Só 1,21% paga multas ao Ibama
2006-04-20
Apenas 1,21% dos multados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), por infrações à lei de crimes ambientais, pagam o que devem. Em 2004 e 2005, o Ibama da Bahia somou R$ 122.544.054 em multas aplicadas e arrecadou apenas R$ 1.491.475,71.
Só os 30 maiores infratores que constam na superintendência do Ibama na Bahia acumularam multas no total de mais de R$ 92 milhões. Todos os classificados nesta categoria estão contestando as multas milionárias aplicadas pelo órgão. As alegações de defesa podem ser apresentadas em todas as instâncias administrativas pertinentes (no Ibama local, no Ibama Brasília, junto à ministra do Meio Ambiente e no Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama).
O superintendente do Ibama na Bahia, Júlio Rocha, não conhece as estatísticas dos recursos na esfera administrativa, mas observa que desde 2003 não tem nenhum caso de cancelamento de autos de infração emitidos na Bahia.
Se o infrator fizer todo este percurso e não conseguir ser perdoado, ainda poderá recorrer à Justiça, onde as chances são maiores. De acordo com a promotora pública Ana Luzia Santana, em seus 13 anos de carreira jurídica, nunca viu ninguém ser preso ou condenado pela prática de crime ambiental.
Multada em R$ 15 milhões, no ano passado, a Petrobras figura como o segundo maior devedor do Ibama. A empresa contesta a autuação por não concordar com a pecha de poluidor. -A Petrobras tem trabalhado muito para minimizar os impactos da atividade - ressaltou o gerente de comunicação da Petrobras, Rosemberg Pinto. -Não existe nenhuma multa que não entremos com recurso - afirmou. Para ele, o valor da multa de R$ 15 milhões é extremamente inaceitável. -Não estamos em débito. Há pendência judicial e só quando encerrar o processo saberemos se estamos errados, ou o Ibama - disse.
Ao mesmo tempo em que valoriza o fato de as multas milionárias serem mantidas em todas as instâncias do sistema federal de meio ambiente, o superintendente do Ibama afirma que, na verdade, o órgão não se interessa pela arrecadação, até porque nada retorna para o Ibama. Dos valores arrecadados, 90% vão para o Tesouro Nacional e 10% são destinados ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, que financia projetos de ONGs e órgãos ambientais, menos para o Ibama.
Para Júlio Rocha, o que mais importa é o efeito psicológico. -Para uma grande empresa, uma multa de R$ 600 mil é relativamente pequena, mas o impacto é maior para a sua imagem - afirmou. -Não é o montante que importa, mas o efeito psicológico - disse. Júlio justifica lembrando que, antes da lei de crimes, o teto de multas por danos ao meio ambiente era de R$ 4 mil. Com a lei, o responsável pelo dano passou a ser tratado como infrator, podendo ser punido com multas, ou com embargo da atividade, e restrição da liberdade por até cinco anos.
As multas milionárias também servem como instrumento de pressão para a solução de problemas protelados pelas empresas. Rocha comemora o fato de a aplicação de multas a algumas grandes empresas terem feito com que resolvessem velhas pendências.
MAIS RESPEITADO – Mesmo com o pífio percentual de arrecadação de multas ambientais no Estado, Júlio Rocha avalia como positivo o balanço da atuação do órgão. -O Ibama está mais respeitado - disse.
O valor da multa é arbitrado pelo fiscal responsável pela emissão do auto de infração, podendo variar de R$ 50 a R$ 50 milhões. O fiscal baseia-se nos valores de referência estabelecidos em normas do órgão. Assim é que o superintendente justifica a multa de R$ 30 milhões aplicada em novembro a um proprietário de terras na Chapada Diamantina por ter desmatado 205 hectares de mata nativa. -Ele usou a regra que determina o valor de R$ 1.500 a R$ 5 mil por hectare desmatado - observou.
Segundo o superintendente, as multas podem ser abatidas em até 90% quando o infrator cumpre as obrigações definidas em um termo de compromisso proposto pelo órgão para a melhoria da qualidade ambiental do local afetado.
Nem só de grandes multas se ocupa o Ibama. Na faixa de médios e pequenos infratores constam 71 pessoas físicas e jurídicas em valores multados que variam de R$ 100 a R$ 120 mil, sendo a maior parte inferior a R$ 10 mil. É neste universo que o órgão tem mais investido na conversão das multas em prestação de serviços ou na recuperação do dano. Dos 71 processos, 11 tiveram as multas anuladas por recuperação ambiental e 15 por prestação de serviço. O restante está com recuperação ambiental em andamento (23) e 22 estão sob análise do pedido para recuperação ambiental.
Ministério Público analisa eficácia da lei
As multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) são encaminhadas para os ministérios públicos estadual e federal. Nesses órgãos, as infrações são analisadas e podem fazer com que os infratores respondam na Justiça a processo crime ou administrativo. No período de 2004 e 2005, a Coordenação de Apoio Operacional às Promotorias de Meio Ambiente (Ceama), do Ministério Público Estadual, recebeu 293 autos de infração e os reencaminhou para os promotores dos municípios onde ocorreram as autuações.
