Parte da Floresta Amazônica corre o risco de virar savana
2006-05-30
Se os desmatamentos e as queimadas continuarem, dentro de meio século
uma grande parte da Floresta Amazônica vai se transformar em savana. O
alerta fez parte das discussões que nortearam o 8º Congresso e Exposição
Internacional sobre Florestas que aconteceu em Cuiabá na semana
passada.
Savana é uma região plana cuja vegetação predominante são as gramíneas,
salpicadas por algumas árvores esparsas e arbustos isolados ou em
pequenos grupos.
De maneira mais incisiva, o engenheiro florestal Paulo César Nunes do
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) diz que “todos
sabem e a comunidade científica tem essa consciência que nos próximos
vinte anos o que vai sobrar da Floresta Amazônica vai estará dentro dos
parques e das reservas indígenas”.
Por isso, segundo ele, é que hoje existem várias ações voltadas para a
criação de Unidades de Conservação - Parques e Reservas Indígenas. Além
disso, há uma grande pressão de ambientalistas para que os governos
federal, estadual e municipais tenham legislações mais rigorosas com
relação ao meio ambiente.
Com relação à Floresta Amazônica as previsões são assustadoras. De
acordo com os pesquisadores que fazem parte do projeto Experimento de
Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA), o desmatamento e as
queimadas na Amazônia estão modificando o clima e ampliando o efeito
estufa no planeta.
As queimadas e o aquecimento global poderão transformar de 20 a 30% do
que ainda resta da Floresta Amazônica.
Contribuição de MT
Mato Grosso, onde a Floresta Amazônica tomba a taxas alucinantes para
dar lugar a pasto e lavoura, é o lugar com o maior número de queimadas
no planeta. E a maior parte desse fogo vem justamente da derrubada da
mata.
Há mais de 20 anos, Mato Grosso, possuía em seu território 11% da
floresta amazônica existente no Brasil. Hoje, o que resta da floresta dentro
do estado restringe-se a um pequeno pedaço da região noroeste.
É nesse espaço que mesmo sob pressão de ávidos madeireiros e de
assentados que lutam pela sobrevivência tentam manter um pouco do planeta
Terra ainda respirando.
As ações desenvolvidas por esses grupos podem ser comparadas a um
grande mosaico ou um quebra-cabeça onde cada um faz uma atividade que tem
por objetivo conservar a biodiversidade da Amazônia.
A maior parte do fogo registrado em Mato Grosso vem justamente da
derrubada da mata, diferentemente do que os cientistas imaginavam.
A conclusão é de dois estudos independentes feitos por pesquisadores
americanos com base em dados dos satélites Terra e Aqua da Nasa (Agência
Espacial dos EUA) e apresentados na semana passada durante reunião da
LBA (Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia) em
Brasília.
Um dos estudos monitorou as queimadas no mundo inteiro entre 2000 e
2005 para saber que regiões do planeta queimam mais, e em que épocas do
ano. O outro focou para o arco do desmatamento amazônico (principalmente
o norte de Mato Grosso) nesse mesmo período, para saber o que queima.
Pesquisadores da Nasa montaram o primeiro mapa global de intensidade de
fogo. Segundo eles, a região que mais concentra pixels (pontos) de
calor em seu mapeamento é a do arco do desmatamento. “Essa é uma região de
intensa conversão da cobertura vegetal, na qual a floresta tropical vem
sendo rapidamente transformada em pasto, com queima subseqüente da
floresta”, concluíram.
O estudo é inovador porque usa os sensores Modis, a bordo do Terra e do
Aqua, especialmente construídos para detectar focos de calor. Os outros
satélites não serviam para a tarefa.
Projetos mostram luta pelo equilíbrio ecológico
Os projetos “Conservação e uso Sustentável da Biodiversidade nas
Florestas do Noroeste de Mato Grosso”, desenvolvido pelo PNUD, e
“Reflorestamento para Seqüestro de Carbono”, da Peugeot, por meio da ONF (ONG
franco-brasileira), são dois exemplos do que se pode considerar peças de um
grande mosaico na luta pela manutenção do equilíbrio da biodiversidade
da Amazônia.
