Aprovada por 8 a 7 Resolução regulamentando a Capina Química no RS
2006-05-03
Para quem acompanhou as discussões que redundaram na pioneira Lei dos
Agrotóxicos do RS, nas décadas de 80/90, ocorreu na sexta-feira passada (28/4)
um de já vue durante a reunião do Conselho Estadual do Meio Ambiente do RS.
Estiveram presentes o ex-deputado e presidente da Assembléia Legislativa, hoje
presidente da Fepam, Antenor Ferrari. Também estava lá o professor Flávio
Lewgoy. E ainda um técnico defendendo a aplicação de herbicida que, segundo as
suas palavras, "só atinge as plantas".
A sessão do Consema/RS tinha como único ponto de pauta a aprovação ou não de
uma resolução permitindo o uso da capina química - preocupação basicamente das
Prefeituras Municipais. Mas como foi a primeira que ocorreu depois da posse do
novo secretário estadual do Meio Ambiente, o quarto a assumir durante o Governo
Germano Rigotto, a ocasião serviu também para Cláudio Dilda afirmar que respeita
o Consema como órgão superior do Sistema Estadual do Meio Ambiente e apresentar
a sua equipe.
O ex-deputado Antenor Ferrari, presidindo a Fepam, recordou seus tempos de
Assembléia Legislativa, quando, enquanto presidente da Comissão de Direitos
Humanos e depois como presidente da Casa, abriu as reuniões das Comissões
Permanentes à participação de mais de 70 entidades da sociedade civil. Lembrou
e fez referência ao professor Flávio Lewgoy como um grande lutador e
companheiro na confecção da Lei dos Agrotóxicos e ratificou a sua forma de "ser
político", sempre de mente aberta e disposta a aceitar sugestões sobre os temas
da sua área de atuação. Afirmou ainda haver completa coerência entre o
histórico de sua vida política e a participação no Conselho, que sintetiza a
possibilidade da sociedade organizada também participar das deliberações.
De acordo com Dilda, o Conselho terá a representatividade e capacidade que lhe
forem atribuídas dentro do Sistema Nacional do Meio Ambiente.
Retirada ou Saída? - Por paradoxal que seja, foi nesta sessão, depois da saída
de Dilda e Ferrari da sala, defensores de ampla democracia no setor, que os
representantes das ONGs ambientalistas presentes, Mira-Serra, Inga, Movimento
Roessler e da Agapan retiraram-se em protesto pelo fato do próprio Governo do
Estado não reconhecer as indicações feitas pelo movimento ecológico gaúcho para
a sua composição. As entidades indicadas pelo movimento ecológico gaúcho
foram: Agapan, NAT/Brasil, Mira Serra, Upan e Inga. Apenas o NAT não enviou
representante.
O Núcleo Amigos da Terra - NAT/Brasil foi substituído, via decreto, por uma
entidade - o Amigos da Floresta, que também não compareceu nesta sexta-feira e
não participa do movimento ecológico gaúcho. A solução do problema,
favoravelmente à reinclusão do NAT, foi citada na reunião inicialmente pelo
representante da Sociedade de Engenharia, Luiz Antonio Germano da Silva. Em
seguida, a presidenta da Agapan, Edi Xavier Fonseca, reforçou o pedido,
informando que, como não havia sido ainda publicada a nomeação das entidades
que a federação das organizações não-ambientalistas havia indicado, a
participação delas na reunião não poderia ser considerada.
"Tenho a impressão que o Estado não quer a participação das ONGs e isto cria
constrangimentos, pois o Sistema do Meio Ambiente foi concebido com a
participação das ONGs", afirmou o presidente do Consema. Já a presidente da
Agapan declarou que "o Governo está impedindo a participação das ONGs e não
estaremos nas reuniões até sermos nomeados". Lembrou que, no Conama - Conselho
Nacional do Meio Ambiente -, são os coletivos que indicam os representantes e
que a posição do Governo do Estado contra o nosso colegiado é eminentemente
política e não jurídica. A declaração deu a senha para que os representantes de
outras ONGs se retirassem da sala, juntamente com Edi, como forma de protesto.
Capina Química – Mas a saída das ONGs ambientalistas não afetou a continuidade
do encontro. Restaram 15 conselheiros na sala - o total é de 29, sendo que 11
representam o Estado do RS. O fato acabou contribuindo para a aprovação da
Resolução que combatiam - o seu texto foi aprovado por apenas um voto e com
quórum mínimo: 8 votos contra 7.
Famurs, Farsul e CBE - Tramitando há pelo menos dois anos no âmbito das Câmaras
Técnicas, a proposta de regulamentação da capina química no Estado foi defendida
ardorosamente pelos conselheiros representantes da Famurs e do Centro de
Biotecnologia do Estado. Para Valtemir Goldmeier, da Famurs, "o uso de produtos
químicos para dissecar vegetação indesejada em meio urbano é uma das formas de
realizar a operação de manter as cidades limpas", como diz em seu parecer.
Ressalta Goldmeier que "continuará existindo a possibilidade de realização de
serviços manuais e ou mecânicos, mas cabe colocar que os meios públicos estão
controlados, no que tange a gastos de pessoal, à Lei da Responsabilidade
Fiscal".
