Ações imediatas e de vasto alcance são necessárias para conservar o meio
ambiente marinho em todo o mundo devido à exploração do homem sobre áreas
de alto mar estar se aproximando do ponto em que não haverá mais volta. O
alerta é feito a governos pelo Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente, PNUMA, e pela União Mundial para Conservação da Natureza (IUCN,
sigla em inglês) em um novo relatório lançado no sábado (17/06) em Nova
York, onde representantes de diversos países e especialistas estão
discutindo sobre as leis dos mares.
O relatório, intitulado Ecossistemas e Biodiversidade em Águas Profundas e
Alto Mar, argumenta que muitas das lições aprendidas na conservação de
zonas costeiras devem ser adaptadas e aplicadas em toda as regiões
oceânicas, inclusive nas áreas que vão além de jurisdições nacionais.
Achim Steiner, Diretor-Executivo do PNUMA, e até recentemente Diretor-Geral
da IUCN, disse: “A capacidade do homem de explorar o alto mar e as zonas
oceânicas profundas tem acelerado rapidamente nos últimos anos. Foi um
ritmo de mudanças que superou nossas instituições e esforços de
conservação, cujo foco principal tem sido as áreas costeiras em que, até
recentemente, a maior parte das atividades humanas como a pesca e a
exploração industrial acontecia. Nós precisamos agora olhar urgentemente
além do horizonte e levar o que aprendemos nas águas costeiras para um mundo
marinho mais abrangente”.
“Bem mais de 60 % do ambiente marinho e sua rica biodiversidade,
encontrado além dos limites das jurisdições nacionais, está vulnerável e em
risco crescente. Governos devem desenvolver com urgência linhas de direção,
regras e ações necessárias para diminuir o abismo que envolve o tema. Se
isso não acontecer, corremos grande risco de danificar irrevogavelmente
vidas selvagens únicas e importantes ecossistemas, muitos dos quais moderam
nossa própria existência neste mundo”, disse Ibrahim Thiaw, Diretor-Geral
da IUCN.
Com mais de 90 % da biomassa do planeta – o peso das formas de vida –
encontrado nos oceanos, o relatório enfatiza o valor dos altos mares e
águas profundas e destaca como a ciência só está agora começando a
compreender a extensão da riqueza da vida, dos recursos naturais e dos
ecossistemas existentes no mundo marinho.
Menos de 10 % dos oceanos tem sido explorados [90 % dos oceanos restam
inexplorados] e apenas uma milionésima parte do solo de águas profundas já
foi sujeita a investigações biológicas.
O relatório, lançado na Reunião do Processo Consultivo Informal das Nações
Unidas sobre o Direito do Mar (UNICPOLOS, sigla em inglês) que fornece
informações à Assembléia Geral da ONU, também destaca a pesca, a poluição e
outros problemas como os conseqüentes de mudanças climáticas globais estão
causando impactos e afetando o mundo marinho.
“Antes muito limitadas às rotas de navios e à pesca em alto mar, atividades
comerciais marítimas têm se expandido rapidamente e estão mergulhando cada
vez mais profundamente. Pesca em alto mar, bioprospecção, desenvolvimento
energético e pesquisas científicas sobre oceanos já estão acontecendo em
profundidades que ultrapassam 2 km”, diz o autora do relatório, Kristina M.
Gjerde, consultora de políticas para o alto mar para o Programa Global
Marinho da IUCN.
“Por todos os oceanos, rotas de navios, operações militares e explorações
sísmicas têm sido intensificadas, o que gerou crescimento do impacto sobre
a biodiversidade e os ecossistemas de águas profundas e alto mares. O
alcance das mudanças climáticas e seus impactos, como o aquecimento dos
oceanos e a acidificação, ressaltam a necessidade de reduzir os impactos de
atividades humanas diretas, já que ecossistemas saudáveis têm maior
capacidade de reagir positivamente às mudanças das condições oceânicas”,
acrescentou Gjerde.
Considerando discussões em vários fóruns internacionais e ações emergentes
tomadas por certos países, a autora destaca opções para mapear o curso para
o progresso da conservação e da administração sustentável de águas profundas
e mares abertos para o século XXI.
Isso inclui ações e medidas que reflitam uma abordagem integrada para a
administração de oceanos baseada em limites ecológicos e não somente
políticos, elevando o nível de proteção a espécies vulneráveis como peixes
de águas profundas, bem como a ecossistemas biológica e ecológicamente
significantes como corais de águas geladas e comunidades de passagens
hidrotermais.
