"Conservar a fauna é tarefa titânica", diz zoólogo premiado
2006-05-23
O mexicano Gerardo Cevallos (1958) acrescentou, no dia 10 de maio, à sua lista de prêmios o britânico Whithley, dotado de US$ 55,8 mil, por seu trabalho em favor dos roedores chamados cães de pradaria (Cynomys ludovicianus). Este doutor em mastozoologia, e pesquisador do Instituto de Ecologia de Universidade Nacional do México, espera que o prêmio, um dos mais importantes do mundo para os que trabalham em conservação e recuperação de fauna e flora, o ajude a pressionar as autoridades para que declarem reserva natural uma área de 500 mil hectares no Estado de Chihuahua, onde, desde 1994, busca preservar a vida dos cães de pradaria. Embora lute por isso desde 2001 sem êxito, isso não diminui seu ânimo em proteger estes roedores, que ajudam na existência de outras espécies e combatem a desertificação. O Terramérica conversou com Cevallos na Cidade do México.
Terramérica: O que significa o prêmio Whitley para seu trabalho?
Gerardo Cevallos: É um estímulo para mim e meu grupo de trabalho. A conservação da fauna é uma tarefa titânica, enfrentamos problemas sérios e barreiras dentro dos círculos de poder. Esperamos que este prêmio ajude a desmontá-las e que a declaração de parque nacional no município de Janos (onde vivem cerca de 15 mil pessoas de escassos recursos) aconteça antes de dezembro (quando termina o governo do presidente Vicente Fox).
Por que essa declaração é tão importante?
Gerardo Cevallos: Com a reserva, em seis ou oito anos mais, recuperaremos a pastagem da região, a produtividade dos camponeses e teremos bem definidas as áreas de agricultura, pecuária e espaço para os animais. Acreditamos que pode ser um enorme foco turístico e ambiental e um exemplo para o mundo, pois haverá muitas outras espécies junto ao cão de pradaria, que já estão em risco de extinção, como bisontes, raposas e outros.
Que papel tem o cão de pradaria no hábitat e por que estava em perigo?
Cevallos: Na região que trabalhamos, que é a última grande colônia que existe no mundo, há cerca de 600 mil cães; vivem de oito a dez animais por hectare. Sua vantagem é que se alimentam de arbustos desérticos, são muito agressivos e invadem a pastagem até acabar com ela. Os cães mantém o matagal sob controle e isso permite que a pastagem própria da região sobreviva, constituindo uma espécie fundamental, com um impacto desproporcional em seu ambiente. Se é retirado, perde-se todo o ecossistema. Alguns ainda consideram este animal uma praga. Diz-se que compete com o gado e que tem um grande impacto, mas não é verdade. São envenenados aos milhares, e estamos trabalhando contra isso.
Como o senhor e sua equipe trabalham na região?
Cevallos: Em 1987, cheguei a buscar cães de pradaria no Estado de Chihuahua, pois durante mais de 50 anos não houve informações sobre eles. Os encontrei e comecei um trabalho que se formalizou nos anos 90. Trabalhamos com a sociedade civil, com os pecuaristas, camponeses e o governo municipal para a declaração de reserva, e todos concordam que ela deve ser feita. O consenso é produto de um grande processo de conscientização e do pagamento de serviços ambientais em uma região de quatro mil hectares, onde pela década seguinte seus donos receberão dinheiro, a cada ano, para não usar as áreas para pasto nem cultivo. Os recursos provêm de fundações estrangeiras privadas.
As barreiras que enfrentou para proteger o cão de pradaria são sintoma do que ocorre em matéria ambiental em todo o país?
Cevallos: Sim, é parte disso. O meio ambiente é como um doente ao qual as autoridades dão certas coisas e meio que cura, mas que acaba morrendo mais tarde se não recebe um apoio agressivo. Os problemas são maiores do que os esforços feitos para resolvê-los. E isso não pode mudar sem um forte apoio do governo e de outros setores da sociedade. Nisso ainda estamos engatinhando.
(Envolverde, 22/05/06)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=17549&edt=34