É preciso mudar a matriz energética do planeta, avalia ambientalista norte-americano
2006-05-16
Presidente do renomado instituto de pesquisa Worldwatch, o ambientalista americano Lester Brown diz que os danos ao meio ambiente custam hoje muito mais à sociedade do que as políticas de preservação da natureza.
Por que o senhor defende que a agressão à natureza é também um péssimo negócio do ponto de vista econômico?
Quando as pessoas desmatam a Amazônia, calculam o quanto ganharão com a terra, mas não o efeito sobre o regime de chuvas na região. As florestas tropicais devolvem à atmosfera dois terços da água que recebem das chuvas. Mas, com o desmatamento, esse número cai para apenas um quarto, o que reduz a umidade do ar e pode levar a secas que prejudicarão a agricultura. É um prejuízo quase incalculável.
As pessoas estão hoje mais conscientes das conseqüências dessa destruição?
Sim. Elas estão preocupadas com a gasolina e com a mudança climática, pois são assuntos que começam a afetar diretamente sua vida. Nos Estados Unidos, por exemplo, devido ao furacão Katrina, estamos testemunhando o primeiro movimento em massa de refugiados provocado por uma mudança climática. Cerca de 350 000 pessoas em Nova Orleans e 150 000 em pequenas cidades daquela região foram embora. Poucas voltarão. É gente que está pagando o financiamento de casas que não existem mais. Isso mostra que temos de mudar urgentemente a matriz energética do planeta.
É possível alterar esse cenário quando temos economias como a da China, que precisam consumir cada vez mais energia para sustentar seu crescimento?
A China é uma prova de que o modelo econômico baseado no consumo de combustíveis fósseis descartáveis não funcionará. O mesmo vale para a Índia, que em 2031 terá uma população ainda maior do que a chinesa. Também não funcionará para os demais países em desenvolvimento, como o Brasil. A boa notícia é que já sabemos como encarar esse desafio.
O que precisa ser feito?
A economia global precisa ser reestruturada. Isso passa pela mudança da matriz energética do planeta. Se continuarmos investindo milhares de dólares na construção de usinas eólicas, por exemplo, o custo de produção dessa energia vai cair ainda mais e, num futuro próximo, até os carros poderão ser movidos pela energia dos ventos. Já dominamos as tecnologias necessárias para isso. O desafio é implementá-las antes de o sistema entrar em colapso.
Existe alguma forma de acelerar esse processo?
Sim, criando novos impostos para provocar uma mudança de atitude. Sei que as empresas se arrepiam só de ouvir falar em mais taxas. Não defendo o aumento da carga tributária, e sim a reestruturação do sistema. É possível diminuir o imposto de renda e taxar a emissão de carbono e o descarte de produtos, entre outras coisas.
Alguns países já estão mais adiantados nessa mudança de mentalidade?
A Suécia tem hoje o programa mais ambicioso. O país está trabalhando para substituir boa parte do imposto de renda por impostos sobre o consumo de energia. Fazendo isso, a Suécia espera ser a primeira economia industrial livre do petróleo em até 25 anos.
E as empresas já despertaram para a onda dos negócios ecologicamente corretos?
Se você ligar hoje para a General Electric, a maior fabricante de turbinas eólicas dos Estados Unidos, e fizer uma encomenda, só a receberá no final de 2008, tamanha a demanda pelo produto. O que começou como uma boa causa ambientalista hoje é também uma boa causa econômica.
(Exame, 12/05/06)
http://portalexame.abril.uol.com.br/revista/exame/edicoes/0867/economia/m0081899.html