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2006-05-12
A família de Salomão Oliveira tenta diariamente sobreviver da pesca no Guaíba, apesar da redução do estoque de peixes. Chamado de rio pela população, o lago é estudado pelo pesquisador Carlos Tucci há três décadas. As belezas da região, irrigada pelo Delta do Jacuí, inspiram as letras e o som de Paulinho Pires. A luta contra o caldo de poluição estruturou o movimento ecológico gaúcho e até hoje mobiliza o ambientalista Flávio Lewgoy. O pescador, o cientista, o músico e o ecologista são unânimes em alertar: as águas que garantem a vida em Porto Alegre precisam de ajuda.

- Seu Salomão, vocês pescam até no feriado de Tiradentes?

- A rede já está no canal de navegação há duas noites. Temos que puxar esta manhã para não prejudicar a qualidade dos peixes – explica o pescador de 66 anos quase feitos. A sexta-feira do dia 21 de abril amanheceu com cara de inverno em Porto Alegre. Ainda era madrugada quando a chuva começou a cair. A força do vento no barco ameaçava causar estragos nos 1.400 metros de rede mergulhados a 20 metros de profundidade, bem na frente da Usina do Gasômetro. Se a malha, ao ser retirada, prendesse em alguma pedra ou “cachopa” de mexilhão dourado, a nova praga do Guaíba, ela seria rasgada. De dentro d’água, mal dava para avistar os prédios da cidade encobertos pela nebulosidade. Poucos carros circulavam nas avenidas centrais.

Por volta das 9h, o Paz no Vale, movido por um pequeno motor de popa, saiu da Ilha da Pintada em direção à bóia que mostra aos navios o lugar exato do canal de navegação. Em poucos minutos, o barco de chapa de ferro de apenas 7,40 metros chegou ao local de maior profundidade escolhido pelos pescadores. Dois jovens foram escalados para o trabalho na chuva, Douglas, de 21 anos, um dos seis filhos do seu Salomão, e um adolescente de 17 anos amigo da família. Antes de conferir os peixes, eles lançaram no fundo do lago mais 800 metros de rede de nylon, com malha de 75 mm e altura de 3,5 metros. Ela é formada por pedaços de cem metros, atados um ao outro. Para manter a rede submersa, são usadas pedras e uma espécie de âncora feita de ferro de construção, chamada por eles de fatecha. Pequenas bóias são colocadas na parte de cima para manter a rede em pé.

Salomão de Souza Oliveira nasceu na Ilha da Pintada em julho de 1940, dez meses antes da grande enchente que inundou Porto Alegre fazendo com que os moradores das ilhas fossem levados para Guaíba. Ele aprendeu a pescar com o avô e com o pai, e agora repassa os conhecimentos da família ao neto Vinicius, de 8 anos, que o acompanha faceiro e com ar de aventura nas andanças de barco até mesmo nos dias de chuva. Salomão mora com a família em duas casas de madeira construídas próximas da água, bem pertinho do local onde o rio Jacuí, quase sem poluição, encontra o Guaíba ajudando a diluir o caldo de poluentes químicos e orgânicos do lago que abastece a capital gaúcha. Do atracadouro do pescador, dá para ver os prédios do Centro, o Cais do Porto e a Usina do Gasômetro.

O vento impediu o fim do trabalho matinal dos jovens pescadores no feriado de Tiradentes. Após retirar alguns peixes da água eles desistiram para não danificar a rede. Voltaram no dia seguinte, com céu azul, e puxaram 30 quilos de pescado, uma colheita gorda para os padrões do Guaíba. Entre os troféus, uma piava de quase quatro quilos, pescada bem na frente do centro de Porto Alegre. A maioria dos porto-alegrenses talvez não saiba, mas tem muita gente tentando sobreviver da pesca. Ainda existe vida no lago. Alguém arriscaria dizer até quando?

Refúgio de espécies
Quando os açorianos começaram a ocupar as ilhas do Delta do Jacuí, em 1752, índios guaranis já pescavam na região há pelo menos 140 anos. O acesso rodoviário intensificou nos anos 1970 a construção de habitações populares e de residências luxuosas de fim-de-semana. Estima-se atualmente uma população de 14 mil pessoas. De acordo com a Fundação Zoobotânica, 58 espécies de peixes (de 78 conhecidas) foram recentemente coletadas. Nas quase três dezenas de ilhas tentam sobreviver espécies ameaçadas de extinção como o gato-do-mato-grande, a lontra e o jacaré-do-papo-amarelo, além de outras 17 espécies de répteis, 24 de anfíbios e 193 de aves.

Lago na razão, rio no coração
O Guaíba é um lago de 50 quilômetros de comprimento e até 14 quilômetros de largura, localizado no lado oeste de Porto Alegre, entre a Lagoa dos Patos e o Delta do Jacuí. A enorme caixa d’água da capital gaúcha é abastecida pelas águas do Jacuí, Caí, Sinos e Gravataí. Qual a dinâmica hidrológica destes quatro rios? Para responder a esta pergunta, Carlos Eduardo Morelli Tucci, 58 anos, pesquisador do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Ufrgs, escreveu uma tese de doutorado em 1978.

Em seus estudos, ele descobriu que as águas do lago, além de descerem para o sul na maior parte do ano, também sobem em direção a Novo Hamburgo, principalmente no verão. Este fenômeno, chamado pelos especialistas de seiche, ocorre quando as estiagens reduzem a descarga dos quatro rios do sistema Delta do Jacuí. “Se não fosse a oxigenação do Guaíba, o Sinos, um dos rios mais poluídos da região, já estaria morto”, garante o Engenheiro Civil Carlos Tucci, com mestrado e doutorado na área de Recursos Hídricos.

O seiche, uma espécie de maré, é causado pelos ventos em contato com a enorme área da Lagoa dos Patos, com 200 quilômetros de extensão e uma distância de até 60 quilômetros entre uma margem e outra, e também com a grande superfície hídrica do Guaíba, que tem um volume de água de pelo menos 2 mil km3, o equivalente a 2 milhões de hectômetros, de acordo com cálculos aproximados feitos por Carlos Tucci.

O principal problema a enfrentar é a falta de tratamento de esgotos. Os pesquisadores, segundo o professor Tucci, já conhecem bastante sobre o funcionamento hidrográfico do Guaíba, apesar da falta de melhores medidas em alguns pontos e a necessidade de mais conhecimento sobre o impacto humano.

- Não sabemos ainda o tamanho da carga de pesticidas usados pela agricultura, e nem os riscos da petroquímica. Quais os produtos químicos que estão sendo depositados no fundo do lago? Conhecer e diminuir os impactos ambientais é o que falta.

Para quem ainda duvida que o Guaíba é um lago, o Doutor das águas tem dois argumentos. No rio há predominância longitudinal do fluxo da água. No lago que banha Porto Alegre existem fluxos transversais e longitudinais. Além disso, ele tem uma grande superfície, pois a largura varia de um quilômetro, na Ponta da Cadeia, na altura da Usina do Gasômetro, até 14 quilômetros. Se dependesse apenas da hidrologia, o nome do estádio do Internacional deveria ser Gigante da Beira Lago. Estranho, né?
Por Roberto Villar Belmonte, para a edição de maio do jornal Extra Classe, do Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul.

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