PF investiga contrabando de mineral radioativo no Amapá
2006-05-10
Às margens de um afluente do Rio Araguari, a duas horas de barco da Serra do Navio, no Amapá, se esconde a mais recente descoberta geológica do país: a primeira reserva de torionita, um minério com alto índice de tório – elemento químico radioativo usado na fabricação de bombas. Ela foi localizada no Parque Nacional de Tumucumaque. Apesar da boa notícia, não há motivos para comemorações. Embora a exploração de minério radioativo seja monopólio da União, a reserva está sendo dilapidada e comercializada clandestinamente por garimpeiros, comerciantes e doleiros da região.
A ação dos contrabandistas, que fere o princípio da soberania nacional, estabelecido pela Constituição de 1988, está sendo investigada pela Polícia Federal (PF) do Amapá, pelo Serviço de Inteligência do Exército (Ciex) e pela Agência Brasileira de Informações (Abin). A Justiça Federal decretou o sigilo nas investigações, acatando o pedido do delegado da PF que preside o inquérito, Luís Carlos Nóbrega Nelson. Temendo um eventual risco de contaminação, técnicos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) se deslocaram para o Amapá onde tentam conscientizar os moradores da região a ficarem longe do minério radioativo. Além de apresentar uma concentração de 75% de tório, a torianita é composta ainda por 7,8% de urânio, outra substância química usada na indústria nuclear.
A rota do contrabando do material radioativo ainda é desconhecida pela Polícia Federal. Por ser proibido, o comércio da torionita, que oficialmente até hoje não integra a lista dos metais encontrados em solo brasileiro, é praticamente inexistente no país. Isso vem dificultando o trabalho da polícia em localizar os eventuais compradores do material radioativo.
Mas comerciantes e moradores da região apontaram ao Estado de Minas duas pistas que indicam o destino final do minério: a torianita estaria sendo vendida a empresas siderúrgicas do país , misturada à tantalita (minério usado como liga nas indústrias de ponta) ou contrabandeada, por meio de avião e embarcações clandestinas, para a China e Guiana Francesa, território governado pela França na divisa com o Amapá. Essa hipótese é respaldada pelo fato de França e Índia serem os únicos países a possuir tecnologia para o enriquecimento do tório, de onde é extraído o chumbo 206, substância química usada na blindagem de bombas de nêutron.
A tecnologia de enriquecimento do tório ainda é desconhecida no Brasil. A Indústria Nuclear Brasileira (INB), estatal que detém o monopólio para a exploração de minérios radioativos, somente possui reatores de enriquecimento do urânio, que é extraído no meio de outros minerais na Reserva de Catité, na Bahia.
(Estado de Minas, 09/05/06)