Quatrocentas famílias ainda tentam sobreviver da pesca no lago e na região do Delta do Jacuí, calcula Salomão Oliveira, o pescador da Ilha da Pintada com nome bíblico de rei que faz parte da diretoria da Colônia Z5. A família dele, formada por seis pessoas, pesca por mês cerca de 450 quilos de peixe, o que lhes garante uma renda entre dois e três salários mínimos. Os filés, já limpos, são vendidos na porta de casa.
- Agora a gente não tem mais uma ligadura só com o Guaíba. Ao longo dos anos as coisas vêm mudando. Hoje temos que subir o Jacuí e descer a Lagoa dos Patos para pescar. E mesmo assim a sobrevivência está ameaçada. Dos anos 80 pra cá o peixe começou a escassear.
A principal razão da escassez de peixes, segundo Salomão, é a extração de areia. Nos meses de novembro, dezembro e janeiro, os pescadores não podem pescar por causa da desova. Nestes três meses, algumas espécies de peixes como a piava, o grumatã, o pintado, o jundiá e o dourado (que hoje já está praticamente extinto) sobem para botar os ovos nos areais e no cascalho, onde eles têm refúgio. Na piracema, as bombas de sucção dos mineradores não param. Elas sugam tudo em um diâmetro de 60 metros. A desova que passa por este processo não eclode, o processo termina ali.
Além da mineração, o pescador identifica mais quatro motivos para o desaparecimento crescente do pescado. Um deles são as lavouras de arroz irrigado, que “de Porto Alegre até São Jerônimo vamos encontrar de 400 a 500 bombas. Elas puxam e matam os peixes pequenos”, constata Salomão. Outra causa do desaparecimento dos peixes é a pesca predatória. Alguns pescadores ainda usam redes ilegais, com malha de 30 mm, e assim pescam também os filhotinhos.
Tem ainda a poluição, principalmente o lixo jogado no Guaíba. Muitas das espécies, como a traíra e o cará, não estão conseguindo mais se reproduzir. O lixo, como garrafas e sacos plásticos, encosta-se nas margens e destrói o plâncton usado como refúgio das espécies para a desova. Por fim, há o impacto ambiental do mexilhão dourado, espécie invasora trazida para a região nos cascos dos navios.
- Quando a rede chega na cachopa dos mexilhões, ela entranha. Como eles têm uma enzima muita forte e não se desgrudam, a rede arrebenta. As autoridades estão tentando combater a praga com veneno. Só que os peixes também morrem.
Seu Salomão Oliveira, como a maioria dos pescadores, tem dificuldades para sobreviver só da pesca. Para complementar a renda, há quatro anos ele se dedica ao peixe na taquara, prato que oferece em eventos cobrando dez reais por pessoa. Na Semana Santa, a sua banca foi um dos destaques no Largo Glênio Peres pela qualidade dos peixes assados (tainha, enchova e piava) no centro de Porto Alegre. “Eu criei um tempero especial, e também um espeto adaptado”, conta o pescador-cozinheiro todo orgulhoso.
Por
Roberto Villar Belmonte, para a edição de maio do jornal
Extra Classe, do Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul.