Governos superestimam área de manejo florestal, afirma relatório
2006-05-30
O tamanho das áreas de exploração sustentável em florestas tropicais
está sendo superestimado por governos e proprietários de terra, revela um
levantamento global. Três quartos dos planos de manejo sustentável não
conseguem sair do papel, segundo um relatório divulgado na semana
passada pela ITTO (Organização Internacional da Madeira Tropical), ligada à
ONU.
Cerca de 27% dos 353 milhões de hectares de mata tropical fora de
reservas pertence a programas de exploração legalizados. A ITTO estima,
porém, que só 7% da área seja ao mesmo tempo produtiva e sustentável
-produzindo madeira certificada, por exemplo.
"Empresas podem acatar os requisitos para o manejo sustentável ao mesmo
tempo em que continuam empregando práticas destrutivas de extração de
madeira", diz Steve Johnson, um dos editores do relatório. "É preciso
uma vigilância mais dedicada."
Nem todos os números do documento são pessimistas. A área de mata
explorada de maneira não-predatória cresceu de 1 milhão para 36 milhões de
hectares desde 1988. Só que esse aumento não ajudou muito na
preservação. Cerca 95% das florestas tropicais do planeta ainda estão ameaçadas.
Baixa lucratividade
A grande dificuldade de contar com a exploração sustentável como
política de preservação, ao que parece, se deve à baixa margem de lucro da
atividade comparada a outras formas de uso da terra. "O manejo florestal
não tem a menor condição de competir com soja e gado [que avançam sobre
a Amazônia] ou com espécies de árvore de crescimento rápido, como está
acontecendo no Sudeste Asiático", diz o brasileiro Manoel Sobral Filho,
diretor-executivo da ITTO.
Para que um terreno florestado seja mais rentável com as árvores em pé,
será necessário algo além do lucro da madeira. A remuneração extra
poderia vir de créditos de carbono concedidos por desmatamento evitado, um
mecanismo em discussão no âmbito da Convenção do Clima da ONU. (O
desmate libera gás carbônico, que agrava o efeito estufa.)
Segundo uma estimativa do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da
Amazônia), uma remuneração de US$ 4 para cada tonelada de carbono
mantida em árvores vivas pode tornar a floresta mais rentável do que a
pastagem, se somada ao lucro da madeira certificada por um período de 30
anos.
Paulo Barreto, pesquisador do Imazon, diz não acreditar que o uso
sustentável das florestas esteja condenado a não ser competitivo. "Mas é
preciso remunerar a floresta pelos outros valores que ela tem."
Para a ITTO, porém, a floresta não tem pernas para dar um salto tão
grande no mercado. "O dono da floresta, seja ele o governo ou um
indivíduo, precisa se contentar em ter um lucro menor", diz Sobral.
A ITTO aponta que a dificuldade de preservar florestas, especialmente
no caso do Brasil, passa pela falta de infra-estrutura de fiscalização.
Além disso, há o vácuo deixado por um grande número de áreas públicas
que poderiam ser licenciadas para exploração, e que ficam à mercê da
grilagem.
Atualmente com 1,4 milhão de hectares reservado à exploração florestal,
o Brasil fica atrás de Malásia (4,8 milhões), Bolívia (2,2 milhões) e
Gabão (1,5 milhão).
Por Rafael Garcia, Folha de S. Paulo, 29/05/06.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2905200603.htm