Outros passos incluem a criação de um “sistema de precaução das áreas de
proteção marinha” juntamente a melhores panoramas de impacto que consideram
toda a escala de possíveis atividades humanas por todo o ambiente marinho.
Ambas abordagens são vitais para conservar a valiosa biodiversidade marinha
e poupar espécies ainda pouco estudadas e não-compreendidas – antes que seja
tarde demais.
Alguns fatos apresentados no relatório de águas profundas e altos mares
Águas Profundas
• 90% dos oceanos estão inexplorados. Somente 0,0001 % do solo abaixo de
águas profundas foi sujeito a investigações biológicas.
• Cerca de 50 % dos animais coletados de áreas mais profundas que 3.000 m
são de novas espécies.
• Recifes de coral de águas geladas podem ter até 8.500 anos de idade, 35 m
de altura, 40km de comprimento e 3 km de largura. Eles já foram encontrados
até agora na costa de 41 países desde zonas polares até águas equatoriais
profundas.
• Comunidades que vivem em passagens hidrotermais e fontes de metano e
hidrocarboneto obtêm sua energia de substâncias químicas originárias da
crosta terrestre ou antigos sedimentos. Elas são exemplos de vida na Terra
que não depende diretamente da energia solar.
Pesca Global
• Nos últimos 42 anos, a captura de peixes marinhos selvagens para o
consumo aumentou de 20 milhões para 84,5 milhões de toneladas, com mais de
40 % dessa quantia destinada ao comércio internacional.
• A quantidade de peixes que são pegos acidentalmente durante a pesca de
uma determinada espécie chega a 20 milhões de toneladas por ano em todo o
mundo, aproximadamente 25 % dos peixes capturados.
• Mais da metade (52 %) dos peixes em todo o mundo são totalmente
explorados. O número de espécies superexploradas ou esgotadas aumentou de
10 % em meados da década de 1970 para 24 % em 2002.
• Cerca de 3,5 milhões de barcos de pesca usam os oceanos do planeta. 1 %
desses estão classificados como de grande porte ou navios industriais, que
possuem a capacidade de pescar aproximadamente 60 % de todos os peixes
capturados globalmente.
• A estimativa de custo das capturas feitas por arrastão em alto
mar em 2001 está entre 300 e 400 milhões de dólares, o que equivale a
aproximadamente 0,5 % do valor das capturas globais marinhas. O setor
emprega estimadamente de 1 a 2 mil pessoas utilizando-se cerca de 250 a 300
navios (em equivalente a regime de tempo integral).
• O valor de capturas ilegais, não-relatadas e não-reguladas (IUU, sigla em
inglês) está estimado em 4,9 a 9,5 bilhões de dólares. Até 30 % de pesca em
IUU (1,2 bilhão de dólares) ocorre além das áreas de jurisdição nacional.
Biodiversidade marinha ameaçada
• A cada ano, a pesca ilegal com uso de palangres – que são centenas ou até
milhares de anzóis presos numa mesma corda – mata mais de 300 mil aves
marinhas, incluindo 100 mil albatrozes. 19 das 21 espécies de albatrozes
estão ameaçadas de extinção.
• Populações de peixes de grande porte e com alto valor comercial, como o
atum, o bacalhau, o peixe-espada e o marlim, diminuiram em até 90 % no
último século.
• Um peixe conhecido como Orange roughy, uma espécie de alto mar comumente
visada, chega a maturidade após cerca de 32 anos de vida. Um espécime que
foi recentemente encontrado possuía aproximadamente 240 anos, o que
significa que ele nasceu durante a época do nascimento de Napoleão Bonaparte.
Mais de 46 mil pedaços de lixo plástico estão boiando em cada 1,4 km2 hoje.
No Pacífico central, a quantidade de lixo marinho chega a 3kg para cada 0,5
kg de plâncton.
Sobre os fatos mencionados
Os fatos listados acima são uma seleção dos muitos apontados no relatório.
Todos os fatos foram retirados de diversas fontes literárias e não há
intenção de esgotar o assunto. O autor não é responsável pela exatidão
desses fatos.
Íntegra
O relatório está disponíveis nas páginas do
Programa Regional para os Mares
do PNUMA e
do Programa Marinho da IUCN
(INformações do PNUMA, disponível em
Ecoagência, 17/06/2006)