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2006-06-26
Enquanto turistas se deslumbram com as pedras expostas nas Cataratas do Iguaçu, os responsáveis pelo setor elétrico acompanham a mais baixa média de chuvas na Região Sul dos últimos 75 anos. Assim como as quedas de água, a seca esvaziou reservatórios de hidrelétricas. As preocupações cresceram a ponto de o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, achar que estava na hora de dar peso institucional à garantia: - Não estamos em situação de risco. O tamanho da preocupação também é indicado pela radicalidade das soluções. Entre as opções, está a de fazer a usina térmica de Uruguaiana, abastecida com gás argentino, operar com óleo combustível, como ocorreu no verão de 2000, quando o Estado vivia uma situação emergencial. Veja os principais trechos da entrevista do ministro concedida por telefone na sexta-feira à tarde.

Zero Hora - Os reservatórios das hidrelétricas da Região Sul estão abaixo de 30%. Há risco de desabastecimento?

Silas Rondeau - Não estamos em situação de risco. O país está dividido em quatro regiões eletrogeográficas. Neste momento, estamos bem no Norte, no Nordeste e no Sudeste/Centro-Oeste. O Sul está na pior situação dos últimos 75 anos, conforme nossos registros. Nunca tivemos um junho tão ruim em toda a série, desde 1931. Depois da lição amarga que tivemos no apagão, desde 2003, quando o ministério era conduzido pela ministra Dilma, uma das primeiras ações foi reforçar o sistema de transmissão. Em 2001, quando faltou energia no país, no Sul sobrava e não havia linhas de transmissão.

ZH - Quais os resultados?

Silas - Não vai haver racionamento na Região Sul. A capacidade de transferir energia entre as regiões, em 2001, era de 2,4 mil megawatts médios. Em setembro de 2006, no momento que pode ser mais crítico, estaremos com capacidade instalada de 5,3 mil MW médios, ou seja, 120% de aumento. Com mais capacidade de transmissão e trabalhando para garantir o funcionamento das térmicas de Araucária e Uruguaiana, podemos ficar tranqüilos. Se São Pedro fosse tão ruim com o RS - e não vai ser - e mantiver a pior situação já registrada, que é 20% da média, mesmo assim o abastecimento estaria garantido.

ZH - Quando as providências começaram a ser tomadas?

Silas - O que tem de diferente é o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, que se reúne todo mês e avaliamos o que vai ocorrer olhando dois anos à frente. Em janeiro, nós identificamos que o Sul estava ficando preocupante. Começamos a aumentar o intercâmbio do Sudeste para o Sul, para começar a poupar os reservatórios. Aumentamos a geração nas térmicas. Também houve reforços para que as usinas do Sudeste estivessem prontas para sustentar. Não adiantava só ter o caminho, era preciso ter produto. Também verificamos o calendário de manutenção e cancelamos as que não comprometessem a segurança para que todas estivessem disponíveis num período crítico.

ZH - Mesmo com dados ruins, então, há tranqüilidade?

Silas - Não há nenhum motivo para se preocupar com respeito a um desabastecimento de energia no Sul porque todas as medidas técnicas necessárias no sistema nacional estão sendo tomadas em tempo para evitar qualquer surpresa. A situação está sob controle e monitorada permanentemente. A população pode ficar tranqüila. Estamos precisando nos comunicar de forma transparente, para que não se crie a situação de mostrar as imagens das Cataratas do Iguaçu e provocar pânico com expectativa de problemas nas hidrelétricas.

ZH - Como é possível garantir o funcionamento de Uruguaiana, que costuma parar no inverno por falta de gás na Argentina?

Silas - Tive uma conversa com o ministro argentino na sexta-feira (23/06), já havíamos falado antes. Mas mesmo que ocorra um problema maior com gás, aquela usina é bicombustível. Se estivermos no limite, a usina pode gerar com óleo combustível, da mesma forma como estamos limpando as máquinas de Alegrete (usina desativada há anos). Isso foi possível porque estamos com o farol alto, o que permitiu preparar antes as providências.

ZH - Os reservatórios do Sul são muito instáveis. É uma situação com a qual temos de nos habituar?

Silas - Não adianta tratar uma topologia no Sul, que tem rios encaixados (situados entre montanhas), uma característica própria, que não permite grandes reservatórios. É diferente dos rios Tocantins e Xingu. Se quiser fazer uma barragem de cem metros de altura, destrói uma região, sacrifica a agricultura. O reservatório do sistema está no Sudeste. Numa situação como esta, é possível compartilhar água pelos fios.

ZH - Depois do apagão, tivemos mais consciência da fragilidade da energia hídrica, mas agora também temos problemas com o gás natural. Há alternativas?

Silas - Neste momento, é um compromisso nosso retomar a política para o carvão, que impacta diretamente o Rio Grande do Sul, por ter a maior reserva. Eu estive na China, e eles estão animados para fazer a segunda, a terceira planta. Nós temos carvão para gerar energia equivalente a duas Itaipus durante 50 anos. É ótimo ter base hidráulica, que tem o custo mais barato do mundo, mas precisamos compor com a térmica. E a térmica vai crescer com gás natural, óleo combustível, carvão, nuclear. Também temos etanol, biodiesel. Com o programa do etanol, teremos mais biomassa (que usa bagaço de cana). Até porque sou barrageiro de origem, sou defensor da energia hídrica, mas reconheço que se ficarmos dependentes há riscos, que vocês estão vendo aí. Tudo isso vai ficar mais claro no plano nacional de energia que vamos apresentar em outubro.

ZH - Já está definido um prazo para Angra 3?

Silas - Não. Colocamos dentro do plano decenal. Angra 3 é uma alternativa econômica se não conseguirmos tornar viáveis projetos hidráulicos. Tivemos embates que não conseguimos resolver em tempo, principalmente de licenciamento ambiental. Como Angra 3 está no centro de carga (onde há grande consumo), não tem muito custo de transporte, em termos de preço final, é competitiva.

ZH - E a segurança, não é mais um problema?

Silas - Todo o mundo está olhando a questão nuclear de forma diferente. A Alemanha retomou, os Estados Unidos têm vários projetos. O preço do urânio subiu umas 10 vezes. A segurança de operação melhorou bastante, até com o que se aprendeu com os erros. O risco sempre existe, mas a tecnologia está mais avançada.

ZH - Qual a expectativa para o leilão de quinta-feira (29/06)?

Silas - Estamos aguardando sucesso, porque a procura foi grande. A aposta é positiva porque nosso papel é conseguir que o consumidor final deixe de pagar mais, porque estimulamos a disputa. Agora temos projetos mais simples, não devemos ter problemas como no leilão passado.

Menos geração
Chuvas em relação à média de longo prazo
Jan : 58%
Fev : 46%
Mar: 56%
Abr : 47%
Mai : 20%
Nível das barragens no Sul
Jan: 71,85%
Fev: 63,04%
Mar: 48,92%
Abr: 41,21%
Mai: 31,09%
Reservatórios por região*
Norte: 95,87%
Nordeste: 91,73%
Sudeste/Centro-Oeste: 80,16%
Sul : 29,56%
(*) Situação do dia 22 de junho
Fonte: Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS)

Na ponta do lápis
A Região Sul precisa de 7,5 mil megawatts médios de energia, supridos por 1,05 mil MW de geração térmica, 5,1 mil MW de geração hídrica e mais 1,5 mil MW transferidos pelo sistema nacional. No plano de emergência, o sistema vai elevar para até 5,5 mil a transferência e haverá um reforço de geração térmica de 1.123 MW
(Por Marta Sfredo, Zero Hora , 25/06/2006)

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