Transposição do Rio São Francisco pode ficar no papel
2006-04-10
Maior promessa de obra do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o projeto de transposição das águas do Rio São Francisco está parado desde o fim do ano passado, corre o risco de não sair do papel antes do início do processo eleitoral e dificilmente o presidente terá o que mostrar até o fim do seu mandato.
Opositores da obra conseguiram liminares na Justiça e paralisaram a licitação. Mas o governo mantém o discurso e diz que tão logo o Supremo Tribunal Federal (STF) decida a questão, o Batalhão de Engenharia do Exército poderá começar a primeira etapa do projeto, agora chamado de revitalização e integração de bacias do São Francisco.
Confiança - A saída do cearense Ciro Gomes do Ministério da Integração Nacional para disputar as eleições não compromete o empenho do governo pela obra. Seu substituto, o também cearense Pedro Britto era o coordenador do projeto e é homem de confiança de Ciro. Britto diz que até o fim de 2008 a obra será inaugurada.
"Com a liminar, nada está sendo feito. O projeto está parado", disse Britto. "A Justiça tem todas as informações técnicas do projeto. Agora temos de aguardar a decisão da Justiça, pelo sim ou pelo não. A nossa expectativa é que seja pelo sim. Outras liminares já foram derrubadas", disse.
O ministro admitiu que dificilmente o presidente Lula terá o que mostrar da transposição do São Francisco durante a campanha eleitoral: "Obra em si, acho que não terá. Não há tempo prático".
A retomada do processo de licitação, suspenso em outubro do ano passado, depende de decisão do STF, que tomou para si a responsabilidade das ações envolvendo a transposição, porque o São Francisco é considerado um rio federal — cruza cinco estados diferentes — e os interesses de alguns desses estados divergem do que quer a União. O relator de quatro ações diferentes, duas da Bahia, uma de Sergipe e uma de Minas Gerais, é o ministro Sepúlveda Pertence, mas a data do julgamento não está marcada.
Eleições impedem licitação
Além das ações na Justiça, o governo terá outro problema para levar adiante o projeto de transposição do Rio São Francisco: a legislação eleitoral proíbe a assinatura de novos contratos a partir de 1º de julho. Portanto, o governo tem menos de três meses para revertar decisões judiciais, retomar o processo licitatório e assinar contratos com as empresas ou consórcios vencedores. Para o ministro da Integração, Pedro Britto, dificilmente os contratos serão assinados antes do início do processo eleitoral.
"Governo é assim mesmo. As obras têm esse tipo de enfrentamento", disse o ministro Britto.
O projeto deste governo prevê a construção de dois canais de concreto, num total de 662 quilômetros. O canal Leste, com 220 quilômetros, levará água para Pernambuco e Paraíba. O Norte, com 402 quilômetros, passará pelo Ceará, pela Paraíba, pelo Rio Grande do Norte e por Pernambuco. O custo da obra é de R$ 4,5 bilhões e o prazo de execução de dois anos.
Para evitar a demora da licitação, o governo optou por fazer a primeira etapa da obra com o Batalhão de Engenharia do Exército.
Opositores mobilizados
Segundo o ministro Pedro Britto, R$ 100 milhões foram repassados para o Ministério da Defesa para a primeira etapa da obra, que consumirá pelo menos seis meses.
O atraso no projeto de transposição não desmobilizou a parcela da população nordestina, especialmente da Bahia e de Sergipe, contrária à medida. Mas as dificuldades impostas ao governo pelas três liminares concedidas pela Justiça, que barram o início da obra, são festejadas como uma vitória.
Dono de uma das principais vozes contrárias ao desvio das águas do Velho Chico, o governador da Bahia, Paulo Souto (PFL), diz que os rounds vencidos até aqui são uma vitória de todo o Brasil.
"Esse projeto é tecnicamente, ambientalmente e economicamente inviável, de modo que se ele for reformulado, reestruturado, será uma vitória de todos e não apenas de nosso estado", diz Souto.
Inimigo político do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governador de Sergipe, João Alves (PFL), assinala que o governo federal está fazendo recuo estratégico, por não ter como avançar, diante dos impedimentos legais.
(Jornal de Brasília, 09/04/06)