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2006-06-12
A siderúrgica Gusa Norte, integrante do grupo mineiro Ferroeste Industrial, vai investir R$ 11,8 milhões em plantações de eucalipto clonal no distrito industrial de Pequiá, em Açailândia (MA), uma região bastante desmatada e que sofre com a degradação ambiental e a poluição vinda da siderurgia. O Banco do Nordeste do Brasil liberou R$ 8 milhões para a empreitada. A iniciativa é considerada como uma ação de reflorestamento pela empresa responsável, mas sua intenção real é usar os eucaliptos como parte principal do planejamento de auto-sustentabilidade energética da siderúrgica.

A Gusa Norte pretende plantar o eucalipto clonal, uma espécie desenvolvida em laboratório, numa área de 4,1 mil hectares. Esse eucalipto é uma variedade cujo crescimento, acelerado, favorece o corte rápido da sua madeira para fabricação de carvão vegetal a ser usado como matriz energética nos fornos da siderúrgica. Em sete anos, a árvore já está madura para o corte. O eucalipto apresenta um alto rendimento, pois o volume de árvores por hectare é grande (250 m3 de madeira/ hectare/ corte). “A demanda da siderurgia é muito grande, precisa de muita madeira, e o eucalipto, num curto espaço de tempo, traz a solução”, afirma Mairom Régis Brito, assessor de comunicação do Fórum Carajás.

De acordo com o diretor da siderúrgica, Ricardo Carvalho Nascimento, “o reflorestamento é a coisa mais importante para o setor [siderúrgico] e para o futuro da empresa, que não pode basear sua produção em exploração não-sustentável, como o uso da mata nativa”. Ele concorda que o plantio, na verdade, não é reflorestamento, mas um meio para garantir o funcionamento da empresa. Segundo Nascimento, a empresa dispõe de um plano ambiental firmado com o Ibama que se compromete a atingir a meta de 80% de auto-sustentabilidade da procedência do carvão por meio da floresta de eucalipto. Os 20% restantes seriam provenientes de resíduos de serraria. A tecnologia para a implantação do projeto é orientada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e tem regulamentações do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

“É um reflorestamento comercial”, diz Maria Ester Cunha dos Reis, agricultora e secretária de comunicação da Associação Grupo de Pequenos Produtores Rurais da Galiléia, no Maranhão. Por isso, espécies naturais da região, como o jatobá e o ipê, não são plantadas, pois demoram mais para se desenvolver. A agricultora explica que num processo real de reflorestamento essas espécies deveriam ser privilegiadas, ao invés de um plantio de uma monocultura exótica. Para ela, mesmo que os ciclos de cortes sejam mais demorados para espécies nativas, futuramente a auto-sustentabilidade seria beneficiada, pois a qualidade do produto final seria melhor. Maria Ester afirma que o eucalipto clonal, por não ser uma espécie nativa do Brasil, exige muita água para crescer e por isso acaba promovendo a degradação do solo. “Vai ser um deserto. Depois de três ou quatro plantios, [o solo] não serve para mais nada”, diz.

Uma das maiores preocupações do setor ambiental com a monocultura do eucalipto é o prejuízo que ela traz aos lençóis freáticos. Apesar de os defensores da monocultura alegarem que a espécie tem raízes muito curtas, o volume de água a ser consumido seria muito, já que há muitos eucaliptos plantados lado a lado. Brito explica que a plantação pode absorver a água da chuva que cai na superfície rapidamente sem que a água consiga atingir o lençol freático. “Em plantação de eucalipto, não se vê a umidade do solo, como na floresta nativa”.

A falta de variedade biológica e a ausência de espaçamento entre as árvores impedem que haja recomposição da floresta nativa e de todo o ecossistema natural nessas áreas. “Não há presença de animais, porque não tem espaço para trilharem. Há alteração do micro-clima da floresta, porque há uma diminuição das chuvas”, afirma Brito. A atividade siderúrgica ainda é relativamente recente em Açailândia, por isso os danos ao solo ainda não são visíveis. “Em Minas Gerais e Espírito Santo, onde a atividade é bem mais velha, o solo está todo degradado e não tem como recompor. E aqui isso vai acontecer em menos tempo devido ao tipo de solo da Amazônia”, afirma Maria Ester.

“Vai ser tudo um deserto”
O diretor da siderúrgica afirma que, de acordo com a legislação ambiental da Amazônia, eles são obrigados a preservar e se responsabilizar por quatro hectares de mata nativa para cada hectare eucalipto plantado. Nascimento defende que os eucaliptos evitam que haja continuação da mata nativa para retirada de carvão. “Eu não conheço o plano de manejo [da empresa]. Mas pelo o que eu vejo, na prática não é bem assim”, discorda Maria Ester.

A intenção é que a cultura a ser implantada sirva para três cortes durante o seu ciclo produtivo, sendo um corte a cada ano. Nascimento garante que essas terras podem ser reaproveitadas infinitamente para novos plantios de eucalipto. “A preocupação é o que a empresa vai fazer depois desses três ciclos, o que ela planeja fazer”, questiona Brito. Ele teme que outras áreas sejam devastadas depois que os ciclos se encerrarem, pois o solo se desgastaria e não seria mais possível plantar eucalipto nessas mesmas terras. “A monocultura de eucalipto tem um pico de produção e é muito complicado conseguir manter a produção. A situação do eucalipto é semelhante ao da cultura de soja”. A agricultora concorda: “Vão ter que buscar outras terras para plantar eucalipto. Daqui a 20 ou 30 anos, vai ser tudo um deserto”.

Danos sócio-ambientais
Maria Ester afirma que as siderúrgicas espalhadas pela Amazônia no Estado do Maranhão trazem grandes prejuízos sócio-ambientais. “Uma boa parte da floresta nativa foi devastada. Preservaram algumas partes, como as áreas de morro, porque não dá para usar recursos mecanizados. Mas hoje, um dos maiores problemas é a poluição causada pela fumaça que sai dos fornos que queimam o carvão”. Ela explica que um outro problema do plantio de eucalipto é a contaminação de rios pelo uso de defensores e herbicidas. “Jamais o plantio de eucalipto vai compensar os danos ambientais que a siderurgia trouxe para a região e nem contribuir para a recuperação de mata nativa”.

Os ambientalistas alertam ainda para o fato de que os pequenos agricultores da região estão sendo cada vez mais afastados de suas terras por conta da pressão das siderurgias e têm como única alternativa se instalar em condições precárias na região da periferia. “Muitas comunidades locais de Açailândia foram afetadas, pois viviam com os recursos dessas florestas [desmatadas]”, afirma Mairom Brito.
Por Natália Suzuki, Agência Carta Maior

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