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2006-06-12
No dia em que as atenções estiveram voltadas para a abertura da Copa do Mundo (09/06), o Ibama e a Polícia Federal (PF) deflagraram no Acre e em Rondônia uma operação com estilo e importância da Curupira. O objetivo da Operação Novo Empate – nome inspirado no tipo de resistência pacífica realizada pelo seringueiro Chico Mendes contra a derrubada de florestas no Acre – foi desbaratar uma quadrilha de comércio ilegal de madeira formada por servidores públicos, lobistas, atravessadores e madeireiros que atuava também em Mato Grosso, Amazonas e São Paulo.

Mais uma vez, Autorizações para Transporte de Produtos Florestais (ATPFs) foram a peça chave para viabilizar o crime na floresta. Além de fraudadas, elas eram emitidas a pessoas não autorizadas. Segundo Flavio Montiel, diretor de Proteção Ambiental do Ibama, os crimes envolviam ainda o não cumprimento da reserva legal, o cancelamento indevido de débitos no sistema de controle de madeira e a conversão irregular de multas, o que pode ter custado ao país cerca de 150 mil metros cúbicos de madeira explorados ilegalmente.

Às seis horas da manhã, cerca de 300 policiais federais iniciaram os cumprimentos de 33 mandados de prisão e 75 de busca e apreensão de documentos em 18 cidades. As prisões aconteceram em escritórios de contabilidade, madeireiras e serrarias. O Diário Oficial da União publica no sábado (10/06) a exoneração de Josemar Amorim Caminha, chefe da Divisão Técnica da Superintendência do Ibama no Acre e a dispensa de seu substituto, Gilberto Alberto de Oliveira.

Por dentro do esquema
O foco das fraudes era o Acre, onde as ATPFs eram falsificadas ou adulteradas e vendidas a madeireiros em Rondônia por cerca de 4 mil reais. Os documentos eram usados para “esquentar” madeira ilegal cortada em terras públicas, áreas indígenas e unidades de conservação. O Ibama e a Polícia Federal descobriram também que servidores do Ibama e do Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac) não fiscalizavam florestas com planos de manejo autorizados pelos órgãos ambientais. Uma exigência legal que inviabilizaria, ou no mínimo complicaria, a emissão de ATPFs para áreas já desmatadas ou para madeira ilegal. Além disso, servidores preenchiam o Sistema de Controle do Fluxo de Madeira (Sismad) com dados errados para facilitar os crimes.

Esse sistema teria sido planejado em 1999 pelo engenheiro florestal Armando Nogueira, um dos maiores fraudadores empregados pelo Ibama no Pará. “Quanto de madeira e de dinheiro foi movimentado pela quadrilha só saberemos com o fim das investigações”, disse Paulo Lacerda, diretor-geral da Polícia Federal. Mas segundo nota divulgada pelo Ministério do Meio Ambiente e pela PF, o estrago não foi pequeno: um único intermediário retirou 7.540 de um total de 15.812 ATPFs emitidas pelo Ibama no Acre, em 2004. Ou seja, metade das ATPFs emitidas no estado naquele ano foram parar na mão da quadrilha. Segundo Montiel, foi registrada participação de servidores do Ibama, em maior ou menor grau, em todos os crimes denunciados nesta operação. Mas mesmo a partir de 2005, quando a função de liberar ATPFs passou a ser do estado do Acre e não mais do Ibama, as fraudes continuaram.

Primeiros indícios
Para Montiel, a operação Novo Empate é praticamente um desdobramento da Operação Curupira, que revelou a existência de uma quadrilha de contrabando de madeira no Mato Grosso com ramificação em outros estados. “Essa operação (Novo Empate) desmonta tentativas de aperfeiçoamento das organizações criminosas depois que aumentamos a fiscalização em campo”, diz.

Por isso, em junho de 2005, Marcus Barros, presidente do Ibama, enviou um ofício à PF solicitando inquérito policial para investigação criminal. Em agosto, os policiais já estavam na cola da quadrilha acreana. A ministra Marina Silva endossou o pedido do Ibama com uma denúncia do deputado Henrique Afonso (PT-AC) sobre a existência de uma organização criminosa no estado. E, em julho, o instituto instaurou uma sindicância para apurar as irregularidades ambientais no Acre e em Rondônia a partir de 2003, ainda que se soubesse da existência de fraudes antes disso. “Tivemos que delimitar um período para atuarmos de forma mais efetiva”, explica Montiel.

Desde que as primeiras investigações terminaram, em março, um outro grupo de trabalho foi criado para aprofundá-las ainda mais, o que promete novas revelações nos próximos meses. O Ibama informou que uma outra comissão de sindicância atua no Acre com o objetivo específico de levantar todas as informações de extravio de documentação referentes ao controle florestal entre 2000 e 2006.

Quanto à data da operação ter coincidido com o início da Copa do Mundo, Montiel garante que foi uma “infeliz coincidência”. Segundo ele, era necessário tornar a ação pública logo por se tratar de junho, um dos principais meses de corte de madeira na Amazônia. “Percebemos com as operações Curupira e Ouro Verde que essas investidas têm relação direta com a redução do desmatamento”. Pode até ser, mas estranho que na semana do Meio Ambiente, o governo tenha escolhido os 45 minutos do segundo tempo para divulgar crimes florestais no estado da ministra Marina Silva e onde o PT diz existir o “governo da floresta”.

O secretário de meio ambiente do Acre e presidente do Imac, Carlos Edgar de Deus, que pela manhã estava na fronteira com o Peru inaugurando uma brigada de incêndio formada por produtores rurais, disse que a operação o pegou de surpresa. “Eu preciso ver os autos de infração para comentar”, se esquivou. Ao retornar a Rio Branco descobriu tardiamente que uma de suas servidoras do Imac foi presa por fazer parte de uma quadrilha que cometia crimes ambientais debaixo do seu nariz.
(Andreia Fanzeres e Aldem Bourscheit, O Eco , 09/06/2006)

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