Índios do Xingu resistem à hidrelétrica Paranatinga II
2006-05-24
Lideranças indígenas jovens do Parque Nacional do Xingu, onde vivem 15 etnias, estão resistindo à conclusão da barragem da Pequena Central Hidrelétrica Paranatinga II (29 mil quilowatts), nos municípios de Paranatinga e Campinápolis, em Mato Grosso. A obra, a 30 quilômetros de Parabubure, poderá poluir o rio Kuluene, o principal formador do Rio Xingu.
A barragem fica a oito quilômetros do rio Kuluene e ameaça causar danos ambientais irrecuperáveis sobre o território indígena. A pesca está prejudicada e o assoreamento pode ser inevitável. A construção incide sobre a área sagrada onde houve o primeiro Quarup, em tempos imemoriais, segundo a mitologia dos povos do Alto Xingu.
Sucessivas escavações contribuíram para o fenômeno negativo. A correnteza do rio não é mais a mesma, por isso, a locomoção também foi prejudicada, relatam os índios.
A insatisfação dos índios foi motivada pela falta de proteção ao entorno do Parque, quase 50 anos depois da presença dos seus maiores incentivadores, os irmãos Villas-Bôas.
Em 18 de fevereiro de 2005, o juiz federal Julier Sebastião da Silva determinou a interrupção da obra, e proibiu que a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fema) conduzisse o licenciamento ambiental.
A energia ali produzida vai beneficiar, principalmente, fazendeiros de soja. A sentença judicial divulgada em 11 de abril deste ano anula a licença da Fema e determina que a empreendedora suspenda a obra, sob pena de pagar multa de R$ 10 mil por dia e eventual demolição do que já está concluído.
A maioria das etnias não foi consultada. Assinaram o documento do governo dois caciques Kuikuro, dois Ywalapiti, um Awet, e um Mehinako. Dois caciques, Aritana e Iacomin, assinam pelas etnias Matipo, Nafukoa, Waurá, Suiá, Kaiabi, Yudja, Trumai e Ikpeng. Daí, as divergências e a resistência crescente ao projeto.
A hidrelétrica não polui, mas o impacto ambiental se deve a um grave fator: os motores só funcionam com lubrificante. As águas contaminadas prejudicarão futuras gerações indígenas.
Os índios lembram que, durante o período da seca, enfrentam problemas com o fluxo da água e a quantidade de peixes. Os rios, eles alertam, são fonte de alimentos das comunidades. Eles já estão cercados por lavouras de soja, nas quais há um despejo sistemático de herbicidas.
Wulkai Suiá, 27 anos, revelou, ontem, que seu povo soube da usina só durante o Encontro da Nascente do Rio Xingu, promovido pelo governo mato-grossense, Funai, e diversas instituições, em 2004 — seis meses depois de os construtores desembarcarem em Canarana e Paranatinga.
“Ficamos tristes, depois pedimos ajuda às autoridades, mas nada recebemos. Protestamos, e o governador (Blairo Maggi), que vem agredindo a natureza, disse que não se intimidaria. Esperamos a Justiça, e nada! A barragem ficou pronta, o rio está sujo, baixando, a pesca e as embarcações já não atendem às nossas necessidades”, ele queixou-se.
Wulkai lamentou a maneira como se negociou a construção da usina: “Negociaram com apenas alguns caciques do Parque, fizeram reuniões sem a participação geral, uma coisa muito ruim. O que está valendo é o dinheiro, por isso, eles fizeram o documento e colocaram alguns líderes de acordo com o projeto”.
Amazonas em Tempo, 23/05/06.
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