Começou na Alemanha a 18ª Copa do Mundo. Mais de 3,2 milhões de espectadores
alemães e estrangeiros são esperados para os 64 jogos que irão acontecer em
12 cidades do país. Se depender do comitê organizador da Copa, da Federação
Internacional de Futebol (FIFA) e do governo alemão, o maior evento
esportivo do mundo não vai custar caro à natureza.
Um programa ambiental intitulado Green Goal, que traduzido ao pé da letra
tanto pode significar “objetivos verdes” como “gols verdes”, promete gasto
mínimo de energia e de água, produção reduzida de lixo e emissão zero de gás
carbônico.
A idéia do projeto surgiu em 2001, quando o presidente Franz Beckenbauer e
os técnicos do Comitê Organizador da Copa resolveram tirar do papel um
ambicioso plano de iniciativas ambientais para a Copa do Mundo de 2006.Um
ano depois, o comitê recebeu o apoio do Ökoinstitut, instituto alemão de
consulta e pesquisa que financia projetos ambientais para eventos culturais
e esportivos. Nascia o Green Goal, que não demorou para ganhar como aliado o
Ministério do Meio Ambiente da Alemanha.
O comitê elegeu os cinco principais impactos ambientais provocados pelo
evento para centralizar as ações. Venceram a competição o aumento no volume
de tráfego de carros nas cidades, a necessidade de alto suprimento de
energia e água para os estádios e áreas de imprensa, a quantidade de lixo
gerada e o conseqüente aumento de emissão de gás carbônico na atmosfera.
Para que tudo saia o mais ambientalmente correto possível, todos os doze
estádios que vão sediar jogos e treinos participam do projeto. A estimativa
é de que se alcance 20% de redução de energia e água gastas dentro dos
estádios, 20% de redução na produção de lixo e 0% de emissões de gás
carbônico durante todo o período da Copa.
Como?
Para economizar água, os alemães apostam na chuva, que costuma aparecer
nesta época do ano. Sete estádios contam com um sistema de tanques de
armazenamento de água no subsolo. Toda a água que cai sobre o teto dos
estádios escoa para esses tanques e, através de bombas, é reutilizada para a
irrigação dos gramados principais e de treinos e para as descargas dos
urinóis secos. O que sobrar, volta para o lençol freático. O estádio da FIFA
em Munique terá capacidade para armazenar 98% da água da chuva que cair em
seus 51 hectares. O Olypiastadion (Berlim), o Franken Stadium (Nuremberg) e
o Gottlieb-Daimler Stadium (Stuttgart), serão capazes de reverter mais de 3
mil metros cúbicos de água da chuva.
Outra atração é o uso de pavimentos permeáveis nas ruas. Eles permitem que a
água da chuva seja sugada para a terra novamente, sem precisar de
escoamento. As imediações dos estádios de Waldstadium, em Frankfurt, e do
Franken Stadium, em Nuremberg, contam com o sistema. A água limpa também não
será desperdiçada. No estádio da FIFA em Hamburgo foi instalado nas pipas e
torneiras um aparelho chamado limitador de fluxo. Sua função é controlar o
uso de água dentro do estádio para que seja usada a quantidade estritamente
necessária.
No quesito transporte, a palavra de ordem é reduzir o número de carros
circulando pelas ruas. Para isso, os transportes públicos serão amplamente
recomendáveis. Quem tem ingresso para ver os jogos, não precisará nem
esquentar a cabeça. No dia da partida terá passe livre pelos ônibus, metrôs
e trens que levam não só aos estádios, mas às atrações turísticas das
cidades. Em Berlim a iniciativa é mais rigorosa: nos bairros próximos ao
estádio ficará proibida a circulação de carros. Em compensação, o metrô
funcionará 24 horas em dias de jogos, e as bicicletas ganharão maior
quantidade de vagas para estacionar e poderão circular por onde quiserem.
