Fenômeno mundial está prejudicando produção de uvas; indústria movimenta US$ 2,4
bilhões. O aquecimento do planeta está acabando com os vinhedos no sul da
Espanha, pondo em perigo uma indústria vinícola de US$ 2,4 bilhões, e obrigando
os vinicultores a se trasladar para o clima mais ameno dos Pirineus.
Os vinicultores do país com maior produção de uvas na Europa estão colocando os
vinhedos à sombra, desenvolvendo um cultivo mais resistente ao calor e
trasladando-se para locais perto de montanhas. "As temperaturas poderão subir
7 graus Celsius até o final do século", diz José Manuel Moreno, professor de
climatologia na Universidade de Castilla La Mancha.
"Um avanço da temperatura na Espanha poderá impossibilitar a produção de vinho
nas zonas mais meridionais do país", afirma Xavier Sort, diretor técnico da
empresa Miguel Torres, produtora do vinho Sangre de Toro. A temperatura máxima
de verão registrada na Espanha é de cerca de 29 graus Celsius.
"A agricultura terá que mudar e surgirão vencedores e perdedores", diz Moreno.
"O aquecimento global prejudicará todas as plantas que duram mais de uma
temporada, como os vinhedos."
A Miguel Torres, com sede perto de Barcelona, está adquirindo terrenos no
nordeste da Espanha, "onde as temperaturas são mais frescas" completa Sort. O
produtor do Castell d’Encus, Raul Bobet, escolheu um local nos Pirineus,
localizado a mil metros de altura, para estabelecer sua marca. Segundo Sort, da
Miguel Torres, pode ser que os vinhedos se mudem para os Pirineus mais tarde. "O
local poderá ser uma fonte de futuro crescimento."
"Os produtores de vinho devem planificar no mais longo prazo para proteger suas
uvas, já que os vinhedos podem frutificar por um período de 80 anos, portanto as
vinhas estarão expostas a várias gerações de climas mais quentes", afirma
Richard Smart, consultor do setor vinícola australiano que presta assessoria
sobre a mudança climática.
O calor e a luz do sol aumentam o nível de açúcar das uvas, o que pode
impulsionar seu teor de álcool além do admissível pelo paladar. Um clima mais
quente pode reduzir a acidez da uva, mudando seu sabor, enquanto períodos frios
e chuvosos podem acabar com a colheita de um ano.
Em Málaga e Cádiz, as regiões vinícolas mais meridionais da Espanha, as
temperaturas podem alcançar os 40 graus durante os meses de verão. A Espanha é
o país vinícola da Europa mais perto do equador, o que a torna especialmente
vulnerável às mudanças climáticas.
"A mudança no clima é o maior problema do meio ambiente enfrentado pela
sociedade moderna", diz José Ramón Picatoste, do Ministério do Meio Ambiente da
Espanha. "Todos os setores precisam se adaptar, e os produtores de vinho são um
deles."
A Espanha foi o quarto país maior exportador de vinhos em 2004, segundo dados da
Organização das Nações Unidas (ONU), depois de França, Itália e Austrália.
"Uma variação de um grau na temperatura faz com que as regiões vinícolas do
Hemisfério Norte se igualem às regiões 200 km mais ao sul", informa Bernard
Seguin, cientista do Instituto Nacional para Pesquisas Agronômicas na França.
"O problema não é tão grave caso se possa mudar a variedade da uva", explica
Seguin. "Se isso não é possível, então o aquecimento se transforma, de fato, em
um problema mais sério. Na minha opinião, é o exemplo mais direto de aquecimento
até o momento."
Algum vinicultores podem se beneficiar com um clima mais quente, na opinião de
Carlos Falco, diretor da Marqués de Griñón, que produz nas regiões vinícolas
da La Rioja e Montes de Toledo. O clima quente de 2003 permitiu para as regiões
de Priorat e Ribera del Duero, no norte da Espanha, uma classificação de mais
de 90 na publicação Wine Spectator.
Os órgãos reguladores mantiveram a prática do século XIX, quando as doenças nos
vinhedos da França fizeram os produtores mudar seus cultivos para a região de
La Rioja.
Enquanto adegas como Codorniú, de La Rioja e Ribera del Duero, adotam técnicas
de irrigação automática, os órgãos regadores de La Rioja ainda restringem as
horas de irrigação permitidas aos vinhedos. A irrigação das uvas foi legalizada
na Espanha em 1996.
"A capacidade de irrigação dos vinhedos será um problema crucial", diz Christian
Butzke, professor adjunto de enologia na Purdue University em West Lafayette,
Indiana (EUA). "As uvas são o produto de maior valor conhecido na agricultura",
informa Butzke. "Nenhum outro cultivo pode se tornar um produto tão caro."
(Gazeta Mercantil/Bloomberg News, 23/05/06)
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