Governo quer aumentar a visitação em parques sem prejudicar o meio ambiente
2006-05-17
O Brasil tem 60 parques nacionais, distribuídos em aproximadamente 20 milhões de hectares, o que corresponde à área de vários países europeus juntos. Estão entre as mais de 270 unidades de conservação e áreas protegidas federais. Um patrimônio de dar inveja. O desafio do governo é ampliar o acesso das pessoas a essas áreas, sem provocar riscos e prejuízos para a preservação dos biomas, como Mata Atlântica, Amazônia, Pantanal, que compõe a biodiversidade brasileira.
"Quando a gente cria uma unidade de conservação, há pessoas que acham que estamos engessando o país, guardando uma coisa para que no futuro algumas pessoas possam ter acesso a uma peça de museu. Mas não é nada disso", diz a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Segundo ela, não se está criando "redomas de vidro" em volta dessas unidades, mas condições para que as pessoas tenham acesso a essas áreas hoje e as próximas gerações também. "As unidades de conservação são como partituras de uma linda melodia que é executada agora e ainda será executada no futuro".
O diretor de Ecossistemas do Ibama, Valmir Ortega, explica que a abertura dos parques para o público é fundamental. "É necessário não apenas para tornar sustentáveis economicamente as unidades, mas para que as pessoas possam usufruir de um contato direto com a natureza, estabelecendo um novo vínculo com essas áreas. Há um caráter educativo para jovens e adolescentes", avalia.
Em 2005, os parques nacionais receberam 2 milhões de visitantes. Nos Estados Unidos esse número é significativamente superior: 160 milhões de visitantes. Quênia, Costa Rica e Austrália também estão a frente do Brasil no que se refere à quantidade de turistas atraídos pelos parques. Para mudar esse cenário, o governo desencadeou ações em inúmeras frentes. Cerca de 2 mil servidores foram contratados para atender unidades de conservação e parques nacionais nos últimos anos. Durante seis meses do ano, 1500 novos funcionários trabalham exclusivamente na prevenção e no combate ao fogo, que com freqüência destrói fauna e flora dessas áreas. Em 2006 foi criado um fundo específico para receber recursos das empresas obrigadas pela lei a compensar financeiramente o impacto ambiental provocado por obras executadas por elas.
Esses recursos revertem-se em melhorias para as áreas beneficiadas e, sobretudo, em indenizações para proprietários que possuem terras nas áreas estabelecidas pelo governo como unidade de conservação.
Um estudo também está sendo feito para identificar o impacto econômico que essas unidades geram nas comunidades em que estão inseridas. "Mais da metade dos 2 milhões de turistas que estiveram nos parques nacionais no ano passado visitaram o Parque Nacional do Iguaçu, no Paraná. Estimativas revelam que essa visitação gerou à economia do município de Foz do Iguaçú mais de R$ 600
milhões", revela Ortega.
O diretor do Ibama também anuncia que, em breve, o Parque Nacional da Serra das Confusões, localizado numa das regiões mais pobres do país, no interior do Piauí, deverá ser aberto à visitação pública. "Nossa expectativa é de que com 5 mil vistantes em um ano, o que representa 1/5 do que recebe o Parque Nacional do Itatitaia, seja possível dobrar o Produto Interno Bruto (PIB) do município de Acauã, a porta de entrada do parque. Podemos transformar regiões como essa a partir do meio ambiente, com geração de renda, promoção do desenvolvimento sustentável e com inclusão social".
Na última semana, o governo inovou ao assinar um contrato com representantes da iniciativa privada para a criação de uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). Num jantar realizado em São Paulo com empresários, foi anunciado que ela captará recursos na iniciativa privada para aplicá-los no mercado financeiro, por meio de um fundo. Os rendimentos serão usados no financiamento de projetos ambientais em benefício do Parque Nacional da Serra da Bocaina, localizado entre o Rio de Janeiro e São Paulo. O cantor Chico Buarque, que esteve presente no evento de assinatura do contrato, é padrinho da iniciativa.
O capital inicial da OSCIP será de R$ 1 milhão. Essa é uma experiência piloto que deverá ser ampliada para beneficiar outros parques brasileiros. A OSCIP acompanhará a gestão dos recursos feita pelo Ibama na capacitação de pessoal, qualificação de equipes, melhorias de infraestrutura, e prestará contas aos investidores sobre os projetos executados. "Essa forma de gerenciamento financeiro foi escolhida para garantir ao parque o fluxo contínuo de verbas, ao mesmo tempo em que se preserva o capital da OSCIP", avalia o empresário Heinz Gruber, um dos doadores de recursos.
"A gente nunca se mobiliza apenas para fazer coisas, mas com base em princípios, conceitos e propósitos. Penso que princípios, conceitos e bons propósitos nós encontramos em todos os segmentos da sociedade, em todos os partidos, em todas as instituições públicas e nas privadas também. É isso que me anima", diz Marina Silva sobre a parceria firmada em defesa do Parque Nacional da Bocaina.
Sobre o Parque Nacional da Bocaina
Situado entre São Paulo e Rio de Janeiro, área de maior densidade demográfica da América do Sul, o Parque Nacional da Bocaina possui 104 mil hectares e constitui o maior parque de Mata Atlântica no país. Só de costa, entre Paraty e Angra dos Reis, ele protege 96 km. Seis municípios são incluídos em sua área e outros 14 fazem parte da região de amortecimento. Todas essas características dificultam o manejo e a proteção do parque.
"Há interesse para construções de residências de veraneio, que acabam entrando no parque e promovendo o desmatamento. Há o problema de fazendas que ampliam
suas áreas de pasto para dentro do parque, introduzindo espécies exóticas para engordar o gado. Há extração de madeiras nobres, como canela, aripurana e dezenas de espécies nativas usadas hoje em construções irregulares", conta o diretor do parque, Dalton Novaes, citando alguns obstáculos para a conservação da área.
No parque ainda é possível encontrar o caminho histórico do ouro. No início da colonização brasileira, o ouro era levado de Minas Gerais para o litoral por uma estrada localizada no interior da Bocaina. Nas encostas litorâneas encontram-se inúmeros vestígios do calçamento original do caminho do ouro, com enorme demanda de visitação. A importância histórica é tanta que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) está trabalhando com o
Ibama para registrar e tombar esses trechos.
A estrada que vai do município de Cunha, em São Paulo, para Paraty, no Rio de Janeiro, também é importante elo de ligação entre o Vale do Paraíba, no estado paulista, e a região litorânea. "Também é por meio dela que entra no parque o gado ilegal, que sai a madeira, que entram os caçadores e sai o palmito", denuncia Novaes.
(MMA, 16/05/06)