Mais de 80 mil residências em Cachoeirinha e Gravataí tiveram a água
racionada ontem. A precaução de liberar o líquido aos poucos foi tomada
pela Corsan, em função da ameaça de contaminação do Rio Gravataí com
produtos químicos oriundos da fábrica incendiada MBN, na terça-feira
(13/06).
O fogo na indústria atingiu tanques de ácido fórmico e solventes como
xilol, MTBE e aguarraz. Para evitar que os produtos químicos que
vazaram pela tubulação de esgoto pluvial chegasse ao Rio Gravataí,
foram feitos desvios e lagoas de contenção. Para prevenir, a captação
de água no Gravataí foi suspensa. A prefeitura adverte os moradores
para que não usem poços artesianos, porque o solo também pode estar
contaminado.
Parte da nuvem química intoxicou pessoas no bairro Parque da Matriz,
em Cachoeirinha. Oito que sofreram mal-estar foram atendidas no
Hospital Padre Jeremias e outras oito num posto de saúde. Todas foram
liberadas.
Segundo o relato de vizinhos, a casa explodiu
O incêndio transformou a fábrica numa tocha. Dezenove casas foram
lambidas pelas labaredas. A vigésima residência, do aeroviário Giovani
Brindarolli, desapareceu como se tivesse sido atingida por um
bombardeio. Feita em alvenaria, o lar que Brindarolli partilhava com
pais e irmãos parecia atingido por napalm (fogo líquido), como se a
Guerra do Vietnã tivesse ressurgido num canto de Cachoeirinha. Fogão e
geladeira dos Brindarolli foram reduzidos a pedaços retorcidos de
metal, apenas duas das quatro paredes ficaram em pé, e o telhado
desapareceu. Os bens da família viraram cinzas.
Vizinhos dizem que a casa explodiu. Ninguém estava na residência no
momento. Técnicos da Defesa Civil acreditam que produtos inflamáveis
liberados pela indústria escorreram pelo Riacho Passinho e
ingressaram pela tubulação de esgoto direto no banheiro dos
Brindarolli. Tudo na casa foi explodindo em seqüência: fogão,
geladeira, aparelhos de som, TVs. A família Brindarolli arranjou três
colchões emprestados e está dormindo na casa de vizinhos.
Fepam diz que obra é irregular
A fábrica de produtos químicos MBN, que se incendiou na terça-feira e
danificou 20 residências em Cachoeirinha, realizava uma ampliação
irregular de acordo com a Fundação Estadual de Proteção Ambiental
(Fepam).
A indústria teria construído sem licença um pavilhão para
armazenamento de tanques de produtos químicos. A perícia irá apurar se
houve relação entre a obra e o incêndio.
- A obra só poderia ser realizada mediante licença ambiental, que não
foi liberada, o que deve gerar multa aos proprietários. Qualquer nova
obra, mesmo que o produto não tenha sido armazenado, oferece novos
riscos. Eles também serão multados pela contaminação ambiental -
antecipa o chefe do serviço de emergência da fundação, Luís Fernando
Guaragni.
O valor da multa será estabelecido conforme o potencial de pagamento
da empresa e dos danos causados, mas pode variar de R$ 1 mil a R$ 50
milhões. O prédio estava segurado.
Contraponto
O que diz Marcelo dos Santos, diretor da empresa MBN
Ele diz que tem alvará de funcionamento do prédio atual e licença da
prefeitura de Gravataí para construir o novo pavilhão na indústria.
Ele diz ainda que não colocou produtos químicos na nova construção e,
por isso, não estaria em situação irregular. Santos acredita que só
precisaria retirar uma nova licença de operação se efetivamente
estivesse estocando produtos ali.
(Por Humberto Trezzi,
Zero Hora, 15/06/2006)