ISA lança livro “Mineração em Unidades de Conservação na Amazônia brasileira”
2006-04-13
A criação de Unidades de Conservação (UCs) na Amazônia é uma das principais políticas de proteção ambiental do governo Lula para a região. Dos quase 80 milhões de hectares existentes em UCs federais da Amazônia brasileira, 15 milhões foram criados em decretos assinados pelo atual presidente. O placar do governo Lula incluiu seis novas Unidades de Conservação de Proteção Integral (somando 5.718.505 hectares) e 21 UCs de Uso Sustentável (9.474.484 ha.), além da ampliação do Parque Nacional da Amazônia, no Pará, em 167 mil hectares. Uma pesquisa conduzida pelo Instituto Socioambiental (ISA), contudo, revela que boa parte destas áreas não está realmente protegida de uma das atividades econômicas de maior impacto ambiental: a mineração.
A partir de informações obtidas do Cadastro Mineiro, mantido pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) a pesquisa do ISA indica que, dos 40.144 processos existentes na Amazônia Legal, 5.283 incidem em UCs federais e 880 em UCs estaduais. Mais grave: do total dos processos minerários válidos no DNPM, 406 já estão em pesquisa ou em exploração em 32 Unidades de Conservação de Proteção Integral e em 23 Reservas Extrativistas (Resex), onde não é permitida a atividade minerária. Outros 571 processos estão em pesquisa ou em exploração em 33 UCs de Uso Sustentável, principalmente em Florestas Nacionais e Estaduais, nas quais a atividade é condicionada a uma série de requisitos. A apresentação desta pesquisa, que revela em profundidade uma situação de conflito entre o que determina a lei e o que ocorre “no chão”, é o prato principal de Mineração em Unidades de Conservação na Amazônia brasileira, publicação o que ISA lança no próximo dia 18 de abril, em Brasília.
Enquanto a legislação ambiental proíbe expressamente o uso direto dos recursos naturais em Unidades de Conservação de Proteção Integral e o condiciona, em UCs de Uso Sustentável, à categoria de conservação, do zoneamento e/ou plano de manejo, as oitenta e oito UCs da Amazônia sob pesquisa ou exploração de empresas mineradoras podem estar sendo alteradas por uma série de atividades de alto impacto ambiental. Entre as principais: a emissão de resíduos gasosos, líquidos e sólidos, a poluição sonora, o transporte de resíduos, minérios e equipamentos, infra-estrutura viária e de energia, tráfego de veículos de grande porte, como caminhões, escavadeiras e helicópteros, acampamentos, abertura de picadas, trincheiras, poços, trilhas, bacias e depósitos de rejeitos, construção de prédios, habitação e circulação de trabalhadores, explosões, escavamentos, supressão de cobertura vegetal, beneficiamento de minérios, intervenções em áreas de preservação permanente, em abrigos de fauna nativa, e a
supressão de vegetação de uso tradicional por populações locais.
Títulos devem ser anulados
Para qualificar e quantificar a pressão dos interesses minerários sobre a floresta amazônica a nova publicação do ISA lapida informações sobre requerimentos e alvarás de pesquisa, concessão de lavra empresarial e concessão de lavra garimpeira incidentes nas UCs da Amazônia. Os dados obtidos junto ao DNPM foram relacionados com os perímetros das UCs federais e estaduais, digitalizados pelo Laboratório de Geoprocessamento do ISA com base nas coordenadas geográficas descritas nos decretos presidenciais e de governos estaduais que criaram as UCs. O cruzamento desses dados espaciais possibilitou a organização dos interesses minerários por empresa, tipo de minério, número de processos e extensão em cada UC da Amazônia cujo subsolo está requerido para pesquisa ou lavra. Na publicação, todo este trabalho de monitoramento, organização, cruzamento e análise de dados e informações é apresentado em forma de tabelas didáticas.
As tabelas indicam, separadamente para as UCs federais e as estaduais, os títulos minerários que devem ser anulados por incidirem em UCs de Proteção Integral e em Resex, o que contraria a legislação. As tabelas também organizam as Unidades de Conservação por categoria (Proteção Integral ou Uso Sustentável) e trazem o nome da mineradora, a fase do processo, tipo de minério e a quantidade de processos. O livro ainda oferece um quadro geral das UCs com nome, uso, extensão, quantidade e área dos processos incidentes na unidade, e a porcentagem da unidade coberta por processos.
Há casos em que os requerimentos para mineração cobrem praticamente a área total das UCs, como é o caso da Floresta Nacional (Flona) de Carajás (99,51% da área requerida) e da Flona de Itacaiúnas (95,25%). Os interesses minerários muitas vezes se sobrepõem, gerando várias camadas de requisições de pesquisa sobre a mesma área. Para se ter uma idéia, se as áreas de processos incidentes na Flona de Carajás fossem somadas, o número equivaleria a 173% da área da UC.
Para subsidiar e aprofundar o debate em torno da regulamentação de atividades minerárias em UCs, Mineração em Unidades de Conservação na Amazônia brasileira traz também uma extensa análise e contextualização da legislação vigente sobre o assunto. Durante o trabalho de pesquisa e elaboração da publicação, foi analisado um conjunto de leis, instruções, pareceres, além dos decretos de criação e de regulamentação de UCs, incluindo o SNUC - Sistema Nacional das Unidades de Conservação - que define o uso dessas áreas. Uma seleção desses documentos consta da parte final do livro.
A pesquisa sobre os interesses minerários na Amazônia é uma das atividades do Programa Monitoramento de Áreas Protegidas do ISA e vem sendo realizada há 20 anos. Se inicialmente o trabalho se restringia aos interesses no subsolo das Terras Indígenas (TIs), a partir de 1994 a pesquisa estendeu-se também às UCs na Amazônia Legal, sendo Mineração em Unidades de Conservação na Amazônia brasileira a primeira publicação com foco exclusivo neste tema. Anteriormente, outras três publicações do ISA trataram de interesses minerários em TIs, a mais recente delas lançada em junho de 2005 . A mineração em áreas indígenas, atualmente proibida, também é tema de um Projeto de Lei que deve ser apresentado este mês pelo governo federal para sua regularização.
(ISA, 12/04/06)