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2006-05-08
Os grileiros de terras que atuam no Estado do Pará estão mais ousados. No município de Santarém, no oeste paraense, um deles anuncia uma área de 900 mil hectares, garantindo que o imenso latifúndio é terra boa para o plantio de soja e extração de madeira. O preço é uma barbada: R$ 16 milhões. Isso dá menos de R$ 17 por hectare. Um valor inacreditável. “É golpe! Caso de polícia!”, afirma o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no Pará. O órgão sabe o que diz. Nas salas de seus servidores costumam aparecer espertalhões de todo o tipo, sempre interessados em “legalizar” terras públicas ou saber se áreas prestes a ser negociadas poderão receber um “empurrãozinho”.

Em Santarém, há até imobiliária criada para facilitar a vida dos criminosos. A Polícia Federal já fechou duas, mas outras atuam na clandestinidade para esquentar a papelada de supostos proprietários. “Já venderam a Amazônia diversas vezes e continuam vendendo. Isso nunca vai parar”, comenta um agente da PF que colaborou a dois anos para colocar na cadeia servidores públicos, comerciantes e grileiros de terras. Hoje, todos eles, processados na Justiça Federal, vivem correndo atrás de advogados para escapar de eventual condenação.

A facilidade para aplicar o golpe da terra boa e barata está no fato de que nenhum grileiro até hoje recebeu qualquer condenação judicial por vender o que não lhe pertence. A procura por áreas para plantio de soja é tamanha que muitos sojeiros não se importam se a terra é pública. E, se for, é até melhor. Apostam na impunidade. Quando forem descobertos estarão longe e com os bolsos cheios de dinheiro. A floresta estará no chão e as famílias que antes a ocupavam, expulsas por pistoleiros armados.

Ofertas - O negócio, para muitos, é fechado pela Internet. Não há despesas com fretes de avião ou veículos terrestres para vistoriar as terras compradas. Dos Estados do Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Mato Grosso, os corretores da grilagem, diante do computador, fazem a festa. No município paraense de Paragominas, uma área de 40 mil hectares é oferecida por R$ 20 milhões. Tem estrada, campos de aviação e grande área de soja plantada. Outra área, na cidade de Uruará, a 180 quilômetros de Altamira, é uma tentação. O corretor diz que os 60 mil hectares são de “terra roxa”, as melhores da Amazônia. Preço: R$ 19 milhões. A fazenda também dispõe de dois tratores, um caminhão e três casas de alvenaria.

O Instituto de Terras do Pará (Iterpa) conhece muito bem como agem os vigaristas. Eles já estiveram pelo órgão tentando obter informações sobre localização de terras, insinuando que pretendiam legalizá-las para investimento em pecuária e manejo sustentado. Alguns servidores perceberam os indícios de maracutaia e recuaram. Não adiantou. Algumas áreas foram negociadas pelos grileiros com a falsificação de assinaturas de dirigentes do órgão. Os casos estão sendo investigados pela Polícia Federal. Um corretor paulista chegou a ser preso, mas responde ao processo em liberdade.

O assalto às terras paraenses por criminosos não é recente. Na internet, sete corretoras virtuais oferecem aos incautos mais de 15 milhões de hectares em vários Estados amazônicos. O Pará, por estar mais próximo dos grandes eixos rodoviários do país, é o chamariz dos grileiros. Se todas as terras que essas corretoras oferecem forem vendidas, o faturamento alcançará R$ 1 bilhão.

Aberração - Ninguém movimenta essa engrenagem criminosa sozinho. É preciso contar com parceiros ativos e fiéis. Servidores de órgãos fundiários e empregados de cartórios são os maiores alvos. Para falsificar uma escritura de posse ou domínio da terra essa “ajuda” é importante. A ausência de um registro único de terras nos órgãos fundiários é um dos trunfos dos falsários. Também não há o menor entrosamento entre Iterpa, Incra e Instituto de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para cruzamento de informações. Cada um faz o que bem entende.

O caso mais notório de grilagem é o da Gleba Pacoval, em Santarém, de propriedade da União, que não faz o menor esforço para preservá-la do crime organizado que atua no mercado de terras. A área, de 260 mil hectares, é disputada por várias quadrilhas de madeireiros e grileiros, todas de fora do Pará. Lá, além de desmatamento ilegal, foi descoberto trabalho escravo.

Um grileiro preso em 2003, Juscelino Lima, acusado de escravizar 70 trabalhadores, confessou que trabalhava para uma máfia de grandes grileiros da região. Foi jurado de morte e acabou executado a tiros em janeiro de 2004. Os mandantes do crime soltaram fogos em Santarém, comemorando a morte do alcaguete.
(O Liberal-PA, 05/05/06)

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