Petrobras desperta cobiça do Terceiro Setor
2006-05-04
Atenção organizações de terceiro setor sedentas por recursos – e não são
poucos – para financiar projetos de meio ambiente: a Petrobras acaba de
lançar mais um edital do Programa Petrobras Ambiental e colocou à
disposição uma bolada de R$ 48 milhões a serem gastos em até dois anos com
iniciativas que tratem de questões relativas à água.
É a segunda vez que a empresa oferece recursos desse porte. Em 2004, foram
R$ 40 milhões que contemplaram 30 projetos espalhados pelo país, entre 1681
inscritos. Nessa nova leva de recursos, a Petrobras decidiu repetir o tema
“água”, cuja conservação é importante, sobretudo, para seus próprios
negócios.
“É uma grande oportunidade”, diz Fátima Sonoda, gerente executiva da
Fundação Ecotrópica, que pretende se candidatar ao patrocínio com um
projeto de conservação no Pantanal. A oferta é tentadora. Em alguns casos,
o teto que cada projeto pode solicitar chega a ser o dobro do que é
proposto nos demais editais. O máximo, no caso da empresa, são R$ 3,6
milhões. “Pelo volume de recursos investidos, é muito dinheiro para pouco
tempo, o que requer uma certa base e logística da instituição para
absorvê-lo e aplicá-lo da melhor forma possível”, considera Laury Cullen
Jr., do Instituto de Pesquisas Ecológicas (Ipê). Ele teve seu projeto entre
os 30 aprovados no primeiro edital, em 2004, e acredita que o ideal seria
que essa mesma quantia pudesse ser trabalhada em prazos maiores, de quatro
ou cinco anos, para dar um tempo de consolidação dos projetos.
Mas, isso nem de longe tira a importância do investimento. “É um recurso
excepcional, com o qual as instituições podem ousar e ampliar seu raio de
ação”, diz Cullen. No caso do Ipê, eles conseguiram plantar 750 hectares de
floresta e conectar o Parque Nacional do Morro do Diabo à Estação Ecológica
Mico Leão Preto, no Pontal do Paranapanema (SP), seguindo o curso de um rio
com margens muito degradadas. “Esse é um recurso que permite às
instituições fazerem coisas em escala real, não mais experimental”, diz.
Ele só lamenta que não possa reinscrever esse projeto, para que ele
concorra à continuidade dos investimentos – queixa compartilhada, aliás,
com outras instituições que tiveram projetos aprovados em 2004, como o
“Reflorestágua: reflorestando e protegendo as águas do Tapacurá”, da
Sociedade Nordestina de Ecologia (SNE). O jeito vai ser escrever um outro
projeto, baseado no que já foi desenvolvido nos dois anos anteriores.
Maíra Braga, gerente executiva do projeto, acredita que conseguiu passar
pela peneira da Petrobras porque propunha uma abordagem sistêmica em
relação à questão da água, sem falar no apelo de querer cuidar de um rio
que abastece cerca de 1,5 milhões de pessoas na região metropolitana do
Recife e hoje sofre com a poluição. “Oferecemos uma visão integrada entre
água, floresta e mobilização de diversas camadas da sociedade, com o
objetivo ainda de influenciar políticas públicas e fazer com que a
comunidade dê andamento as propostas sem depender tanto do trabalho da
nossa ong”, explica Maíra.
Linha sócio-ambiental
Ao que tudo indica, a Petrobras deve querer aprovar os trabalhos mais
consistentes nessa linha sócio-ambiental. Não por acaso, figuram entre os
mais importantes critérios de seleção os quesitos participação da
comunidade e impactos sociais dos projetos, além de, é claro, estarem
preferencialmente localizados nas áreas de influência da empresa. Segundo o
edital, os projetos precisam estar voltados à promoção e à conscientização
do uso racional dos recursos hídricos, manutenção e recuperação de
paisagens visando o equilíbrio dos ciclos hidrológicos ou à conservação de
ambientes marinhos ameaçados.