A pedido da Famurs, um técnico mineiro, João Baptista da Silva, sócio da
empresa Servitech que vende serviços de capina química em áreas urbanas,
apresentou o produto Imazapyr para uso em capina química no RS. O
produto está classificado atualmente no Ministério da Agricultura como
"medianamente tóxico" e também como perigoso ambientalmente. É liberado no
Brasil para uso em lavouras de soja e plantações de seringueiras, eucaliptos,
pinus e cana-de-açúcar. Ele afirmou que o Imazapyr atua especificamente sobre
as plantas, sendo de ação prolongada e tendo efeito em banco de sementes. Um
dado divulgado por ele, no entanto, informa haver "baixa toxicidade para
animais". Avançando na avaliação de sua capacidade técnica/política, certamente,
afirmou João Baptista que a capina química manual é custosa e ineficiente.
O representante da Farsul no Consema, Ivo Lessa Silveira Filho, foi mais
direto, e, referindo-se aos contrários à regulamentação do tema, afirmou: "O
Consema tem que ir ao interior ver o que acontece. Há plantações no meio das
cidades que usam herbicida. E onde está a cerca? Todas as prefeituras usam
herbicidas. Se é para continuar como está, então vai continuar como está".
O representante do Centro de Biotecnologia do RS (na UFRGS), professor Carlos
Termignoni, defendeu que "não há argumentos para proibir-se a capina química".
Técnicos da Fepam - O engenheiro agrônomo Arno Kayser, que representa o corpo
técnico da Fepam na Câmara Técnica de Biodiversidade e Política Florestal,
manifestou ao plenário do Consema a posição contrária dos técnicos à liberação
da capina química - com base no princípio da precaução - e destacou que a
campanha é acirrada para a sua regulamentação porque é uma das áreas em que a
indústria avalia a possibilidade de haver crescimento na comercialização de
seus produtos. "A experiência prática da regulação não mostra não-letalidade -
os riscos nas cidades são maiores." A respeito do Imazapyr, produto defendido
pelo consultor da Famurs, afirmou que "mata todas as plantas". Defendeu a capina
manual, "área em que uma pessoa sem instrução pode conseguir emprego". Além
disto, a liberação provocaria "efeito multiplicador", destacou, "pois as pessoas
vão se achar no direito de utilizar o produto químico também".
Eduardo Osório Stumpf, também da Fepam, informou que, embora o assunto esteja
sendo tratado no âmbito do Consema há quase três anos, não foi apreciado na
Câmara de Controle e Qualidade, o que seria imprescindível. E, na Câmara Técnica
de Biodiversidade, só foi aprovado por um manejo democrático de presenças e
votos, pois três dos quatro pareceres foram contrários.
Agapan - Já o membro do Conselho Superior da Agapan, geneticista Flávio Lewgoy,
que permaneceu no encontro após a saída dos representantes oficiais das ONGs,
definiu a reunião com a seguinte manifestação: "Foi como nos anos 70. Tanto a
pretensa ciência mostrada em um slide, desafiando a incredulidade da
assistência, projetado em datashow por um consultor de empresas(PhD das
alterosas), como as manifestações de representantes da indústria, da Famurs e
do Centro de Biotecnologia da UFRGS, tinham um clima retrógrado, defendendo
abertamente a volta aos velhos tempos, em que se usavam venenos para matar
pragas agrícolas, urbanas e domiciliares".
Votação - Na aprovação ou não da Resolução, Valtemir Goldmeir encaminhou a
votação sem que houvesse nenhuma possibilidade de ter negada a sua aprovação e
arquivada: ou aprovavam, com a execução após a Anvisa liberar algum produto, ou
determinavam o retorno à Câmara Técnica. Após a votação por levantamento do
cartão de voto e declarar simplesmente que a Resolução havia sido aprovada,
Goldmeir, que é consultor na área de meio ambiente da Famurs e da Confederação
Nacional dos Municípios, foi lembrado que não havia declarado o escore da
votação.
Retornando à pauta da capina, divulgou os votos de 8 contra 7, pela aprovação.
Recebendo protestos do representante do corpo técnico da Fepam, Clebes Brum
Pinheiro, de que não havia identificação dos votantes, informou que a questão
estava prejudicada, pois ninguém havia solicitado a identificação antes da
votação. Então Clebes e o representante da Sociedade de Engenharia do RS, Luiz
Antonio Germano da Silva, pediram para que constasse em ata seus votos
favoráveis ao retorno da matéria à Câmara Técnica de Assuntos Jurídicos.
Comentando os resultados da reunião, Flávio Lewgoy afirmou que "se as ONGs
ambientalistas não tivessem se retirado do plenário, em protesto, teríamos
ganho tranqüilamente". Segundo ele, a própria Resolução aprovada prevê recurso
à Anvisa (o que pode demorar), que já se manifestou contra.
O irônico em toda a reunião é que não há produto liberado para uso pela Anvisa
- Agência Nacional de Vigilância Sanitária - em capina química no meio urbano,
ou seja, a Resolução aprovada é inócua. Um dos presentes, o representante do
Centro de Biotecnologia do Estado, Carlos Termignoni, resumiu a decisão: "Se a
Anvisa autorizar, daqui um ou dois anos, já teremos a regulamentação".
Resolução - Quem fez o texto da Resolução desceu a minúcias que protegem, em
tese, o cidadão - se for aplicada tal como prevista. Os proprietários das casas
de uma rua ou os moradores dos edifícios, por exemplo, ficarão com o acesso
interditado, enquanto houver a aplicação e durante o intervalo mínimo (o texto
fala em mínimo e não no tempo máximo, como o indicado na bula do produto). A
Brigada Militar ou o órgão de trânsito local será chamado para o desvio dos
veículos. Os animais também não poderão se aproximar. E a premissa básica para
aplicar-se a Resolução é haver o licenciamento ambiental.
(EcoAgência,
02/05/06)