"Biojóia" vai ganhar certificação para evitar extinção de espécies
2006-05-08
As sementes da Amazônia são um dos grandes sucessos da produção artesanal brasileira. Nos últimos anos, elas deixaram a floresta para compor colares, brincos, pulseiras, anéis, entre outras peças, que são vendidas em todo o País e no exterior. A beleza delas justifica o sucesso e o crescimento da demanda, a ponto de gerar preocupação com a extinção de espécies da floresta amazônica. Não se sabe ao certo, por exemplo, quantas toneladas por ano de sementes são coletadas. A falta de dados confiáveis sobre esse insumo tão especial e a inexistência de marco regulatório para o uso econômico das matérias-primas no País apontam a necessidade da criação de políticas públicas e processo de certificação, a fim de garantir a sustentabilidade do artesanato feito de sementes e dos produtos florestais não-madeireiros.
A preocupação com as comunidades coletoras, com o manejo da floresta e a correta comercialização dos produtos levaram o Sebrae Nacional a criar o Grupo de Trabalho de Certificação de Sementes e Produtos Artesanais, em março deste ano. "Se não houver manejo adequado em ambiente controlado, há risco de extinção de algumas espécies. A capacidade regenerativa da floresta pode estar comprometida", afirma Jorge Rincón, coordenador do grupo de trabalho que até o momento é composto por representantes do Sebrae no Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, da Embrapa, da Universidade Federal Rural do Amazonas (UFRA), do Museu Goeldi, do Museu S.J. Liberto, da Secretaria Executiva de Trabalho e Promoção Social do Pará (Seteps), IBGE e do Centro de Educação Tecnológico e de Negócios de Rondônia (Cetene).
Os integrantes do grupo de trabalho já se reuniram duas vezes, no Rio de Janeiro, em novembro de 2005, e em Belém, em março deste ano. O Sebrae está articulando mais parceiros, que atuam na frente ambiental, para participar da iniciativa. A intenção é que as conclusões do grupo possam indicar caminhos para a elaboração e implementação de políticas públicas e certificação de sementes e produtos florestais não-madeireiros em todo o País.
Só para se ter uma idéia, atualmente o Museu Goeldi estuda 486 qualidades de sementes, mas a região amazônica deve ter cerca de 170 mil variedades de plantas. A semente de jarina, conhecida como o marfim-vegetal é a preferida do mercado, demora quatro anos para germinar. Há três anos, uma garrafa de um litro cheia de jarina custava R$ 1 nas ruas de Belém. Hoje, uma semente está sendo vendida a R$ 20. "O problema das sementes é que elas saem da Amazônia com commodity e voltam com alto valor agregado como remédio, cosmético ou outro produto", explica Rincón.
Alguns grupos de artesãos da região recebem capacitação sobre tratamento de imunização de sementes, baseado em pesquisa da Universidade de Brasília (UnB). Até junho, o grupo de trabalho deve editar manuais de coleta, tratamento de sementes para artesanato. Eles serão distribuídos para artesãos e coletores. Dados sobre o volume de sementes, que estão saindo da Amazônia, também já deverão estar levantados até junho, segundo previsão de Rincón.
Exemplo acreano
A proposta de criação do grupo de trabalho surgiu na reunião de coordenadores de artesanato do Sistema Sebrae, ocorrida em novembro do ano passado, no Rio de Janeiro. A sugestão veio do coordenador do programa de artesanato da unidade do Sebrae no Acre, Aldemar Maciel. Esse Estado é o único da Federação que possui norma, que regulamenta o uso econômico dos produtos florestais não-madeireiros, entre eles, as sementes. "O Sebrae está aproximando os coletores dos artesãos, fazendo uma espécie de contratualização entre eles", esclarece Aldemar. O Acre está sendo referência para o grupo de trabalho.
A portaria interinstitucional 001/2004 baixada em agosto de 2004, foi editada pelo Ibama/AC e Instituto do Meio Ambiente do Acre (Imac), órgão estadual ambiental. O instrumento estabelece o prazo de três anos para que os coletores, que trabalham com fins econômicos, adotem o plano de manejo simplificado, se cadastrem no Ibama/AC e Imac e se adequem às regras do transporte do material.
"O objetivo da portaria não é restringir a coleta, mas regulamentá-la, visando à adoção de boas práticas para garantir a sustentabilidade da matéria-prima", explica Aldemar. O fato das sementes amazônicas chegarem ao mercado “in natura”, sem valor agregado, não gera renda para população ribeirinha, geralmente responsável pela coleta, segundo ele.
"Essas matérias-primas são de floresta nativa. A coleta incorreta não deixa sementes no solo para a regeneração do bioma, causando prejuízo ambiental e não contribuindo para o desenvolvimento sustentável da região", ressalta Aldemar.
O técnico alerta que se medidas corretivas não forem tomadas, o desequilíbrio na oferta de matéria-prima da região amazônica para os artesãos vai invibializar a consolidação de muitos negócios, com foco na sustentabilidade. Segundo estimativas do Sebrae no Acre, cerca de 70 toneladas por ano de sementes saem do Estado para o mercado interno e externo. Aproximadamente 4 mil famílias trabalham na coleta de jarina, açaí e paxiubão. A maior ocorrência da jarina é no Acre, responsável por 90% das sementes que estão nas biojóias, que encantam consumidores do Brasil e do mundo.
As unidades do Sebrae no Acre e no Pará montaram Grupos de Trabalho de Certificação de Sementes e Produtos Florestais Não-Madeireiros, que estão atuando nos estados. A Rede de Sementes da Amazônia integra o Grupo de Trabalho do Pará. Ela foi criada em setembro de 2001 e congrega várias instituições e órgãos estaduais ambientais da região.
O Estado do Acre será o primeiro a certificar a produção artesanal, em novembro próximo. A Associação Certificação Socioparticipativa da Amazônia (ACS), criada em 2004, será responsável pelos certificados, que comprovarão o processo produtivo sustentável de artesanato e dos produtos florestais não-madeireiros no Acre. A associação é formada por profissionais multidisciplinares de vários órgãos e instituições governamentais, universidades e organizações não-governamentais, das áreas ambiental e trabalhista.
(Agência Sebrae, 06/05/06)