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2006-05-02
No início dos anos 1970 quando ajudei a fundar o Greenpeace, eu acreditava que a energia nuclear fosse sinônimo de holocausto nuclear, como a maioria de meus compatriotas. Foi essa convicção que inspirou a primeira viagem do Greenpeace até a espetacular costa rochosa para protestar contra o teste de bombas de hidrogênio americanas nas Ilhas Aleutas, no Alasca. Trinta anos depois, minhas opiniões mudaram, e o resto do movimento ambientalista precisa atualizar suas opiniões também. A energia nuclear simplesmente pode ser a fonte de energia capaz de salvar nosso planeta de outro desastre: uma mudança climática catastrófica.

Vejamos: mais de 600 usinas elétricas movidas a carvão nos Estados Unidos produzem 36% das emissões americanas - ou quase 10% - das emissões globais de CO2, o principal gás responsável pelo efeito estufa e a mudança climática. É nuclear a única fonte de energia de larga escala e economicamente capaz de reduzir essas emissões. E esse processo pode ser feito em condições de segurança. Digo isso com reservas, é claro, poucos dias depois que o presidente iraniano Mahmud Ahmadinejad anunciou que seu país havia conseguido enriquecer urânio. "A tecnologia nuclear é apenas para fins pacíficos e nada mais", disse ele. Existe a especulação generalizada de que, mesmo que o processo seja ostensivamente dedicado à produção de eletricidade, ele é, na verdade, uma fachada para a construção de armas nucleares.

Embora que não subestimemos os perigos reais da tecnologia nuclear nas mãos de Estados irresponsáveis, não podemos banir toda tecnologia que seja potencialmente perigosa. Essa era a "mentalidade do tudo ou nada" do auge da guerra fria, quando tudo que fosse nuclear parecia anunciar o fim da humanidade. Em 1979, Jane Fonda e Jack Lemmon produziram um arrepio mundial de medo interpretando seus papéis em A Síndrome da China, uma evocação ficcional do desastre nuclear, em que o derretimento de um reator ameaça a sobrevivência de uma cidade. Menos de duas semanas depois do lançamento do filme, o derretimento de um núcleo do reator na usina nuclear de Three Mile Island, na Pensilvânia, causou calafrios reais em todo o país.

O que ninguém percebeu, na época, foi que Three Mile Island se converteu numa história de sucesso: a estrutura de contenção de concreto da usina fez exatamente o que fora projetada para fazer - impedir que a radiação escapasse para o ambiente. Embora o reator tivesse ficado avariado, não houve mortos nem feridos entre os trabalhadores do local e os moradores da vizinhança. Three Mile Island foi o único acidente grave na história da geração de energia nuclear nos EUA, mas foi suficiente para brecar o desenvolvimento da tecnologia: nenhuma usina nuclear foi encomendada desde então. Hoje existem 103 reatores nucleares fornecendo, silenciosamente, 20% da eletricidade do país. Cerca de 80% das pessoas que vivem num raio de 16 quilômetros dessas usinas, aprovam-nas sem restrições.

Não sou o único, entre os ativistas ambientais experimentados, a mudar de idéia sobre este assunto. O cientista britânico James Lovelock acredita que a energia nuclear é a única maneira de evitar uma catástrofe climática. Stewart Brand, que criou o Whole Earth Catalogue, diz que o movimento ambientalista precisa abraçar a energia nuclear para nos livrar dos combustíveis fósseis. Em outras épocas, opiniões como essas foram recebidas com a excomunhão pelo clero antinuclear: o bispo britânico Hugh Montefiore, fundador e diretor da organização Friends of the Earth, foi obrigado a renunciar da diretoria do grupo depois que escreveu um artigo a favor da energia nuclear num boletim de igreja.

É bem verdade que as energias eólica e solar têm o seu lugar, mas, como são intermitentes e imprevisíveis, elas simplesmente não podem substituir grandes usinas, como as movidas a carvão, nucleares e hidrelétricas. O gás natural, um combustível fóssil, já é muito caro, e seu preço, volátil demais para se arriscar a construir grandes usinas com base nele. Como os recursos hidrelétricos já estão sendo explorados quase no limite, a energia nuclear é, por eliminação, a única substituta viável para o carvão. Simples assim.

Existem os problemas reais - assim como vários mitos - associados à energia nuclear. Mas cada preocupação merece uma consideração cuidadosa: Energia nuclear é cara. Ela é, na verdade, uma das fontes de energia menos caras. Em 2004, o custo médio de produzir energia nuclear nos EUA foi menos de dois centavos de dólar por quilowatt-hora, comparável ao da energia a carvão e hidrelétrica. Avanços na tecnologia reduzirão esse custo no futuro.

As usinas nucleares não são seguras. Embora Three Mile Island tenha sido uma história de sucesso, o acidente em Chernobyl, há 20 anos este mês, não foi. Mas Chernobyl foi um acidente anunciado. Aquele modelo primitivo de reator soviético não tinha vaso de contenção, era um projeto ruim e seus operadores literalmente o explodiram. O Fórum Chernobyl da ONU, organismo formado por diversas agências, reportou no ano passado que 56 mortes poderiam ser atribuídas diretamente ao acidente, maioria delas por radiação ou queimaduras sofridas no combate ao incêndio. Por trágicas que essas mortes tenham sido, elas empalidecem na comparação com as mais de 5 mil mortes de mineiros de carvão que ocorrem anualmente em todo o mundo.

O lixo nuclear é perigoso por milhares de anos. Num prazo de 40 anos, o combustível usado tem menos de um milésimo da radioatividade que tinha quando foi tirado do reator. É incorreto chamá-lo de lixo, porque 95% da energia potencial continua contida no combustível usado depois do primeiro ciclo. Agora que os EUA retiraram a proibição da reciclagem de combustível usado, será possível usar essa energia e reduzir em muito a quantidade de lixo que precisa de tratamento e eliminação. No mês passado, o Japão juntou-se à França, Grã-Bretanha e Rússia no negócio de reciclagem de combustível nuclear. Os EUA não ficarão por muito tempo atrás.

Reatores nucleares são alvos de ataques terroristas. O vaso de contenção de concreto, com 1,80 m de espessura, protege conteúdos tanto de dentro para fora, quanto de fora para dentro. Mesmo que um avião Jumbo se chocasse com o reator e rompesse o invólucro, o reator não explodiria. Há no mundo instalações muito mais vulneráveis, como as usinas de gás natural líquido, por exemplo. O combustível nuclear pode ser desviado para a fabricação de armas nucleares. Este é o problema mais sério e o mais difícil de resolver, vide o caso do Irã. Mas o fato de a tecnologia nuclear poder ser usada para fins malignos não é um argumento para banir seu uso. Nos últimos 20 anos, uma das ferramentas mais simples - o facão - foi usada para matar mais de 1 milhão de pessoas na África, muito mais do que os mortos nos bombardeios nucleares de Hiroshima e Nagasaki juntos.
Patrick Moore é cientista, fundou o Greenpeace e hoje preside a Greenspirit Strategies Ltd.
(Envolverde, 28/04/06)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=16802

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