear, presente desde a "inauguração" da era nuclear em Hiroshima e Nagasaki. Mesmo diante de compromissos de uso pacífico, ainda assim existe indissolúvel ligação entre geração de energia nuclear e controle/supervisão militar. Na prática, não é possível ser pacifista e defender a energia nuclear ao mesmo tempo.

Mais uma vez, digo que é muito mais fácil ser ambientalista no Canadá ou na Alemanha do que no Brasil ou na África Subsaariana, principalmente quanto o discurso não precisa ser realizado. O pragmatismo de governar, como os "verdes" demonstraram na Alemanha, dispensa coerência.

Nós, ambientalistas do feio, sujo e pobre terceiro mundo, estamos fazendo a nossa parte ao questionar a energia nuclear e ao defender programas sustentáveis de energias limpas e renováveis. E esperamos que os "companheiros" do lado de cima do Equador também façam a deles. Aliás, também esperamos que "companheiros" por aqui mesmo também façam.

Não existem soluções simples para problemas complexos, e com a energia nuclear não é diferente. A defesa da energia nuclear, por Lovelock e outros, pode ser uma solução simples para conter, ou melhor, moderar os efeitos do aquecimento global, mas transfere para o futuro e para as futuras gerações o gerenciamento de um imenso estoque de resíduos nucleares. E transferir para o futuro e as próximas gerações a responsabilidade de nossas decisões atuais é um direito que, definitivamente, não possuímos.
(Por Henrique Cortez, Envolverde, 26/06/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=18904

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