O futuro nos EUA é dos biocombustíveis
2006-06-06
Quando o presidente George W. Bush mencionou o pasto de capim agulha, a gramínea que originalmente adornava as grandes planícies da América do Norte, antes da chegada dos europeus, durante seu discurso sobre o Estado da União, em janeiro, deixou perplexa a maioria dos ouvintes. Não se surpreenderam somente aqueles que nunca haviam ouvido falar desse tipo de pasto, mas também aqueles que o conhecem e não esperavam que fosse citado por um oligarca do Texas. Bush escolheu os combustíveis alternativos, entre eles o etanol fabricado a partir desta gramínea, como um dos elementos essenciais para a salvação dos Estados Unidos em matéria energética, e batizou a biomassa como um meio para reduzir a perigosa dependência do petróleo importado.
A biomassa serve para produzir desde combustíveis para veículos até plásticos biodegradáveis. E, tanto durante seu processo de produção quanto em sua utilização, se reduz as emissões de gases causadores do efeito estufa. A biomassa pode ser obtida não só de colheitas de vegetais alimentícios, como também dos talos, bagaços e restos de forragem de grãos, que de outro modo acabariam no lixo. O biocombustível resultante destes restos é conhecido como etanol de celulose e é o mais promissor. Trata-se de um novo processo baseado na decomposição orgânica de fibras de plantas, acelerada pela manipulação biotécnica e por uma simples destilação de açúcares básicos, que converte os fibrosos corações das espigas de milho sem grãos, a palha do trigo, do arroz e de outros cultivos agrícolas, além de árvores de pequeno diâmetro, em uma ampla série de substitutos do petróleo.
A história começa durante a Segunda Guerra Mundial, na ilha de Guam, no Pacífico Sul, onde os soldados norte-americanos viram como as lonas de suas barracas se desintegravam de modo extremamente rápido e se somavam à putrefação da selva tropical. O culpado, segundo comprovaram, foi um minúsculo microorganismo com uma fome enorme por fibras de celulose. Sessenta anos depois, em um laboratório de Ottawa, uma companhia inovadora chamada Iogen analisou a enzima produzida por esse microorganismo e acelerou o processo da decomposição. Esta empresa agora volta sua atenção para Idaho, nos Estados Unidos, para ali construir a primeira bio-refinaria em grande escala.
Tradicionalmente, ao final da colheita, os agricultores queimam o que restou, enchendo o ar com a fumaça culpada pela mudança climática. Agora, os agricultores de Idaho vêem o potencial que estes restos têm para reavivar sua deprimida economia, já que a celulose que contêm servirá para produzir o etanol. Ao contrário do petróleo, o carvão, o urânio e outros combustíveis convencionais, os processos para obter biocombustíveis não são intensamente tóxicos para o meio ambiente.
As matérias-primas para o etanol procedentes da celulose não se limitam aos cultivos agrícolas. As florestas silvestres plenas de plantas daninhas podem produzir matéria-prima para o etanol se submetidas a uma classificação seletiva. Durante décadas, os ambientalistas contrários a todo corte de árvores lutaram contra as companhias madeireiras no que, na realidade, é uma falsa dicotomia entre postos de trabalho e meio ambiente. Entretanto, as florestas ou foram completamente cortadas ou cresceram com matagais altamente inflamáveis, que produzem incêndios calamitosos.
Muitos moradores de zonas rurais estão cansados tanto da irrestrita extração de recursos naturais como do ambientalismo intransigente. Os ambientalistas, que antes resistiam ao corte em florestas antigas, agora estão apreciando a sabedoria de uma classificação altamente seletiva, enquanto os madeireiros e o Serviço Florestal dos Estados Unidos se dão conta do valor desta alternativa, que poderia dar a futuras gerações a oportunidade de ver as florestas tão grandes quanto eram antigamente.
Um dos benefícios dos biocombustíveis é que oferecem a possibilidade de devolver as fontes de energia, a renda e o poder político a cada comunidade local. Em uma era em que o poder centralizado está se revelando cada vez mais ineficiente e indigno de confiança, este sistema energético e a porção de poder que propicia, poderia servir não só para fornecer luz e calor, como também para nos dar, como um subproduto, uma democracia mais ampla.
(Por Mark Sommer - diretor do programa de rádio A World of Possibilities, Envolverde, 05/06/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=18105