Venezuela faz do Paraná seu principal aliado por um novo modelo de desenvolvimento regional
2006-04-25
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, anunciou que o país irá desenvolver
com apoio do Governo do Paraná o cultivo de soja convencional na savana do Rio
Orinoco. A parceria faz parte do pacote de acordos assinado entre Chávez e o
governador Roberto Requião na quinta-feira (20/04), em Curitiba, durante o 2.º
Encontro Interregional pela Integração com o Paraná.
"Sabemos que o Paraná produz soja não-transgênica, que em grande parte é
vendida à Europa, que não compra soja transgênica. Não conhecia este detalhe,
que me foi alertado pelo governador Requião", disse Chávez em entrevista
coletiva concedida no final da tarde a jornalistas de toda a América Latina,
no Palácio Iguaçu.
Além de comentar a integração com o Paraná — que segundo ele "têm um tremendo
impacto social, econômico e geopolítico" e aprofundam o processo de integração
da América do Sul —, Chávez falou sobre a saída da Venezuela da Comunidade
Andina, da intenção do país de integrar-se definitivamente ao Mercosul, e da
alta do preço do petróleo no mercado internacional.
Leia a seguir os principais pontos da entrevista de Hugo Chávez
Integração Paraná-Venezuela
"As relações entre Brasil e Venezuela experimentaram um fortalecimento que
nunca houve antes na história na profundidade e sinceridade das relações
políticas, econômicas e sociais. Brasil e Venezuela caminham de mãos dadas.
Muito mudou nos últimos sete anos, após a revolução bolivariana chegar ao
poder na Venezuela. Minha primeira viagem como presidente eleito foi a Brasília,
em 1998. Desde então nos dedicamos a transitar por esse caminho, o eixo
Caracas –Brasília. As relações seguem avançando e também se regionalizando, há
três anos, desde que Lula chegou ao governo do Brasil."
"Firmei com o companheiro governador Roberto Requião o compromisso de
trabalharmos juntos em diferentes projetos, desde que nos encontramos pela
primeira vez em Porto Alegre, no Fórum Social Mundial. O governador me visitou
em Caracas do ano passado, quando firmamos 27 documentos, conformando uma
nutrida rede de acordos e de intenções. E agora, depois de um intenso trabalho
de muito meses, firmamos um conjunto de documentos que envolvem 40 projetos de
desenvolvimento conjunto, desde a área ambiental à científica e tecnológica,
com o desenvolvimento do software livre, num esforço para nos livrarmos da
ditadura das corporações transnacionais."
"A visita de hoje, pela qual agradeço o governador e sua equipe, aprofundam e
ampliam esta excelente relação, que é tão necessária para o que chamamos de
projeto de integração sulamericana. Brasil e Venezuela têm um grande papel a
cumprir na integração das nações na grande nação sulamericana, e estão
assumindo esta responsabilidade.
Soja pura na Venezuela
"Firmamos compromisso para trabalharmos juntos para plantar soja
não-transgênica em centenas de milhares de hectares na savana norte do Rio
Orinoco. Conversei muito com o governador sobre o tema. Sabemos que o Paraná
produz soja não-transgênica, que em grande parte é vendida à Europa, que não
compra soja transgênica. Não conhecia este detalhe.
Acordos de cooperação
"Os acordos que firmamos hoje incluem a criação de uma empresa mista para
processar matéria-prima venezuelana, como ferro, bauxita, fertilizantes,
programas sociais, moradia. Eles têm um tremendo impacto social, econômico e
geopolítico. Para além deles, está em construção o que já disse meu amigo
governador, a Alba. Somos contra a Alca. Temos um confronto, e temos que
vencê-lo. Não podemos permitir que nossos povos se transformem em colônias
norte-americanas. Quando começarem a chegar carregamentos de ferro, de aço
venezuelanos ao Paraná, chegarão décadas de história, de gerações e gerações
de venezuelanos. Quanta gente foi necessária para explorar, transformar nossas
matérias-primas em produtos, para transportá-los. Estamos usando nosso
potencial humano, econômico, social, rumo à Alba."
"Estamos implantando o modelo de desenvolvimento endógeno, que implica em pólos
de desenvolvimento. Temos, por exemplo, o projeto de desenvolvimento da
cafeicultura, no Estado de Lara, para recuperar o desenvolvimento produtivo
que perdemos. É um conceito baseado no socialismo – estamos primeiro dotando
os camponeses de terra, tecnologia, organização, financiamento e maquinário
para produção. Até hoje, 90% dos produtores passavam a vida colhendo café e
terminavam cada mais pobres. Pois as empresas compravam o café verde muito
barato, beneficiavam e o vendiam muito caro."
