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2006-06-12
Que a temperatura global vai subir nas próximas décadas já é quase senso comum. Para cientistas como Emílio Moran, diretor do Centro Antropológico para Treinamento e Pesquisa em Mudanças Ambientais Globais da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, a tarefa, agora, é inserir nesse contexto a dimensão humana. “Com as mudanças climáticas, as latitudes das áreas para agricultura vão aumentar”, disse Moran à Agência FAPESP. Segundo ele, culturas como a soja terão mais espaço para avançar sobre a floresta. “Sem dúvida que a questão da posse da terra, por exemplo, terá que ser enfrentada nesse caso.”

O antropólogo esteve em São Paulo, na sede da FAPESP, nesta quinta-feira (08/06), para apresentar uma conferência sobre o impacto das ações humanas nas mudanças globais. A idéia de que o aumento da população e dos índices de pobreza registrados na Amazônia é que causam o desmatamento da floresta, para o pesquisador nascido em Cuba e radicado nos Estados Unidos, é um grande mito. “A realidade é que muitos programas geopolíticos de ocupação provocaram a diminuição da floresta nas últimas décadas. Até 1975, apenas 1% da região havia sido alterada”, explicou.

Autor de diversos livros sobre a Amazônia, Moran é um dos participantes do Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA), coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e gerenciado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

Pressão agrícola
Enquanto os campos amazônicos continuam vazios – a concentração de terra costuma agravar o problema da migração – as cidades crescem. “As ondas migratórias das populações voltadas para a agricultura serão cada vez maiores, exatamente por causa do aumento da temperatura em todo o planeta”, disse. Para o pesquisador, se na Amazônia a agricultura poderá pressionar cada vez mais a floresta, em processo que não implica aumento da qualidade de vida da população, não se pode mais separar mudanças climáticas das dimensões humanas. A partir dessa constatação, Moran tenta desenvolver meios científicos para enfrentar o problema.

“Sabemos que, hoje em dia, país algum tem desenvolvimento sustentável. É preciso, do ponto de vista da ciência, dar prioridade ao que a sociedade precisa saber. Devemos trabalhar juntos, com perguntas integradas desde o começo. Uma delas, por exemplo, diz respeito à relação entre mudanças climáticas e a produção agrícola ou a posse da terra nos vários países”, explicou.

Para Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que participou do evento realizado na FAPESP, a tão almejada sustentabilidade será atingida por meios científicos. “Temos que fazer um enorme investimento, inovador inclusive, nessa área. Esse investimento precisa estar voltado para as aptidões demonstradas pelos recursos naturais do Brasil”, afirmou. Segundo Nobre, no caso da Amazônia existe um enorme potencial escondido na biodiversidade que poderá dar mais retorno econômico inclusive que a agricultura. “O uso da terra na Amazônia está sendo feito de forma pouco eficiente”, disse.

De acordo com os pesquisadores presentes na conferência de Moran, não existem soluções que não passem pela visão integrada e também em multiescala (que considera o local, o nacional e o global). “O desenvolvimento econômico não pode ser descolado dos impactos negativos sobre o meio ambiente. E isso vale mais ainda para as cidades, que são um grande laboratório para estudar o efeito das mudanças do clima sobre a sociedade”, disse Moran.
(Por Eduardo Geraque, Agência FAPESP, 09/06/2006)
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