Ceará tem 171 cidades sem aterro sanitário
2006-06-06
Apenas 13 dos 184 municípios do Estado são atendidos atualmente por aterros sanitários de acordo com dados da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace). Os demais depositam seus lixos doméstico e hospitalar a céu aberto. Isso significa que apenas 7,06% das cidades do Interior acondicionam em locais apropriados os seus resíduos. O mais grave de tudo é que há famílias morando nos terrenos onde funcionam os lixões. Comem, dormem e catam o material despejado por caminhões duas vezes ao dia e, na maioria das vezes, sem se proteger de contaminações. Até as crianças e adolescentes ajudam na coleta do que pode ser vendido para reciclagem.
De acordo com a coordenadora de Controle e Proteção Ambiental da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), Maria Dias, os municípios atendidos por aterros sanitários são Caucaia, Fortaleza, Aquiraz, Eusébio, Maracanaú, Maranguape, Pacatuba, Sobral, Jaguaribara, Boa Viagem, Itapajé, Quixadá e Quixeramobim.
Em Juazeiro do Norte, na entrada da área onde é depositado o lixo, uma placa da Secretaria de Assistência Social, Trabalho e Cidadania avisa: "Conforme determinação do Ministério do Trabalho, fica proibida a permanência de crianças e adolescentes no lixão deste município". Naquela área moram cerca de 180 pessoas, segundo Francisca Raimunda Oliveira, 40. Ela diz que domingo a domingo permanece no local. "Tenho 11 filhos e é daqui que tiro o pão de cada dia. Quando chove é que a gente sofre para catar o material descartável".
No barraco, ela tem uma cama, fogão e objetos que conseguiu no dia-a-dia como catadora. "Jesus ainda vai me libertar desse lixo e eu vou vencer", diz e mostra a Bíblia na cabeceira da cama protegida por um mosqueteiro. "Aqui tem barata, mosca, muriçoca, escorpião e a gente dorme intranqüila. Não saio daqui porque não tenho para onde ir".
Mãe de cinco filhos - a mais nova Maria das Dores tem oito meses, e a mais velha, Jéssica, 15, - Marlene Alves, 32, teve de ir para o lixão porque não encontrou outra atividade para sobreviver. "Não tenho nem bolsa escola e nem bolsa família (benefícios concedidos pelo Governo Federal às famílias de baixa renda)". Ela vende café e bolo no lixão. Em casa, o marido vende lanches.
No município do Crato, há nove quilômetros de Juazeiro do Norte, o lixo também é depositado a céu aberto. São crianças, mulheres e homens que catam plástico, papel, vidro. "São, em média, 100 catadores por aqui", calcula Guiomar Gonçalves Ribeiro, 26. Diz que começou a ir pro lixão com 10 anos de idade. Atualmente é casado e tem três filhos, o de 6 anos já o acompanha quando vai catar material descartável no lixão. "Como não tem emprego na cidade, o jeito é a gente vir pra cá. Vendemos o plástico a R$ 0,20 o quilo e o papel a R$ 0,15", completa Paulo Pereira, 18, há 10 anos trabalho como catador.
VEJA O TEMPO DE DECOMPOSIÇÃO
- Vidro - um milhão de anos
- Borracha - tempo indeterminado
- Metal - mais de 100 anos
- Plástico - mais de 100 anos
- Náilon - mais de 30 anos
- Madeira - 13 anos
- Chiclete - cinco anos
- Filtro de cigarro - cinco anos
- Tecido - de seis meses a um ano
- Papel - de três a seis meses
Fonte: Banco de Dados
PROPOSTAS
Ibama notifica e multa municípios
Um grupo técnico, formado por representantes de órgãos federais, estaduais e municipais, além, dos prefeitos, está discutindo as propostas para a implantação dos aterros sanitários. A medida surgiu a partir de multas e notificações aplicadas pelo Ibama
Canindé e Madalena. Foram os dois municípios multados pelo Instituto Brasileiro de Recursos Naturais Renováveis e Meio Ambiente (Ibama) pela disposição de resíduos sólidos a céu aberto. As multas aplicadas, segundo o superintendente-adjunto do escritório do órgão no Ceará, Francisco João Juvêncio, podem chegar a R$ 75 mil caso a situação permaneça. Outras 44 prefeituras cearense já foram notificadas.
Foi a partir destas iniciativas, por determinação do Ministério do Meio Ambiente, segundo Juvêncio, que a Associação dos Municípios e Prefeitos do Estado do Ceará (Aprece) solicitou um prazo para que houvesse intermediação e elaboração de estudos técnicos para a construção de aterros sanitários. "O Ibama acatou e tivemos audiência com a Aprece, órgãos estaduais, municipais e o Ministério Público, por meio da procuradora Sheila Pitombeira da Procuradoria Geral de Justiça (PGJ), para formar uma Câmara Técnica que passou a discutir o assunto".
A próxima reunião do grupo, segundo Sheila Pitombeira, está marcada pela manhã do próximo dia 29, na sede da PGJ, para discutir a minuta do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). As reuniões tiveram início há cerca de 60 dias e a procuradora acredita que, no final do próximo mês, os TACs já estejam acertados e assinados pelos prefeitos ou seus representantes, para que comecem a implantação dos aterros. Ela reconhece que algumas prefeituras terão dificuldades por causa dos recursos mas que há como solicitá-los.
O Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) disponibiliza editais para a construção de aterros sanitários a partir de propostas técnicas. Segundo a coordenadora de Controle e Proteção Ambiental da Superintendente Estadual de Meio Ambiente (Semace), Maria Dias, o órgão tem um diagnóstico preliminar da situação dos municípios cearenses quanto à disposição dos resíduos sólidos. Ainda está sendo feita a coleta de dados e até o fim deste mês o trabalho será concluído. Mesmo assim, as informações iniciais já foram repassadas à procuradora Sheila Pitombeira para auxiliar na agilização dos trabalhos da Câmara Técnica da qual o órgão participa.
(Por Rita Célia Faheina, O Povo, 05/06/2006)
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