Quem opta por andar de carro nas cidades, terá um motivo a mais para querer
deixá-lo estacionado. Os bilhetes de estacionamento Park & Ride dão direito,
por 5 euros a mais, ao uso dos transportes públicos não só para o motorista,
mas para os caronas que estiverem no veículo. Na cidade de Gelsenkirche, os
compartimentos e os horários do trem foram ampliados. E todos os ônibus
ganharam novos filtros para evitar poluição. Em Kaiserslautern, estima-se
que 25 mil pessoas façam uso do sistema P&R nos dias de jogos. Os milhares
de jornalistas também não foram esquecidos: todos os seis mil terão passe
livre nos meios de transporte público.
O Centro de Transmissões Internacionais, em Munique, é onde ficaram
instaladas as equipes de imprensa. São 25 mil metros quadrados de espaço
reservado para máquinas, jornalistas e técnicos. Para abastacer este centro,
segundo as estimativas, seriam necessários 400 mil litros de diesel, cuja
queima provocaria emissão de gás e fuligem. Para evitar esse desastre, foi
instalado um gerador que permite que a energia usada pelas equipes de TV
venha direto da rede elétrica do centro principal. Toda a energia será
fotoelétrica, uma forma ambientalmente correta de abastecimento que não
produz emissão de gás carbônico.
Para a construção do Centro, no lugar das estruturas de aço e gesso, que
após os eventos geram uma enorme quantidade de lixo, foi usado material
reciclável ou reutilizável. As paredes e suportes são de madeira sólida ou
compensada, que, após os jogos, serão usadas na construção civil ou em
outros eventos no país. Nem os doze quilômetros de cabos usados ficarão para
trás. Eles servirão para outros serviços de transmissão. O mesmo exemplo de
reciclagem foi seguido nos estádios de Hannover e Leipzig, que reutilizaram
grande parte da estrutura antiga para suas reformas.
Compensação na Índia
Nos dias em que a chuva der lugar ao sol, entram em ação os tetos solares. O
estádio Fritz Walter, em Kaiserslautern, ganhou o maior. São cinco painéis,
num total de seis mil metros quadrados. Em um dia de sol, o equipamento
gerará 800 kwh. Em um ano, apenas o estádio representará o corte de 500
toneladas de emissão de CO2 para o país. Também o Arena Aufschalke, em
Gelsenkirchen, contará com 835 painéis, cobrindo uma extensão de 400 metros
quadrados nos telhados inclinados do estádio.
Em Munique, lâmpadas econômicas foram escolhidas para iluminar as áreas
internas do estádio. Escadas rolantes e estacionamentos foram aparelhados
com sensores para evitar o desperdício de energia e só serão iluminados
quando estiverem em uso. As cem cabines de comando no estádio não terão
ar-condicionado central. Cada cabine será controlada separadamente por um
centro de distribuição, já que nem todos os equipamentos precisam estar na
mesma temperatura..
Aquecimento também não será motivo para gastos excessivos de energia. Apenas
se a temperatura dos ambientes chegar a 15oC, o sistema de calefação a gás
entrará em funcionamento. No estádio de Gottlieb-Daimler, em Stuttgart, as
paredes e teto foram isolados com painéis de vinte centímetros de fibra
mineral para evitar perda de calor. Isso representará uma economia de 160
mil kwh por ano em aquecimento, além de uma redução de 38 toneladas de
emissões CO2 na atmosfera.
E por falar em emissões, o número estimado para o evento é de 100 mil
toneladas. Mas os idealizadores do Green Goal garantem que esta será a
primeira Copa do Mundo climaticamente neutra. Um milhão e trezentos mil
euros serão investidos em projetos de proteção ao clima em países da África
e na Índia para que esse valor de emissões chegue a zero. A partida já foi
dada. As primeiras 30 mil toneladas foram compensadas antes mesmo das bolas
rolarem na Alemanha, com a construção de uma estrutura para a produção de
gás natural na cidade indiana de Tamil Nadu.
(Juliana Tinoco,
O Eco , 10/06/2006)