Ongs pedem moratória da monocultura de árvores
2006-03-28
Entidades ambientais internacionais pediram ontem à tarde (27/03) no Fórum Global da Sociedade Civil, paralelo à 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP8), moratória global para as monoculturas de árvores exóticas e transgênicas. O pedido foi feito durante o seminário Monocultura de Árvores – Uma Ameça à Biodiversidade. Os grupos temem que a introdução de espécies transgênicas agrave os danos à biodiversidade já observados na monocultura de árvores – especialmente acácia, eucalipto e pinus –, como a polinização de espécies nativas.
Um dos biomas sob risco potencial seria o pampa gaúcho, área brasileira de gramíneas que integra um bioma transfronteiriço, com territórios no Uruguai e Argentina. De acordo com Carla Villanova, da organização Núcleo Amigos da Terra, empresas de celulose estão se aproveitando da deterioração da economia da chamada Metade Sul do Rio Grande do Sul para comprar terras anteriormente ocupadas com atividades de pecuária e nelas estabelecer plantações de árvores para obter matéria-prima para o processamento e exportação de papel e celulose.
As maiores áreas seriam da Aracruz (70 mil hectares), Votorantim (68 mil hectares) e da corporação sueco-finlandesa Stora Enso (65 mil hectares). O aumento das áreas ocupadas com monoculturas preocupa os ambientalistas, já que o bioma do pampa não é adequado ao cultivo intensivo de árvores. Ana Paula Fagundes, da organização Defesa da Vida Gaúcha, lembrou que a qualificação de “reflorestamentos” que as monoculturas de árvores exóticas ostentam não é adequada. “Florestas são ecossistemas complexos; não é o caso da monoculturas de árvores”, disse. Estes “reflorestamentos” já ocupam 1,42% do território gaúcho, e as empresas do setor pretendem elevar este percentual a 3%.
Pesquisa publicada na revista estadunidense Science, divulgada no final de 2005, constatou que no pampa argentino a monocultura de eucaliptos acabou reduzindo em 52% o fluxo de cursos de água próximos e provocou ressecamento completo de 13% dos rios e arroios, além de aumentarem o nível de aridez da terra.
Os ecologistas temem também pela biodiversidade, já que o pampa gaúcho possui 26 espécies animais sob risco eminente de extinção. A proposta de moratória de monocultura de árvores já foi apresentada ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), como também aos governos do Uruguai, Argentina e Paraguai, para que se suspenda o plantio de novas áreas até que pelo menos estudos de impacto ambiental sobre as espécies transgênicas sejam concluídos e apontem para a inocuidade ou baixo impacto.
Grupo de trabalho
Visto como área de pastagens, que se prestava apenas à pecuária, o pampa não teve seu valor de biodiversidade reconhecido até 2004, quando foi aceito oficialmente nesta condição pelo Ministério do Meio Ambiente. Para que esta comunidade biológica possa ser objeto de ações, políticas e programas que a levem ao desenvolvimento sustentável, o Ministério do Meio Ambiente criará o Grupo de Trabalho (GT) do Bioma do Pampa na quinta-feira. A assinatura da Portaria que cria o GT acontece no estande do MMA na COP8, às 13horas.
Segundo Sílvio Botelho, diretor de programa da secretaria executiva do Ministério do Meio Ambiente, a proposta do GT é envolver as três esferas de governo, bem como organizações da sociedade civil para discutir, ao lado da preservação do bioma, formas de aprimorar o desenvolvimento econômico da região em bases sustentáveis. A primeira ação do GT deve ser a reelaboração do bioma a partir de novas informações sobre o bioma.
Para Carla Villanova, a monocultura de árvores é apresentada como uma solução econômica para a região, sem se considerar o desenvolvimento ambiental. Para ela, soluções em fruticultura, turismo rural e fortalecimento da pecuária poderiam prover um desenvolvimento mais harmônico para o pampa.
A Metade Sul, onde fica a região do Pampa, é a de mais antiga ocupação no Rio Grande do Sul e apresenta problemas de desenvolvimento econômico. Embora tenha 25% da população do Estado, responde por apenas 15% do PIB. Trata-se de uma planície que foi disputada entre portugueses e espanhóis nos séculos XVII e XVIII, e que, sob poder lusitano, foi repartida em sesmarias – os futuros latifúndios. A pecuária e rizicultura extensivas praticadas na região não se mostraram rentáveis nas últimas décadas. No entanto, o bioma é relativamente preservado, já que, entre outros fatores, o movimento cultural tradicionalista gaúcho, com forte ligação com a região do pampa, apregoa uma postura de conservação da terra. Segundo Botelho, os tradicionalistas gaúchos vão integrar o grupo de trabalho, fornecendo elementos de cultura imaterial para os debates.
Para saber mais:
Defesa da Vida Gaúcha – www.defesabiogaucha.org
Núcleo Amigos da Terra - www.natbrasil.org.br/
1º Seminário Bioma Pampa (que discutiu a criação do GT) - http://www.bage.rs.gov.br/eventos/bioma/pmb_bioma.php
Por Adir Nasser Junior, Assessoria de Imprensa COP8/MOP3