Siderúrgica anuncia demissão de 150 funcionários após multas
2006-04-28
As sucessivas multas que o Ibama está aplicando nas siderúrgicas
instaladas no Distrito Industrial de Marabá (DIM), por força de supostas
irregularidades na compra de carvão vegetal para a produção de ferro gusa,
está ocasionando fechamento de fornos e redução do quadro de
funcionários em várias empresas. Na quinta (20), a Siderúrgica Ibérica anunciou
que vai paralisar as atividades de um de seus três fornos, reduzir sua
produção em 30% e demitir pelo menos 150 de seus 400 trabalhadores, em
caráter imediato.
A decisão foi tomada pelo superintendente da empresa, Marcos Valadares
Pinto, após o chefe de operações do Ibama, Norberto Neves, ter multado
novamente a Ibérica na quarta (19), em mais R$ 1,5 milhão, na seqüência
da “Operação Aço Preto”. Na quinta (13), a siderúrgica já havia sido
multada em R$ 3,5 milhões, quando foi flagrada na posse de 35 mil metros
cúbicos de carvão vegetal, que estariam armazenados sem comprovação de
origem. A apreensão - maior do país - foi realizada com o apoio da
Polícia Militar e do Batalhão de Policiamento Ambiental.
Em 2004, o Ibama multou a mesma siderúrgica em R$ 1 milhão pelo consumo
de 600 mil metros cúbicos de carvão, que também estariam irregulares.
As empresas do setor estão cortando todas as árvores que restaram em pé
da exploração de mata primária no sul do Estado. As grandes árvores
foram derrubadas e transformadas em carvão, ficando de pé somente as de
pequeno porte como jatobá, cedro, ipê e massaranduba. Somente na região
Norte, o ferro gusa movimenta anualmente US$ 400 milhões nas
siderúrgicas do Maranhão e do Pará.
Segundo Norberto, um hectare produz 100 metros de carvão. Nas ações de
devastação, árvores estariam sendo incendiadas para a entrada das
motosserras. Animais de pequeno porte, como tatus, pacas e cutias, além de
pássaros nos ninhos também são mortos durante a ação.
De acordo com o superintendente da Ibérica, a empresa estaria gastando
cerca de 2 metros cúbicos de carvão para produzir uma tonelada de
ferro. O índice chegaria a 2,10 em períodos chuvosos, como o atual.
Bastante revoltado, Marcos Valadares relatou ao CORREIO DO TOCANTINS que
Norberto teria, de forma arbitrária, atestado que a Ibérica estaria
consumindo 2,19 metros cúbicos por tonelada de ferro produzido, sem que exista
uma regulamentação clara sobre os limites permitidos. A empresa
promete contestar na Justiça as multas e o índice apresentado pelo Ibama.
Fora isso, a idéia do superintendente é trazer para Marabá um instituto
ou uma universidade de renome nacional ou mesmo internacional para
aferir o consumo real da usina. O estudo deverá ser anexado à defesa, de
acordo com o superintendente.
“Vamos contestar esse índice de 2,19. O número não é a nossa
realidade. Com o percentual que nós trabalhamos aqui, o carvão estava
acobertado. Nós temos documentos. Mas como ele (Norberto) está dizendo que
gastamos mais carvão do que o permitido para fazer uma tonelada de gusa,
então ele entendeu que o carvão utilizado aqui é ilegal. Não sei se
existe algum estudioso que possa determinar esse índice, porque isso varia
de empresa para empresa, de forno para forno. Isso não é um número
exato”, afirmou o superintendente da Ibérica.
Instalada em Marabá há quase quatro anos, a siderúrgica – cuja sede
administrativa fica em Belo Horizonte (MG) - é uma empresa de capital
misto, com 60% de investimento espanhol e 40% injetados por um empresário
mineiro, que também é proprietário de uma siderúrgica em Viana (MA). No
ano passado, a Ibérica produziu em Marabá cerca de 224 mil toneladas de
gusa. A planta da empresa foi elaborada para processar 39 mil
toneladas por mês, o que daria 468 mil toneladas anuais. Em dados concretos, a
empresa opera hoje com menos de 50% de sua capacidade instalada.
“Isso ocorre principalmente por causa dessa questão da fiscalização.