Os dois projetos são desenvolvidos na última reserva da floresta
Amazônica em Mato Grosso. O projeto do PNUD atinge sete municípios (Juína,
Castanheira, Juruena, Cotriguaçu, Colniza, Aripuanã e Rondolândia). O da
ONF fica localizado em Juruena.
A uma primeira vista, o nome do projeto “Seqüestro do Carbono” parece
estranho, mas nada mais acertado porque consiste justamente na captura
do gás carbono liberado na atmosfera.
No planeta, existe o que conhecemos como ciclo do carbono, que ocorre
da seguinte maneira: seres vivos em decomposição, processos
respiratórios e a queima de matéria orgânica liberam carbono na forma de CO², que é
reabsorvido pelas plantas por meio da fotossíntese, constituindo assim
um ciclo.
No entanto, a queima de combustíveis fósseis e as queimadas têm
liberado muito mais carbono do que as plantas podem absorver. Essa ação do
homem desequilibra o ciclo, pois faz com que haja muito carbono dissolvido
na atmosfera, favorecendo o efeito estufa e o aumento da temperatura no
planeta.
A ONF Brasil comprou a fazenda São Nicolau, situada à margem esquerda
do rio Juruena, e através do reflorestamento luta contra o efeito
estufa.
O plantio compõe-se basicamente de 40 espécies nativas e pela teca –
espécie exótica que serve como comparativo de crescimento. Dentre as
espécies nativas plantadas, destacam-se os ipês, o louro-frejó, o cajá e a
figueira.
Os primeiros balanços revelam que foram retirados do ar aproximadamente
5,5 toneladas equivalentes de gás carbono por hectare/ano.
O engenheiro florestal da ONF Brasil José Vespasiano Assumpção disse
que a meta é, num prazo de quarenta anos, integrar a floresta replantada
com a nativa.
O PNUD, por sua vez, busca através de ações alternativas garantir as
áreas demarcadas como protegidas – parques e reservas. “A idéia é criar
um corredor de proteção em torno dessas áreas”, disse o coordenador
Paulo Cezar Nunes.
“Queremos dizer e fazer eles entenderem que é possível explorar
economicamente com preservação da floresta”, observa. Para atingir essa meta,
o projeto atua de imediato em duas frentes. Uma é com a agricultura
familiar e a outra, um trabalho com as nações indígenas da região.
O LBA é um projeto internacional que estuda o ecossistema da Amazônia.
Os pesquisadores envolvidos no experimento se reúnem a cada dois anos
para divulgar suas descobertas e debater a melhor maneira de aplicar os
resultados dos estudos na formulação de políticas públicas voltadas ao
desenvolvimento sustentável da região.
Floresta é alvo de interesses distintos na exploração
Madeireiros que fazem frente à exploração racional Ao longo dos anos, a
Floresta Amazônica vem sendo alvo de interesses distintos. De um lado,
madeireiros e fazendeiros têm agido de forma indiscriminada, retirando
madeira para comercialização ou abrindo grandes clareiras para
pastagem.
Do outro, os seringueiros fazem associações para definir a melhor forma
de extrativismo na floresta, o qual nem sempre é realizado de modo
sustentável.
E por outro lado, pesquisadores tentam avaliar os danos causados até
agora pelo homem e prever o que acontecerá se medidas contra o
desmatamento e as queimadas não forem tomadas imediatamente, pois se trata de
problemas que atingem a maior floresta equatorial contínua do planeta.
Entre os pesquisadores estão estudiosos da LBA que colocaram torres
dispersas na Amazônia para verificar o que está acontecendo com o excesso
de CO² (dióxido de carbono) existente na natureza e, assim, descobriram
que a Floresta Amazônica retira mais CO² do que libera; portanto,
poderia estar auxiliando na redução do excesso do gás na atmosfera.
As queimadas e desmatamentos praticados na Amazônia têm efeitos que se
alastram por todo o planeta, podendo gerar um desequilíbrio do qual
ainda não temos conhecimento.
Por Fátima Lessa , Folha do Estado, 28/05/06.
http://www.folhadoestado.com.br/cidades/?mat_id=121993