Agricultoras de Santa Catarina resgatam sementes crioulas
2006-04-07
Elas vieram na bagagem dos imigrantes e ajudaram a matar a fome dos colonizadores que fundaram as primeiras cidades do Sul de Santa Catarina. Depois de quase extintas as sementes crioulas ganham novamente espaço nas hortas e lavouras da região. O trabalho de recuperação desta parte da história da agricultura catarinense começou há cerca de seis anos e é comandado pelo Movimento das Mulheres Agricultoras, com o apoio da Epagri. "A iniciativa partiu do movimento delas e está ficando cada vez mais forte. Estamos apenas dando nosso apoio, auxiliando na organização dos encontros e fortalecendo ainda mais o trabalho", explica a técnica agrícola Vanessa Ferreira do Nascimento. Segundo ela, todo o trabalho é feito através do sistema de troca e envolve trabalhadoras de todo o Estado. "As sementes vão se proliferando através de um sistema de troca. Se eu tenho uma semente antiga, passo para minha vizinha em troca de outra que eu não possuo", conta Vanessa.
Ela lembra que o maior objetivo deste projeto é impedir que estas sementes se percam no tempo. "Elas não produzem tanto quanto as sementes híbridas e nem são tão resistentes, mas têm uma importância histórica. São espécies raras, que não sofreram alteração e que até hoje são tratadas com a mesma técnica usada no período da colonização", argumenta.
Aos 53 anos, dona Maria Dassoler não esconde o orgulho de ver brotar no fundo de seu quintal, em Linha Torrens, Morro da Fumaça, as mesmas sementes que eram usadas por sua avó. "Eu via a minha nona plantar isso. Ela recebeu as sementes da mãe dela. Faço questão de colher as sementes com carinho, secar tudo, guardar e distribuir para as minhas amigas. Isso me dá uma satisfação muito grande. Resgatar esta história me faz bem", revela.
Depois de quase seis anos coletando e trocando sementes a agricultora já tem uma coleção invejável. "Tenho milho branco, que é bastante raro e muito apreciado, variedades de abóboras e feijões de vagem, que são bem mais gostosos do que estes que a gente encontra por aí", garante.
Entre as sementes recuperadas algumas em especial chamam a atenção. Uma delas é uma cebola de cor avermelhada e de formato alongado. "Ela não tem acidez e é bem mais saborosa que as cebolas comuns. Você não encontra semente dela em nenhum lugar. Por isso, plantamos e deixamos até florescer para guardar as sementes. Outra coisa interessante que tenho é um chuchu amarelo que é bem maior e mais "carnudo" que os tradicionais", destaca.
Parceira de dona Maria neste projeto, a agricultora Neiva Grapglia, 41, ainda não tem uma coleção de sementes tão variada, mas garante que está satisfeita com os resultados. "Estamos apreendendo muito neste projeto e nos encontros que realizamos. Há uma troca de experiências muito interessante", explica a agricultora. Em seu acervo há abóboras e mandiocas gigantes e um milho de pipoca que encanta pela cor roxa.
(A Notícia, 07/04/06)