Nós estamos achando que estamos sendo perseguidos, porque a nossa
empresa tem capital estrangeiro. Parece que nós estamos sendo alvo de alguma
retaliação, porque a empresa está sendo bastante penalizada pelo Ibama
e pelo Ministério do Trabalho. Não temos como ficar operando para
gerar multa. Falta compreensão do Ibama para lidar com esse problema, que
não é apenas da nossa siderúrgica, mas um problema social do sul do
Pará. Para cada funcionário que perde o emprego aqui, outros dez
trabalhadores são prejudicados, nas carvoarias e no transporte, por exemplo,
pois se trata de cadeia produtiva extensa”, avalia Marcos. Hoje, a
empresa paga R$ 75 por um metro cúbico de carvão.
Segundo o superintendente, a Ibérica presta contas mensalmente de suas
operações com o carvão vegetal para o Ibama, através da chamada
Autorização de Transporte de Produto Florestal (ATPF). Entretanto, dada a
ocorrência de inúmeras fraudes, o Ministério do Meio Ambiente determinou
que as ATPFs sejam substituídas pelo Documento de Origem Florestal
(DOF), um sistema mais moderno, a partir do dia 1ª de junho.
Ao contrário da ATPF, que era em papel e preenchida manualmente, o DOF
é um documento eletrônico. O madeireiro terá de informar ao Ibama, via
internet, o produto que pretende transportar, o volume, a origem e a
rota que irá seguir até a destinação final. O superintendente da Ibérica
negou que a empresa pudesse estar envolvida em algum esquema de
falsificação das autorizações. “Se você fraudar uma ATPF, você é preso. Isso
é crime. Não existe nenhuma possibilidade disso. Quem emite as
autorizações é o Ibama. Tem empresas que fornecem carvão para a gente, com
seus projetos de desmate homologados, dentro do limite de 20%, o que
gera um certo número de ATPFs por mês”, comentou Marcos.
O superintendente informou, ainda, que a Siderúrgica Ibérica já possui
um total de 30 mil hectares de terras - em áreas até então degradadas -
para projetos de reflorestamento, com 6 milhões de eucaliptos
plantados, nas cidades de Goianésia, Abel Figueiredo e Dom Eliseu. A empresa
deseja, segundo ele, conseguir a auto-suficiência em madeira para a
produção de carvão num prazo de cinco a seis anos. A partir de maio, até
março do próximo do ano, a Ibérica espera plantar 2,5 mil a 3 mil
hectares de novas árvores.
“Falei para o Norberto ir conosco na fazenda e ver que estamos
cumprindo a nossa parte. Apesar de todo o esforço que temos feito está havendo
uma perseguição acintosa. Vamos ter que comunicar ao sindicato que não
podermos mais oferecer esses postos de trabalho”, comentou Marcos. No
entendimento dele, somente uma negociação entre o Ibama, as
siderúrgicas, os produtores de carvão, os produtores de madeira e o sindicato dos
trabalhadores da carvoaria, poderá garantir a manutenção dos empregos.
“Teria que haver um acordo – e não uma trégua - para que as empresas
voltem a funcionar. Tenho certeza que, se continuar essa pressão, com
multa em cima de multa, nenhum empresário vai querer trabalhar nessas
condições”, continuou.
O superintendente também considera ser um “absurdo” as normas que
regulam a exploração das chamadas Áreas de Preservação Permanente (APPs),
que impõe um limite de 20% para a derrubada de árvores.”Nenhuma pessoa,
no mundo, consegue ter um bem móvel ou imóvel em que consiga gerar lucro
em cima de apenas 20% do que ele possui. Isso é uma utopia. Lá no
Maranhão, há áreas onde é permitida a exploração em até 35%. No Pará, nós
tínhamos 50% para exploração e 50% para preservação. Agora, com 20%
apenas é inaceitável. Esses 20% é para inglês ver. Ninguém respeita
isso”, afirmou Marcos.
Ao final da visita à empresa, a reportagem do CT conheceu a usina de
sinterização mantida pela Ibérica. Pelo processo de aproveitamento dos
chamados “finos” de minério, de carvão e de calcário, a empresa produz
24 mil toneladas de sínter ao mês. Segundo Marcos, a siderúrgica
estaria utilizando 80% de sínter e 20% de minério, nos fornos, para a
produção de ferro gusa. “Nessa proporção, eu consigo abaixar meu índice de
consumo de carvão de 2,10 para 1,80”. Com esse dado, o superintendente
também espera conseguir rebater as acusações que estão sendo feitas pelo
Ibama. Procurada, a gerência executiva do Ibama não retornou as
ligações para comentar o caso, até o fechamento desta edição.
(Correio
do Tocantins, 27/04/06)