Apesar de terem sido relatados alguns problemas em relação ao repasse dos
investimentos aos projetos, notadamente aos nordestinos, e dificuldades de
contato entre a Petrobras e as instituições, de uma maneira geral o
programa de patrocínio ambiental da empresa tem mais pontos positivos do
que negativos. “Enquanto outros editais são mais restritivos em relação ao
uso detalhado dos recursos, a Petrobras permite que façamos quase tudo,
cobrindo inclusive gastos fundamentais para o funcionamento da instituição
que executa o projeto”, conta Maíra Braga.
Além disso, as instituições acham mais fácil trabalhar quando os recursos
não são atrelados diretamente ao governo. “O repasse do dinheiro em editais
com recursos do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) é sempre mais
complicado, porque depende do orçamento da União. E, não raro, o envio de
recursos corre o risco de ser interrompido”, pondera Fátima Sonoda, da
Ecotrópica.
Outros patrocínios
Ninguém duvida da importância desse montante para organizações da sociedade
civil, mesmo havendo outras fontes de patrocínios ambientais que
disponibilizam quantias semelhantes. No entanto, por se tratar da maior
empresa brasileira e uma das que mais tem passivos ambientais, há quem
ainda ache que o investimento é proporcionalmente insuficiente perto dos
impactos que a empresa provoca no ambiente.
Só a Fundação O Boticário de Proteção à Natureza oferece um programa de
financiamento com cifras em torno de R$ 2 milhões, que já beneficiou mais
de mil projetos, em 16 anos. É, portanto, a instituição mais regular e
consistente de apoio a iniciativas de terceiros voltadas à conservação no
Brasil. Isso sem falar nas demais investidas próprias, como formação de
pessoas e incentivos à criação de unidades de conservação – trabalhos
custeados, em boa parte, com 1% do faturamento da empresa O Boticário.
Além de patrocínios ambientais de outras organizações como WWF, Conservação
Internacional, SOS Mata Atlântica, TNC, Funbio e alguns bancos, um dos
editais mais conhecidos e esperados pelas ongs brasileiras é o PDA
(Projetos Demonstrativos), uma parceria entre o Ministério do Meio Ambiente
(MMA) com o KFW (Banco Alemão de Crédito para a Reconstrução). Ao longo de
10 anos, o PDA contemplou aproximadamente 200 projetos e, desde 2004,
iniciou uma fase nova de investimentos com três frentes: Mata Atlântica,
Amazônia e consolidação de projetos apoiados no passado. Para o PDA Mata
Atlântica, foram oferecidos R$ 40 milhões de reais, dos quais ainda
precisam ser gastos R$ 7,5 milhões, em mais uma seleção que acontecerá em
meados deste ano. O Padeq (Projetos alternativos ao desmatamento e à
queimada) disponibilizou R$ 15 milhões de reais e o PDA Consolidação, a
mesma quantia.
Atualmente os PDAs atendem a 146 projetos, por dois ou três anos, com
recursos de, no máximo, R$ 500 mil para cada. “Nós atendemos iniciativas de
pequeno e médio porte. E a Petrobras contempla outro tipo de demanda, em
quantidade menor, e mais dinheiro”, explica Maurício Muniz Barbosa,
analista ambiental do MMA.
Outro diferencial é que, em vez de concentrar os recursos em um tema, o PDA
apóia estudos relacionados à criação de unidades de conservação, plano de
manejo, ecoturismo, estabelecimento de micro corredores ecológicos,
recuperação florestal, trabalhos alternativos ao uso do fogo, implantação
de sistemas agroflorestais, beneficiamento de produtos não madeireiros,
etc.
Depois dessa segunda chamada para a última fase do PDA Mata Atlântica, não
há ainda data prevista para a elaboração de novos editais. Então, quem não
quiser perder tempo e aproveitar essa oportunidade da Petrobras tem até o
dia 7 de junho para se inscrever gratuitamente pelo site da empresa,
preenchendo fichas e enviando os documentos solicitados. O resultado da
seleção sai no final do mês de setembro.
(Andreia Fanzeres, O Eco,
29/04/06)
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