Pesquisadores mapeiam distribuição de aves terrestres no mundo
2006-06-22
Conhecer a distribuição das espécies pelo mundo é mais do que um exercício acadêmico. É fundamental para responder a perguntas-chave para a conservação. Com esse intuito um grupo de ornitólogos e ecólogos da Grã-Bretanha, Estados Unidos e Taiwan reuniu informações para formar um mapa do tamanho da distribuição geográfica de todas as espécies de aves no mundo. Os pesquisadores coletaram dados de 9.505 espécies de aves terrestres - as marinhas foram deixadas de lado por falta de dados comparativos, dizem eles. O resultado foi publicado na última edição da revista eletrônica PLoS Biology, de acesso livre.
A maioria das espécies tem uma distribuição geográfica pequena - mais de um quarto delas se espalha por uma área menor do que o Estado de Roraima, com 224 mil quilômetros quadrados. Aquelas com menor distribuição ficam nas ilhas, obviamente, e nas montanhas tropicais e subtropicais, como a Cordilheira dos Andes e a Serra do Mar, no Brasil - que guardam um alto grau de endemismo, ou seja, de espécies que são vistas apenas naquelas regiões.
"É um padrão já esperado pois áreas ricas são formadas geralmente por espécies com distribuição restrita", diz o biólogo José Maria Cardoso da Silva, vice-presidente de Ciência da ONG Conservação Internacional. Por outro lado, a maior distribuição é vista entre os animais que povoam o hemisfério norte, particularmente os encontrados em altitudes médias. "O fato de a maioria das espécies de aves ter uma distribuição pequena indica que precisamos de muito mais áreas protegidas para cuidar de todas as espécies de aves do planeta", diz Silva.
O trabalho é uma primeira tentativa de se montar um mapa de distribuição das aves, até de forma bastante didática para atingir os conservacionistas em campo. Só que o desenho acaba ficando amplo demais. A própria equipe admite no texto publicado que falta mais análises e abre caminho para que outros grupos avancem com dados adicionais sobre a ocorrência das espécies.
Diversidade
Quanto à riqueza de espécies, o grupo propõe que não é apenas a disponibilidade de área que determina o quanto um tipo de ave se espalha, mas também fatores climáticos, que fornecem as condições ideais para determinada espécie proliferar ou não. "Eles também mostram que não dá para generalizar. Os parâmetros aplicados em políticas de conservação no hemisfério norte podem não ser válidos para o hemisfério sul", diz o ornitólogo (especialista em aves) Pedro Develey, da Sociedade para a Conservação das Aves do Brasil, braço nacional de uma ONG internacional, a Bird Life.
"Talvez possamos aplicar estes conhecimentos na formação das IBAs (áreas importantes para a conservação de aves), mesmo no Brasil." A Save montou um mapa com 163 IBAs, que divulgou recentemente, e descobriu que mais de 30% delas não estão sob nenhum regime de proteção da biodiversidade.
A conservação depende do conhecimento acadêmico, local em que as duas pontas - estudo e campo - se encontram. "Compreender a distribuição das espécies é fundamental para fazer escolhas adequadas de conservação e testar teorias biogeográficas para explicar a evolução do ecossistema e do conjunto de animais e plantas que vivem ali", afirma Silva, autor de diversos estudos sobre biodiversidade.
A ONG que representa trabalha com a proteção de áreas biodiversas sob risco intenso, que chamam de hotspot. A mata atlântica, que aparece no mapa deste estudo como área endêmica, é um dos locais mais desguarnecidos.
"Se usarmos o tamanho da distribuição geográfica como um indicador de vulnerabilidade, a maioria das espécies ameaçadas do planeta estará nas ilhas oceânicas, como Fernando de Noronha ou Madagáscar, ou nas montanhas tropicais e subtropicais." O alerta mostra que, no fim, é o trabalho prático que completa o teórico.
(Por Cristina Amorim, Estadão, 21/06/2006)
http://www.estadao.com.br/ciencia/noticias/2006/jun/21/396.htm?RSS