O Canadá, um dos países que mais se esforçou para que o Protocolo de Kyoto desse certo durante todo o período de negociações multilaterais para a redução mundial da emissão de gases causadores de efeito estufa, tem se afastado das orientações do acordo nos últimos meses. A mudança de rumos teve início desde que o Partido Conservador assumiu o governo do país este ano e anunciou que não iria mais cumprir os compromissos firmados pelo Protocolo.
Todas as políticas canadenses e programas de governo para redução de emissões de poluentes, como investimento em energia limpa e comércio de carbono, tiveram o orçamento cortado pelo governo atual. O discurso oficial usado é de que o Canadá não estaria abandonando o Protocolo, mas assume que seria impossível cumprir suas metas no período determinado de 2008 a 2012. “O partido é de extrema-direita e tem uma política afinada com a de Bush. É um partido muito contra o Protocolo de Kyoto”, afirma Mark Lutes, pesquisador associado ao setor de estudos climáticos da organização não-governamental Vitae Civilis.
O pesquisador afirma que a postura do Canadá é uma estratégia para o país se esquivar de suas obrigações de cumprir o que prometeu. As emissões canadenses tiveram um aumento significativo desde o começo da década de 90. “O governo demorou muito para implantar políticas para reduzir as emissões”, avalia Lutes. Foi apenas a partir do ano passado que o Canadá introduziu um plano estratégico para conter e reduzir as emissões até a chegada dos conservadores ao poder.
O Partido Conservador tem sede na província canadense de Alberta, onde o país concentra as suas maiores indústrias de petróleo. Muita energia é gasta para processar o tipo de petróleo que há nessa região. Lutes explica que a contradição é que as petrolíferas usam gás natural como matriz energética. “Usam uma fonte limpa para fazer o petróleo que é uma fonte suja”.
Não há sanções previstas para o descumprimento das orientações do Protocolo de Kyoto, a não ser a posição contrária da opinião pública da comunidade internacional. Segundo Lutes, o Canadá é o único país entre os que ratificaram o acordo que está se posicionando dessa forma. Segundo o artigo 27.1 do Protocolo, os países signatários só podem se retirar formalmente do acordo após três anos da data que o documento entrou em vigor (fevereiro de 2005).
”Perigo Significativo”
Para Mark Lutes, a posição que o governo canadense vem assumindo é uma ameaça para as futuras negociações de Kyoto, pois o Canadá é um país que agrega consenso nas discussões de assuntos climáticos. “É um perigo significativo. Em Montreal (2005), o mundo decidiu ir em frente sem os Estados Unidos [na adoção do Protocolo de Kyoto]. Para países como o Japão, Nova Zelândia e Noruega foi muito difícil seguir sem os EUA. O Canadá era o maior responsável por esse avanço e agora está pulando fora”, disse.
Após 2012, quando acaba o primeiro período de negociações e ações dos países que assinaram o Protocolo, os membros devem definir os rumos para a próxima etapa, e segundo Lutes, o Canadá deve tentar bloquear o progresso das negociações. Ele explica que as metas que não foram alcançadas no primeiro período se somam às do período seguinte. Para o pesquisador, a maior implicação é que se não houver perspectivas para uma segunda fase de negociações, todas as ações até 2012 perdem o sentido.
Brasil
Apesar de fazer parte do Protocolo de Kyoto, o Brasil, assim como os demais países em desenvolvimento, não possui metas de redução de emissões de gases. O curioso é que o país ocupa hoje o quinto lugar dos maiores emissores do mundo. “O Brasil deve repensar uma meta para, no próximo período, discutir como avançar. O Brasil é altamente industrializado e o seu desmatamento é responsável por 75% das emissões”, opina Lutes. Para ele, os países em desenvolvimento devem ter metas estabelecidas, caso contrário será muito difícil para os países já desenvolvidos se convencerem a adotar índices maiores de redução de gases de efeito estufa.
Por Natália Suzuki,
Agência Carta Maior