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2006-05-19
O mundo consome mais alimentos do que os agricultores produzem, o que leva as reservas internacionais de grãos ao seu nível mais baixo dos últimos 30 anos. O aumento populacional, a escassez de água, a mudança climática e os crescentes custos dos fertilizantes com base em combustível fóssil derivarão em uma calamitosa falta de provisões de cereais num futuro próximo, alertou a União Nacional de Agricultores do Canadá (NFU). Em cinco dos últimos seis anos, a população mundial consumiu muito mais cereais do que produziu.

Diante da dificuldade dos agricultores para aumentar sua produção, os líderes políticos devem enfrentar os “grandes desafios que pairam sobre a capacidade da humanidade para continuar alimentando suas crescentes populações”, disse o presidente da NFU, Stewart Wells. Não restam muitas terras no planeta que possam ser usadas para produzir alimentos, disse, por sua vez, Lester Brown, presidente da organização não-governamental Earth Policy Institute (Instituto de Políticas para a Terra), com sede em Washington. E as que restam são, no geral, de qualidade tão ruim que podem se tornar desérticas se forem exploradas com intensidade, disse Brown à IPS.

Ao contrário da chamada “revolução verde” dos anos 60, quando variedades melhoradas de trigo, arroz, milho e outros cereais impulsionaram a produção mundial de alimentos, agora não parece haver nenhuma carta tecnológica na manga. “A biotecnologia até agora tem feito pouca diferença”, disse Brown. Mesmo quando os largamente prometidos avanços biotecnológicos na criação de sementes resistentes à seca, ao frio e às enfermidades forem obtidas na próxima década, poderão aumentar as colheitas em apenas pouco mais de 5% em todo o mundo, afirmou. “Não existe uma discussão suficiente sobre como se alimentará a população mundial nos próximos 20 anos”, ressaltou.

A fome já é uma dolorosa realidade para mais de 850 milhões de pessoas, 300 milhões delas crianças. O sistema global de alimentação precisa ser corrigido o mais rápido possível, afirmou o diretor de pesquisas da NFU, Darrin Qualman. “Muitos agricultores canadenses e norte-americanos estão abandonando o negócio devido aos preços das colheitas estar no nível mais baixo em cem anos. Aos agricultores dizem que a superprodução é a causa dos baixos preços que são obrigados a aceitar”, disse Qualman. Entretanto, a maioria das corporações agrícolas da América do Norte registrou lucro sem precedentes em 2004.

O pesquisador disse que existe um grande desequilíbrio de poder, já que apenas cinco grandes empresas controlam o mercado mundial de cereais. “O sistema de produção de alimentos está desenhado para gerar renda, e não comida em benefício da população. É um sistema que está feliz em deixar centenas de milhões de pessoas sem comer”, disse Qualman à IPS. A desigualdade e a pobreza estão no centro do problema da fome, segundo vários especialistas, incluindo os da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO).

A disparidade econômica se propaga cada vez mais, permitindo que a fome e a má nutrição se convertam em um problema crônico para os pobres tanto do Sul em desenvolvimento quanto do Norte industrializado, disse Brown. E é muito provável que a situação piore por causa da mudança climática. Apenas na África, cerca de 184 milhões de pessoas poderiam morrer por causa de inundações, fome, secas e conflitos derivados do aquecimento do planeta até o final deste século, segundo um novo informe da organização humanitária Christian Aid, com sede na Grã-Bretanha.

A maioria dos cientistas atribui a mudança climática à ação do homem, especialmente pela geração dos gases causadores do efeito estufa, pela queima de combustíveis fósseis como petróleo, gás e carvão em processos industriais, de transporte e doméstico. Milhões mais em outras partes do mundo também morrerão, e os últimos êxitos em matéria de redução da pobreza poderiam ser revertidos nas próximas décadas, acrescenta o trabalho, intitulado “O clima da pobreza: fatos, temores e esperanças”. Esta “É uma grave crise para a sociedade mundial, e necessitamos de soluções globais”, afirmou Andrew Pendleton, analista de clima e desenvolvimento da Christian Aid.

No documento, o grupo imagina as regiões pobres do planeta usando energia renovável. Outras idéias novas já estão fazendo a diferença em aldeias de 10 países africanos. Com algum dinheiro para comprar sementes melhoradas, fertilizantes, uma parte dos recursos da água protegidos e redes para evitar o ataque de mosquitos que contagiam com a malária, centenas de milhares de pessoas beneficiadas pelo projeto Aldeias do Milênio agora podem produzir alimento suficiente e vender os excedentes. Trata-se de um plano desenvolvido pelo economista Jeffrey Sachs, máximo responsável dos Objetivos de Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas para o Milênio, e outros especialistas do Instituto da Terra, da Universidade de Colúmbia, nos Estados Unidos. Cada projeto de Aldeias do Milênio é liderado pela própria comunidade local usando tecnologias práticas e efetivas a baixo custo.

Os objetivos da ONU incluem reduzir em 50% a proporção de pessoas que sofrem indigência e fome, conseguir a educação primária universal, reduzir em dois terços a mortalidade infantil e em três quartos a materna, promover a igualdade de gênero, reverter a expansão da aids e outras enfermidades e concretizar uma sociedade global para o desenvolvimento entre o Norte e o Sul. Uma reunião de cúpula de 189 líderes realizada em setembro de 2000 se comprometeu a cumprir todos estes objetivos até 2015. Mas sua implementação depende principalmente da assistência ao desenvolvimento pelos países industriais doadores.
(Envolverde, 19/05/06)
http://www.jornaldomeioambiente.com.br/JMA-index_noticias.asp?id=10104

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