Fora das barragens, terra de tribo indígena afoga lentamente
2006-06-20
"Todas as árvores e terras", disse o chefe da tribo. "Com vários acres de verde onde os rebanhos cresciam e as crianças da tribo Biloxi-Chitimacha corriam sem molharem os pés. Você deveria ter visto". Mas agora é difícil imaginar essa cena, porque o local onde os jardins floresciam e as crianças brincavam 30 anos atrás, virou um pântano lamacento, aberto para as águas do Golfo do México."Água", disse Albert Naquin, o chefe da tribo. "Tudo virou água".
Por razões naturais e fabricadas, as 30 milhas quadradas dos brejos do sul da Louisiana somem todo ano para dentro do Golfo. Mas as águas que avançam, roubando toda uma cultura, tem um parceiro, segundo os membros da tribo: o governo.
A ilha fica fora do estágio inicial de um sistema de barragem de 72 milhas chamado Morganza, parte do Programa de Proteção a Terremotos do Golfo do México. Esse projeto de US$887 milhões, feito pelos engenheiros do Exército, foi desenvolvido para impulsionar a erosão dos brejos. "O sistema fornecerá proteção contra furacões a mais de 90% dos habitantes", disse Jerome Zeringue, o diretor do Distrito de Barragens e Conservação de Terrebonne. "Algumas pessoas ficaram de fora, infelizmente".
A maioria dessas pessoas que ficaram de fora são da tribo Biloxi-Chitimacha em Isle de Jean Charles. "Inicialmente, tentamos colocá-los lá", disse Zeringue. "O problema é, baseado na relação custo-benefício, custaria demais incluir aquela fatia de terra. Por esse preço, você compraria a ilha inteira e todos os habitantes dela umas dez vezes". Alguns anos atrás, os habitantes da ilha rejeitaram a proposta de se mudarem para um local ao longo da barragem.
O chefe da tribo não vive mais em Isle de Jean Charles. A única estrada até a ilha vivia alagando, disse ele, e o chefe não podia mais perder outro emprego fora da ilha. Ele tem medo de que se processar o governo federal por ter deixado a ilha de fora das barragens, ameaçará o pedido de sua tribo por reconhecimento federal. Tem medo também de que, se não fizer nada, sua tribo não sobreviverá o próximo grande furacão.
Até sua opção preferida - de que o governo construa casas em terra firme para membros da tribo, mas permita que os mesmos se mudem da ilha quando estiverem prontos - poderia significar a perda de ligação com a terra. "É terrível para mim", disse ele, após mais outro pôr-do-sol iluminar as terras encharcadas. "Achei que poderia mudar o mundo, mas o mundo me mudou".
(Por Dan Barry, The New York Times, 19/06/2006)
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