Documentário mostra efeitos da soja na Amazônia
2006-05-08
O acolchoado verde que cobre hoje cerca de 50% do território brasileiro
está se tornando amarelo. A floresta amazônica, uma das regiões mais
ricas e de maior biodiversidade do planeta, é tomada pelas extensas
plantações de soja em velocidade astronômica. Entre 2003 e 2004, a
Amazônia perdeu 26.130 km2 de floresta – segundo maior índice de toda
a história. Como conseqüência do avanço da fronteira agrícola, o
desmatamento cresce, a fauna e flora ficam comprometidas e a população
que vive dos recursos naturais da região são afetadas. O documentário
“Soja: Em nome do progre$$o” produzido pelo Greenpeace e lançado dia
4 em São Paulo, mostra como isso acontece.
“Estamos lutando para que não se repitam os erros já cometidos na Mata
Atlântica. Não faz sentido destruir a Amazônia para plantar grãos que
servirão de comida para os porcos da Europa ou, futuramente,
cana-de-açúcar para a produção de combustível, usado nos Estados
Unidos e Japão”, afirmou o diretor executivo do Greenpeace no Brasil,
Frank Guggenheim. Ele esteve presente na estréia do documentário.
Os números apresentados no vídeo indignaram a platéia. A área de
floresta desmatada é um exemplo. Em cerca de 30 anos, a Amazônia
perdeu área equivalente ao tamanho da França. E se as coisas
continuarem caminhando como estão, pesquisadores estimam que 40% do
que restou deve desaparecer até 2050. Ainda não é tudo. Estudos mostram
que a produção global de soja está subindo. Em 2003, foram 186
milhões de toneladas. Em 2020, a estimativa é que esse número suba para
300 milhões. Sendo o Brasil um dos principais exportadores do grão,
subentende-se que mais um pedacinho da floresta irá embora.
Mas quem está por trás de tudo isso? São as multinacionais
norte-americanas, esclarece o documentário. “Elas fornecem aos
produtores crédito fácil e mercado garantido, dando incentivos e
recursos para que eles comprem e desmatem as áreas da Amazônia”, diz o
pesquisador do Greenpeace Nilo D´Ávila, um dos produtores do vídeo.
Com tantos subsídios, os “sojeiros” vêm do sul do país e do Mato
Grosso, se instalam na Amazônia, compram terras a preços irrisórios e
ainda expulsam a população do campo para as cidades. “A vinda dos
produtores contribui para a grilagem de terras. As principais vítimas
da ocupação ilegal são os índios e pequenos posseiros.”
Conseqüências
Narrado pelo ator Marcos Palmeiras, o documentário conta com
depoimentos de moradores de Santarém (oeste do Pará), região onde a
soja já teve graves impactos socioambientais. “Em breve, vai faltar
comida e saneamento básico. É triste pensar que o governo investiu em
agricultura de exportação e quase nada na familiar”, lamenta Maria
Luciene Sardinha, delegada da Associação de Mulheres de Santarém. Os
resultados desse disparate são cada vez mais famílias migrando para as
cidades e enchendo as favelas.
A opção por relatar o caso de Santarém, segundo D’ Ávila, foi
proposital. “É o local onde a Cargill construiu, sem nem mesmo
realizar um Estudo de Impacto Ambiental (Eia-Rima), seu porto
graneleiro. Além disso, a região é peça-chave para a conservação e já
tinha vários movimentos organizados que poderiam nos ajudar”, ressalta.
A Cargill, juntamente com as multinacionais norte-americanas Bunge e
ADM, são as responsáveis por financiar a indústria da soja na floresta
amazônica.
O procurador-chefe do Ministério Público Federal de Belém, Felício
Pontes, conta que, normalmente, as pessoas vendem suas terras aos
produtores agrícolas sob a ameaça de pistoleiros. “A situação é ainda
muito mais grave do que a provocada pela indústria da madeira, porque
o estado está totalmente ausente. Existem mais fiscais do Ibama em
toda Santa Catarina do que na Amazônia.”
Bastidores
Um dos objetivos do Greenpeace com o documentário é conscientizar as
pessoas de fora da Amazônia sobre o que está acontecendo com a
floresta. “O resto do Brasil não conhece a Amazônia. Ela ainda é vista
como algo que tem de ser tutelado de fora, goela abaixo. É por isso
que gerações e gerações de pessoas que vivem lá e têm conhecimento
tradicional são ignoradas”, reclama Pontes.
Resultado do trabalho de três anos de estudos, o vídeo não teve uma
idéia inicial. “Percebemos que tínhamos uma série de imagens que
gravamos para utilizar nas pesquisas. Aí compreendemos que havia uma
história para ser contada. Foi primeiro a câmera na mão e depois a
idéia na cabeça”, brinca D’ Ávila. Outras duas saídas a campo foram
necessárias para captar depoimentos dos moradores da região. “Tivemos
um pouco de dificuldade, porque muitos não queriam ser filmados.
Principalmente aqueles que entregaram suas terras e foram morar na
cidade. Acho que por vergonha de admitir que erraram.” Ele se refere
às pessoas que venderam suas propriedades e, na cidade, não tiveram
condições de se sustentar, devido à ausência habilidades urbanas e à
falta de escolaridade.
Quem tiver interesse em adquirir o vídeo, que teve tiragem de 3 mil
exemplares, pode solicitar uma cópia ao Greenpeace de São Paulo (11
3035 1193) e falar com Vera Antunes. A intenção dos produtores é,
futuramente, disponibilizar na internet.
(Aline Ribeiro, O Eco, 06/05/06)
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