Pesquisa estuda mudanças em animais marinhos próximos às usinas nucleares de Angra I e II
2006-04-26
Usinas nucleares localizadas em regiões costeiras utilizam a água do mar nos sistemas de refrigeração. As usinas nucleares Angra I e II, localizadas no litoral de Angra dos Reis, captam a água da Praia de Itaorna que, após passar pelos sistemas de refrigeração, é lançada na Enseada de Piraquara de Fora. Este lançamento gera três diferentes tipos de impacto na área.
O primeiro impacto é causado pelo aquecimento das águas nas proximidades da área de descarga (já que a água utilizada na refrigeração das usinas sai aquecida), causando aumentos de temperatura que podem chegar a 9° C (nove graus centígrados), no verão.
O segundo é o aumento da turbulência da água, que afeta principalmente as áreas próximas à descarga impedindo a fixação de organismos incrustantes como invertebrados marinhos (cracas, mariscos, etc) e macroalgas.
O terceiro impacto é conseqüência do lançamento do cloro, que é usado para impedir a fixação desses mesmos organismos incrustantes no interior dos circuitos de refrigeração das usinas nucleares, o que dificulta as trocas de calor.
Dentre estes tipos de impacto, a elevada temperatura parece ser o de maior intensidade, por atingir uma área maior. Na realidade não se conhece detalhadamente até que distância da descarga existe impacto sobre os processos de recrutamento (entrada de novos indivíduos nas comunidades) dos organismos bentônicos, como mariscos e cracas, e outros invertebrados marinhos que se desenvolvem sobre substratos duros como costões rochosos.
A pesquisa pretende avaliar os efeitos gerados pela temperatura, turbulência e pelo cloro na biota (isto é, no conjunto de seres vivos) da região, usando as comunidades incrustantes como referência do que estaria ocorrendo com o restante da fauna e flora marinha local. As comunidades incrustantes apresentam diferenças de estrutura e de desenvolvimento quando são submetidas a diferentes condições ambientais, sendo adequadas, portanto, aos estudos de monitoramento. Além disso, pelo fato de crescerem em painéis experimentais (onde se fixam, como fazem em rochas) podem ser facilmente replicadas e manipuladas, oferecendo uma excelente oportunidade para investigar as mudanças na composição de espécies e efeitos de poluição na estrutura da comunidade.
Outra vantagem é que esses painéis podem ser levados ao laboratório, onde são realizadas análises minuciosas sob microscópio estereoscópico, permitindo uma identificação e quantificação mais precisa dos organismos incrustantes, especialmente os de pequeno porte. Também fica facilitada a realização de experimentos “in situ” (no local) para análise dos efeitos dos fatores abióticos (não biológicos, tais como a temperatura da água) sobre os organismos bentônicos e sobre os processos biológicos reguladores da comunidade (como predação e competição).
Para isso, cientistas do Laboratório de Benthos do Departamento de Biologia Marinha do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro realizam, desde julho de 2000, trabalhos de avaliação das comunidades de organismos incrustantes e perfurantes de madeira na região sob influência da água de refrigeração das Usinas Nucleares Angra I e Angra II.
A idéia da presente pesquisa surgiu a partir da Dissertação de Mestrado de Maria Patricia Curbelo Fernandez, aluna do Programa de Pós-graduação em Ecologia do Instituto de Biologia da UFRJ, e da monografia da aluna Mariana de Sá Viana, aluna de graduação do Departamento de Biologia Marinha e atual mestranda do Programa de Pós-graduação em Ecologia do Instituto de Biologia da UFRJ.
Como é feita a pesquisa
Neste projeto, são utilizados painéis artificiais de granito que simulam as condições naturais dos costões rochosos. A proposta engloba o desenvolvimento de comunidades incrustantes em estruturas flutuantes na área do fluxo (a área mais agitada, próxima da descarga das águas de refrigeração da usina), em áreas adjacentes, com distâncias entre 600 e 1400 metros do ponto de descarga, e em áreas controle, onde não existe impacto das usinas.
A unidade amostral utilizada é formada por uma placa de granito de 20 por 20 centímetros, suspensa a uma profundidade de meio metro, através de uma bóia.
O monitoramento das variáveis fisico-químicas da água (temperatura, salinidade e cloro) é realizado mensalmente em todos os pontos. Além disso, o fluxo em cada ponto é medido através de um fluxômetro. Após um período de três meses de permanência na água, os corpos de prova (placas de granito) são levados para análise sob microscópio estereoscópico.
Importância da pesquisa
Em janeiro de 2000 existiam 438 usinas nucleares em operação no mundo, das quais 15 se localizavam em zonas tropicais, sendo que dessas 15, nem todas eram refrigeradas com água do mar. Deste modo, pode-se perceber a enorme lacuna no conhecimento a respeito do impacto nas comunidades marinhas que o lançamento desses efluentes aquecidos causa.
Um outro grande desafio nos estudos relativos a impactos ambientais tem sido determinar a real relação de causa e efeito quando alterações nas comunidades bentônicas ocorrem. Para que alterações devidas às flutuações naturais não sejam indevidamente atribuídas a um determinado fator antrópico (de procedência humana), deve ser estabelecido um bom planejamento amostral incluindo áreas comparáveis entre si, com uma replicação que reflita a variabilidade ambiental.
Esta pesquisa atende a estas condições e oferece a possibilidade de um estudo comparativo válido dos efeitos da temperatura, do fluxo e do cloro nos organismos marinhos próximos às usinas nucleares, permitindo melhor avaliação de impacto ambiental e planejamentos mais precisos, em ambientes tropicais.
Pesquisador(es) Responsável(eis)
Sérgio Henrique Gonçalves da Silva, Helena Passeri Lavrado e Andrea de Oliveira Ribeiro Junqueira (shgsilva@biologia.ufrj.br)
Título do trabalho acadêmico
Efeito do efluente da Usina Nuclear de Angra dos Reis: utilização de comunidades incrustantes como bioindicadores
Instituição(ões)
Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
Fonte(s) Financiadora(s)
CNPq
Sugestões de leitura
Impacto do efluente das Usinas Nucleares Angra I e Angra II sobre a comunidade de organismos perfurantes de madeira, de M. Patrícia Curbelo Fernandez, M. S. Viana, H. P. Lavrado, e S. H. G. Silva, XII Semana Nacional de Oceanografia, Itajai, 2000.
Relatório de Impacto Ambiental/ RIMA- Angra II, Natrontec Estudos e Engenharia de Processos Ltda, 1998.
(Canal Ciência)
http://www.canalciencia.ibict.br/pesquisas/pesquisa.php?ref_pesquisa=141