O resultado dos processos é uma incógnita. Por falta de informatização das informações processuais, o MPE não sabe o que aconteceu aos infratores perante a Justiça. Para ter dados que possam levar a uma análise da efetividade da Lei de Crimes Ambientais, se contribuiu-se para a redução de danos ao meio ambiente, puniu-se de forma eficaz, o Ceama iniciou um levantamento no final do ano passado. Dados preliminares colhidos nos cartórios de Ilhéus, ponto de partida da pesquisa, indicaram, segundo a coordenadora do Ceama, Ana Luzia Santana, que muito tem a ser feito.
Regiões – Segundo ela, o julgamento dos crimes ambientais na esfera judicial resulta, na grande maioria, em transações como doação de cestas básicas. Para a promotora, isso se deve ao desconhecimento do espírito da lei de crimes ambientais - instituída em 1998. -A reparação do dano tem que ser feita no local do dano - afirma.
De acordo com o Ceama, a maior parte das infrações nos últimos dois anos ocorreu nas regiões extremo sul (82), litoral sul (57), oeste (36) e Médio São Francisco (20). Também tiveram número considerável, as regiões Recôncavo sul (17), serra geral (24) e sudoeste (14). O menor número ocorreu nas regiões da Chapada Diamantina (9), metropolitana (9), Paraguassu (9), nordeste (8), litoral norte (4), Baixo Médio São Francisco (3) e Piemonte da Chapada (2).
Multas do CRA são menores
O Centro de Recursos Ambientais (CRA), órgão estadual de meio ambiente, também aplica multas a infratores da lei de crimes ambientais. De acordo com a Constituição Federal, a proteção do meio ambiente é da competência de todos os níveis de governo, federal, estadual e municipal, com exceção dos casos em que a competência é exclusiva de algum ente.
O CRA aplicou o total de R$ 5.201.800 em multas ambientais nos anos de 2004 e 2005, conforme planilhas divulgadas pelo Sistema Estadual de Informações Ambientais (Seia). A maior multa aplicada foi no valor de R$ 400 mil à empresa Paraíso Empreendimentos Ltda., em setembro de 2005. A mesma empresa acumulou R$ 500 mil em três multas aplicadas em 2004 por danos causados a área de preservação permanente (APP) em Camaçari, para realização do evento Guarajuba Fest, no reveillon de 2004. As outras empresas envolvidas no mesmo evento, Cara Caramba Produções e Central do Carnaval foram multadas pelo Ibama na ocasião em R$ 1,2 milhão.
Neste mesmo período o CAR arrecadou R$ 1.194.000, que correspondem a 23 % do total de multas aplicadas. O diretor de fiscalização do CRA, Ronaldo Martins observa que o processo administrativo do órgão estabelece prazos para a apresentação de defesa, análise da defesa prazo para apresentação de recurso junto ao Conselho Estadual de Meio Ambiente - Cepram. -Caso não concorde com a decisão final do conselho, ainda poderá recorrer à justiça - disse ele.
10 maiores multas (2004/2005)
José Maria Dias
Destruiu 205, 7 ha de Mata Atlântica no parque nacional da Chapada Diamantina, em 16/11/2005. Mucugê.
R$ 30 milhões
PETROBRÁS
Destruiu recifes de corais levando à morte de espécies, em 31/11/05.
Salinas da Margarida
R$ 15 milhões
Dilermando Mendes de Faria
Vendeu lenha e carvão de origem ilegal. Autuado três vezes, a última em 3/8/05. Barreiras
R$ 9.482.035,00
Calsete Siderurgia Ltda.
Transportou carvão sem licença. Tem várias autuações, última em 9/10/05. Carinhanha.
R$6.319.543,00
Empresa Baiana de Águas e Saneamento
Poluiu manguezal devido a rompimento da tubulação da estação de tratamento de esgotos em dezembro de 2002. Ilhéus
R$3.202.000,00
Lusomar Maricultura Ltda
Ampliou estabelecimento de maricultura com
licença vencida, em 11/11/05. Jandaíra.
R$ 3 milhões
Concessionária Litoral Norte
Executou obras e serviços em desacordo com licença ambiental, em 18/10/05. Camaçari
R$ 3 milhões
Nolandis Empreendimentos e Participações
Construiu complexo hoteleiro em zona costeira em desacordo com normas legais, em 4/10/05. Mata de São João.
R$ 2 milhões
Luiz Tadeu Rasia
Desmatou 5,390 ha de floresta nativa sem licença ambiental, em 2/8/05. Riachão das Neves.
R$1.617.000,00
Nelson Yoshio Igarashi
Executou obras alterando curso dágua de riacho sem licença ambiental, em 30/4/04. Ibicoara.
R$1.500.000,00
(A Tarde, 19/04/06)