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2006-04-25
O futuro do bilionário mercado de diamantes brasileiros está sendo definido desde ontem (24), com a visita de uma comissão internacional que vai fiscalizar as principais áreas de extração do território nacional. O Brasil está na mira dos oito representantes do Sistema de Certificação do Processo de Kimberley (SCPK), documento compartilhado por 52 nações para atestar a legalidade, a origem e qualidade de uma das mais valiosas pedras do mundo.

Essa visita pode render ao Brasil uma punição internacional. Relatórios de organizações não-governamentais já expuseram falhas do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) no controle da extração e exportação de diamantes, e acusam o país de usar sua certificação para dar fachada legal a pedras extraídas em áreas clandestinas. O mais recente relatório da Partnership Africa Canada (PAC) — líder da campanha dos diamantes de conflito na África e integrante do SCPK — requer, mais uma vez, que o Brasil seja suspenso do grupo de países que têm autorização para exportar diamantes com certificados de qualidade.

Concluído no final da semana passada, o relatório revela que os brasileiros são os principais protagonistas de um esquema ilegal de contrabando, na tríplice fronteira entre Brasil, Guiana e Venezuela. A base dessa rede clandestina é a capital de Roraima, Boa Vista, onde são negociados os diamantes extraídos de forma irregular em território venezuelano e exportados ou traficados com selo guiano.

Perigo triplo - Isso somente é possível, alega a PAC, devido aos controles pífios no Brasil e na Venezuela. “A existência dessa rota ilícita coloca Venezuela, Guiana e Brasil na lista dos países que violam o Certificado Kimberley”, diz o relatório, intitulado “Perigo triplo – Formulários triplos e fronteira tríplice: controlando as exportações de diamantes da Guiana”. Na lista de recomendações finais, a PAC alerta que, se o Brasil não for capaz de fornecer detalhes para acabar com a importação e exportação ilegal na tríplice fronteira, será necessário suspendê-lo do Certificado Kimberley. O mesmo alerta foi feito à Venezuela.

Pelo menos três grandes comerciantes brasileiros, de Roraima, mantêm escritórios na cidade venezuelana de Santa Elena. Em Roraima, não há quase nenhuma mina ativa. Os próprios comerciantes revelam que pegam as pedras na Venezuela e as classificam em Boa Vista. Contudo, informações do próprio DNPM revelam que Roraima nunca emitiu um Certificado Kimberley. Essas gemas ganham o mundo via Gergetown, na Guiana.

No ano passado, a PAC já havia revelado detalhes da fraude de um certificado brasileiro. Em março deste ano, constatou que um quarto dos certificados de origem dos diamantes brasileiros é falso, e assegurou também que mais da metade da produção de gemas registradas pelo DNPM tem origem desconhecida e suspeita. Agora, conta a história dos diamantes da Guiana – que movimentam US$ 43 milhões anuais – e coloca os brasileiros como principais atores da indústria de gemas guianas.

Minas na rota da visita - A inspeção internacional dos integrantes do Certificado Kimberley interessa especialmente a Minas Gerais, oficialmente o maior produtor de diamantes do país. Na rota da visita estão Coromandel, Belo Horizonte e Diamantina, cidades mineiras que garantem fachada legal às gemas produzidas no Norte do país e até em países africanos, como o Estado de Minas revelou, com exclusividade, na série “Diamantes da ilegalidade”, publicada a partir de outubro de 2004.

A equipe chega para avaliar a suspensão brasileira do Processo Kimberley, proposta pela organização não-governamental Partnership Africa Canada no mês passado. A PAC demonstrou detalhadamente a corrupção, fraude e a má administração existentes na indústria de diamantes no Brasil. Em seis dias, pretende-se visitar áreas de garimpo em Minas Gerais para investigar o que deu errado no sistema de controle de diamantes no país e avaliar as medidas do governo brasileiro para aprimorar a emissão do certificado de origem e qualidade das gemas.

A exportação de diamantes brasileiros está suspensa desde fevereiro, quando a Polícia Federal, em parceria com o Ministério Público e a Receita Federal, desbarataram uma quadrilha acusada de contrabando de diamantes e sonegação fiscal, durante a Operação Carbono. O chefe do DNPM em Minas, Luiz Eduardo Machado de Castro, foi detido pelos federais e exonerado do cargo enquanto estava na carceragem da sede da PF em Belo Horizonte.

Desde o fim da Operação Carbono, o DNPM está mergulhado numa auditoria interna à procura de falhas e irregularidades no sistema de certificação em Minas, no Paraná e no Mato Grosso. Tenta esclarecer como, por exemplo, um quarto da produção brasileira foi declarada por um “fantasma”, homem que morreu dois anos antes de conseguir autorização para garimpar em Diamantina, e por um garçom que vive num abrigo para moradores de rua em São Paulo.

Apesar de a conclusão do relatório ter sido adiada por pelo menos três vezes, a expectativa é que o DNPM aproveite a visita da comissão internacional para divulgar as conclusões do trabalho, bem como as propostas para conter as fraudes. A primeira parada do grupo será em Brasília, onde visitará a sede do DNPM e discutirá os problemas do Brasil. Amanhã, a equipe segue para Coromandel, depois passa por Belo Horizonte e visita Diamantina.
(Correio Braziliense, 24/04/06)

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