Política externa
"Os que desejam um conflito aberto entre Venezuela e Colômbia terminarão
frustrados. Estamos condenados a andar juntos. Somos como irmãos siameses,
como diz Horácio Serpa Uribe, um grande amigo colombiano. Vamos discutir muitas vezes, mas não vamos lutar. Esse é o espírito que reinará sempre na América do Sul."
"Falam de império venezuelano, que a Venezuela quer formar um império. Quando
se fala de imperialismo, falamos da mão ossuda e peluda do império
norte-americano. No Brasil, quando não teria feito João Goulart pelo povo
brasileiro. Quem derrotou João Goulart em 1964? Era um presidente populista.
Pois aqui também há um populista, um populista radical. Então, começam a
conspirar contra nós."
Comunidade Andina
"Em Mar del Plata, a Alca foi enterrada pelo Mercosul. Que descanse em paz.
Mas o império não descansa, tem um plano B – o Tratado de Livre Comércio. A
Colômbia firmou um Tratado de Livre Comércio com os EUA. O país mais impactado
com isso é a Venezuela. E também sofrerá o Brasil, de alguma maneira."
"A Comunidade Andina está morta. Foi morta pelos Tratados de Livre Comércio. A
Venezuela vai renunciar à Comunidade Andina. Ela está morta. Vamos faze-lo de
acordo com o que manda a lei. Quando estivermos totalmente livres da Comunidade
Andina, vamos estar plenamente incorporados ao Mercosul, a um novo Mercosul,
fundado na complementação econômica, e não na concorrência, na solidariedade,
na luta contra a pobreza e a exclusão."
Petróleo
"Em 1998, o barril do petróleo venezuelano custava US$ 7. Era um presente aos
compradores estrangeiros. O preço justo, hoje, é US$ 50. "Antes de ser invadido
pelos EUA, o Iraque produzia mais de 2 milhões de barris de petróleo por dia.
Os norte-americanos planejavam produzir 3 milhões de barris após a invasão. O
resultado é que, hoje, não produzem sequer um milhão de barris. Por quê? Pois
explodem os poços, os oledutos, os terminais. E agora se fala em invadir o Irã,
que produz mais petróleo que o Iraque, é mais armado, irá oferecer mais
resistência. Há um conjunto de fatores que faz com que o preço do petróleo
continue subindo."
"Há que se preparar para uma era pós-petroleira. Nos EUA, secaram os poços,
assim como no Mar do Norte. E, de maneira irresponsável, o mundo segue
desperdiçando energia. As reservas de petróleo estão se esgotando. Em Nova
York, em Washington, mais de 80% dos veículos levam apenas um passageiro – o
motorista. Queimando combustível, poluindo o meio ambiente. Isso é uma loucura.
E mais loucos somos nós, que queremos copiar esse modelo. Não há recursos para
tanto consumismo. Chegará o dia em que veremos cemitérios de automóveis, pois
não haverá mais combustível para eles."
Gasoduto do Sul
"Tenho reunião com os presidentes Lula e Nestor Kirchner para discutir o plano
da construção do Gasoduto do Sul (entre Venezuela, Brasil e Argentina). A
Venezuela uma das maiores reservas de petróleo e gás do mundo. Estávamos
amarrados por acordos firmados pelos antigos governos venezuelanos. Tivemos
que esperar que eles vencessem. Agora, o gás será usado para o desenvolvimento
do povo venezuelano. Segundo, para o mercado interno da nação sulamericana. E,
depois, para outras partes do mundo. Pense em quanto podemos fazer com o gás na
América do Sul. Com as reservas de gás da Venezuela e da Bolívia, temos
energia assegurada para todo este século, para o desenvolvimento social, para
levar luz às moradias, para desenvolver tecnologia, para desenvolver nossas
indústrias. O Brasil não tem gás em seu território. O gás brasileiro está sob
o solo venezuelano. Por isso é importante tomar conhecimento de que somos uma
grande nação."
Capitalismo x socialismo
"Convido todos vocês a reabrir o debate entre o capitalismo e o socialismo. O
capitalismo é o caminho da perdição do mundo, da perdição real, da destruição
do mundo. O socialismo é o caminho da igualdade e da justiça."
(Informações
da Agência Estadual de Notícias do Paraná, 21/04/06)
http://www.ecoagencia.com.br/index.php?option=content&task=view&id=1559&Itemid=2