Por Ricardo Rose*
O Brasil é um país tradicionalmente afeito às definições. No impasse, define-se uma nova política para isso e uma nova diretriz para aquilo, que muitas vezes acabam esquecidas e não são colocadas em prática. Tenta-se definir, detalhar e perde-se muito tempo olhando para as árvores, sem enxergar a floresta. É o que acontece, por exemplo, com o uso do termo desenvolvimento sustentável. A expressão, que passou a ser amplamente utilizada depois de sua divulgação através do Relatório Brundland, em 1987, foi incorporada ao vocabulário diário da sociedade. Mesmo assim (ou exatamente por isso), ainda é motivo de discussões acirradas.
Alguns, de visão econômica mais intervencionista, defendem que a expressão é errada, que se trata de um oximoro, já que "desenvolvimento" não pode ser sustentável, pois causa impactos econômicos e sócio-ambientais. Outros, mais entusiastas da mão invisível do mercado, acham que o termo é aplicável a situações específicas, onde são contemplados os aspectos econômicos, sociais e ambientais. Existem muitas definições do termo desenvolvimento sustentável e, a cada dia, inventam-se novas. Enquanto avançam as discussões, calcadas em posições ideológicas ou interesses econômicos, a Amazônia é transformada em carvão e os rios, em cloaca.
Enquanto isso...
É curiosa esta freqüente utilização do termo desenvolvimento sustentável por diversos agentes. Estes empregam a expressão de olho nos benefícios para a sociedade, aqueles nos benefícios para seus bolsos. Atualmente, um alienígena que chegasse a Brasília e que não tivesse percorrido o País, conhecendo-o apenas através de determinada mídia, teria a nítida impressão de não mais existirem grandes pendências econômicas, sociais e ambientais a serem resolvidas e que estaríamos quase alcançando o desenvolvimento sustentável (seja lá o que for isso). No mundo real, as coisas são completamente diferentes. Vivemos em um país onde:
• A maioria das empresas luta diariamente para sobreviver, tentando vender para um mercado consumidor que não se amplia e cujo poder de compra vem gradualmente caindo;
• A questão ambiental na prática não tem prioridade para os governos, fazendo com que órgãos legisladores e controladores não tenham recursos para desempenhar suas funções;
• A questão social recebe o tratamento que todos conhecemos: sistema de saúde desaparelhado, sistema previdenciário sem recursos e justiça morosa.
Caindo na real
Desnecessário relacionar as mazelas que todos conhecemos e com as quais convivemos ao longo de tantos governos. Apesar dos esforços de todos, Governo, empresas, instituições e sociedade civil, ainda temos muito trabalho pela frente no que diz respeito ao desenvolvimento sustentado. O tipo de desenvolvimento que precisamos no momento é o que temos condições financeiras, sociais e culturais de efetivamente programar: o "arroz com feijão", a geração de mais e melhores empregos, a melhoria das condições sociais e o efetivo cumprimento da legislação ambiental. Pode não ser tão sofisticado quanto o desenvolvimento sustentado, mas pelo menos é o que deveríamos ter capacidade de programar em pouco espaço de tempo. Quanto ao desenvolvimento sustentado, se efetivamente for possível, este será uma conseqüência das boas práticas que utilizarmos nos próximos anos.
* Ricardo Rose é Jornalista e Diretor de Meio Ambiente da Câmara Brasil-Alemanha. Artigo publicado originalmente na
newsletter do Prêmio Ambiental von Martius, 01/06/2006.