Saneamento: Pará joga R$ 4,4 milhões pelo ralo
2006-06-01
O Pará joga fora todos os meses R$ 4,4 milhões em dinheiro público, aplicado no tratamento de 9 milhões de metros cúbicos de água desperdiçados pelo próprio sistema da Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa). Isso sem falar nos 25% de água tratada desperdiçados pelos consumidores, o equivalente a 5, 250 milhões de metros cúbicos. Isso torna a escolha do sistema hídrico a ser explorado para a retirada de água bruta um dilemma para técnicos, políticos e especialistas. Os números mostram que a produção de água é um problema político e social, que exige um debate sobre a forma mais barata de captação, tratamento e distribuição aos consumidores. Em uma cidade como Belém, onde o desperdício alcança o absurdo índice de 40%, 17% deles somente no próprio sistema, são necessários estudos urgentes e uma reflexão sobre os investimentos na produção de água, para que o consumidor não continue pagando muito caro por essas perdas, pela falta da água em muitos bairros e pelos recursos que se perdem por causa do desperdício.
Desperdício de água tratada, seja pelo Poder Público ou pelo consumidor, deveria ser considerado crime, porque isso rouba a qualidade de vida de milhares de outras pessoas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 80% das doenças de veiculação hídrica são provocadas por águas contaminadas. No caso de Belém, calcula-se que 400 mil pessoas vivam sem água tratada. Elas utilizam o chamado poço amazonas, escavado no fundo do quintal, sem proteção contra contaminações e muito próximo às fossas, também construídas de forma inadequada.
Apesar de manter 24 sistemas independentes de produção de água, nos chamados poços profundos, o grande investimento da Cosanpa, com recursos do FGTS, ainda se concentra na duplicação das Estações de Captação de Água Bruta do Rio Guamá, onde serão investidos R$ 12 milhões, e de Tratamento de Água do Bolonha, onde estão sendo aplicados R$ 43 milhões. Com esse projeto a Cosanpa afirma que dobrará a quantidade de água tratada ofertada à população na Região Metropolitana de Belém. Além do investimento de R$ 6 milhões em mais seis poços profundos.
O projeto poderá acabar com a seca para moradores dos bairros do Guamá e Terra Firme, como o bombeiro hidráulico Valdir Pantoja, 57 anos, que paga um carregador para levar água de um tubo do outro lado do igarapé do Tucunduba até a casa dele. Jacira Soares da Silva, dona-de-casa, apara água para ela e mais sete pessoas da família, no mesmo tubo que é um dos pontos de desperdício no limite entre os dois bairros da cidade onde a água não chega a milhares de famílias.
Em uma Área de Proteção Ambiental (APA), na região do Curió-Utinga, a Cosanpa mantêm os lagos Bolonha e Água Preta, que recebem água do rio Guamá para abastecer Belém. O doutor Milton Antonio da Silva Matta, do Departamento de Geologia, do Centro de Geociências da Universidade Federal do Pará, sugere que a Cosanpa transforme o espaço no mais rico e bonito parque ecológico e turístico de Belém, um centro de referência em educação ambiental.
Defensor da captação de águas subterrâneas, ele afirma que está na hora de acabar com o alto custo das estações de captação de água bruta superficial do rio Guamá e de tratamento. Para ele, a solução para o abastecimento com água tratada são os poços profundos. Autor do mais completo estudo dos sistemas hídricos subterrâneos em Belém e Ananindeua, intitulado Fundamentos Hidrogeológicos Para Gestão Integrada dos Recursos Hídricos da Região de Belém e Ananindeua, Milton Matta informa que a região tem uma reserva total superior a 10 bilhões e 600 milhões de metros cúbicos de água, a maior parte renovável. Mas sem precisar mexer nessa riqueza, só a reserva parcial que entra no sistema já seria capaz de abastecer cerca de 70% dos consumidores em Belém com água até 40% mais barata, de melhor qualidade e sem necessidade de grandes estações de tratamento. Segundo ele, os métodos e a gestão dos recursos hídricos estão em crise por causa de decisões equivocadas. “ Um dos males sobre a água é político; em poço profundo não há espaço para placas e grandes festas de inauguração”, ironiza.
Milton Matta aponta inúmeras vantagens da captação de água subterrânea e sobre a qualidade do produto encontrado a partir de150 metros de profundidade. Segundo ele, a água subterrânea tem melhor qualidade físico-química, está mais protegida da contaminação e da evaporação e é pouco vulnerável. Em seu trabalho, ele também indica 17 propostas para melhorar a gestão dos recursos hídricos. “A água subterrânea é uma alternativa muito mais eficiente e abundante, é um investimento gradativo, conforme a necessidade no local, enquanto o alto investimento em produção de água superficial é projetado para uma demanda limitada”.
Para o diretor de Expansão e Tecnologia da Cosanpa, engenheiro sanitarista Wady Homci, que mantêm 24 sistemas independentes de abastecimento de água, correspondente a 20 por cento da captação, o sistema de poços é limitado. Mas a empresa está expandindo o sistema de forma integrada. “É uma estratégia da empresa para resolver os problemas de abastecimento em bairros como a Terra Firme e em áreas como a da chamada CDP”, defende. Hoje o Brasil tem 200.000 poços tubulares, que abastecem 51% da água consumida no país.
Igarapé-Miri protesta contra a falta de água
Há pelo menos 30 dias os moradores de Igarapé Miri estão sem água, segundo o vereador Valdemir Martins. O problema começou quando três bombas do sistema de abastecimento da cidade queimaram. Técnicos da Cosampa trouxeram o equipamento a Belém, com a promessa de que, assim que os danos estivessem reparados, as bombas retornariam a Igarapé Miri, o que não aconteceu.
O vereador diz que o enguiço nas bombas de água trouxe transtornos aos moradores dos bairros mais pobres. “As pessoas estão sem água para tomar banho, para cozinhar e lavar roupa. Houve a promessa de que isso seria resolvido com o Projeto Alvorada. Mas os responsáveis desviaram os recursos e continuamos sem água”, reclama o vereador.
A assessoria de comunicação da Cosanpa explica que desde as 13 horas de ontem o serviço está normalizado na Cidade Nova, em Igarapé Miri. “A situação ocorreu devido problema eletromecânico em um conjunto motor-bomba. Outros três conjuntos motor-bombas funcionam normalmente”, garante a assessoria. A nota informa também que a empresa restabeleceria ainda ontem o abastecimento de água para o Centro, que, desde o último domingo teve o fornecimento reduzido por causa da queima em um dos dois conjuntos motor-bomba. “A Cosanpa explica ainda que os bairros abastecidos pela empresa em Igarapé Miri são: Centro, Perpétuo Socorro, Cidade Nova e Tucumã. Já os bairros Boa Esperança, Cinco Bocas, Matinha e Jatuíra estão sob a responsabilidade da prefeitura do município”.
Por Jorge Herberth, de O Liberal, 31/5.