A caça às baleias foi proibida em 1986, quando os cientistas chegaram à
alarmante conclusão de que, se a matança não cessasse, várias espécies
iriam desaparecer. Vinte anos depois, a boa notícia é que o número de
baleias voltou a crescer, ainda que nem todas as espécies estejam livres
da ameaça de extinção. A má é que um grupo de países liderados pelo
Japão está usando isso como pretexto para acabar com a moratória que
protege esses mamíferos gigantes e pacíficos. Na semana passada, pela
primeira vez em duas décadas, os caçadores obtiveram uma vitória na
Comissão Baleeira Internacional (CBI), o colegiado de setenta países que
tem a última palavra sobre o assunto. Por escassa maioria, a CBI aprovou
uma resolução que declara desnecessária a manutenção da moratória e
adverte que a atual quantidade de baleias ameaça o estoque de peixes em
algumas regiões. Ainda não é a liberação, mas um passo em direção à
matança sem restrições.
O Japão nunca se conformou com a moratória. A restrição causa prejuízo à
frota de baleeiros e tira da mesa um prato tradicional da culinária
nipônica. Aproveitando-se de uma brecha na convenção internacional, os
japoneses continuam a matar por volta de 1.000 animais por ano a
pretexto de pesquisas científicas. A desculpa é que, como as baleias
precisam ser mortas para ter suas entranhas devidamente estudadas, nada
mais natural que depois sejam esquartejadas, embaladas, congeladas e
vendidas aos restaurantes. A Noruega, que não aderiu à convenção da CBI,
e a Islândia matam livremente as baleias. Numa rara coincidência de
interesses diplomáticos, o Brasil e os Estados Unidos fazem parte do
grupo que se opõe ao fim da proibição. Para mudar a convenção
internacional, o Japão precisa obter o apoio de 53 países-membros. Por
enquanto, só conseguiu 33 votos, mas os diplomatas japoneses acreditam
que a nova resolução abriu o caminho para negociar o voto de outros
países e pôr fim à moratória da caça comercial de baleias. "A resolução
não tem efeitos práticos, mas seu significado simbólico e político é
bastante forte", diz a bióloga Karina Groch, chefe da delegação
brasileira no comitê científico da CBI.
A estratégia japonesa para aumentar o seu poder de fogo na comissão é
obscura. Há indícios de que o Japão está pagando a países pequenos e sem
tradição na pesca baleeira, como a Guatemala, para que ingressem na CBI
para votar a favor de suas propostas. Isso explicaria por que o número
de países-membros quase dobrou nos últimos cinco anos e por que países
como Mali – que fica a quilômetros do mar – resolveram participar das
decisões que irão definir o futuro das baleias.
Redução da população de baleias em relação ao século 18:
- Baleia Azul - 27 metros - 98% sobre a população de 500.000 exemplares
no século 18;
- Baleia Fin - 25 metros - 95% sobre a população de 1 milhão de
exemplares no século 18;
- Baleia Franca - 18 metros - 93% sobre a população de 100.000
exemplares no século 18;
- Cachalote - 18 metros - 55% sobre a população de 1,5 milhão de
exemplares no século 18;
- Baleia Sei - 16 metros - 94% sobre a população de 500.000 exemplares
no século 18.
Fontes: Estimativas ba Baleia Franca, Naw, CBI, BBC
(Por Ruth Costas,
Veja, 28/06/2006)