Wal-Mart decide priorizar produtos orgânicos, preocupando produtores
2006-03-28
A maior cadeia de varejo do mundo decidiu dedicar esforço máximo aos produtos
orgânicos, decisão que, segundo os especialistas, pode ter o mesmo efeito sobre
as práticas ambientais que a Wal-Mart exerceu sobre os preços em geral, forçando concorrentes e fornecedores a acompanhar suas práticas. Oferecer novos itens à venda neste ano em suas lojas, de roupas de bebê de algodão orgânico a peixes
capturados de maneiras que não prejudiquem o ambiente, é parte de um pacote
ecológico mais amplo lançado no ano passado a fim de atender à demanda dos
consumidores, reduzir preços de itens como a energia e preservar e melhorar a
reputação maculada da empresa.
Os produtos orgânicos seriam um dos fatores de atração para os consumidores de
maior poder aquisitivo que o Wal-Mart tenta trazer às lojas, disse Alice
Peterson, presidente da Syrus Global, consultoria sediada em Chicago. Um novo
Supercenter Wal-Mart inaugurado nesta semana em Plano, subúrbio de Dallas
(Texas), oferece mais de 400 alimentos orgânicos em sua lista de produtos, como
parte de uma experiência para determinar que tipo de produto e decoração atrai
os consumidores mais ricos.
"Como muitas grandes empresas, eles compreenderam que apoiar as coisas em que
os americanos estão cada vez mais interessados é bom em termos de marketing e
benéfico à sua reputação", disse Peterson. Lee Scott, do Wal-Mart, não é o
primeiro presidente-executivo a advogar a sustentabilidade, termo que designa a
maneira corporativa de fazer negócios de maneiras que beneficiem o ambiente. A
General Electric, uma gigante da indústria, por exemplo, no ano passado lançou
um programa conhecido como Ecomagination para levar tecnologias ecológicas como
a energia eólica ao mercado.
O que torna únicos os esforços do Wal-Mart, porém, dizem especialistas em
sustentabilidade, é o tamanho da cadeia de varejo e o poder que isso lhe confere
em suas relações com os fornecedores. A Wal-Mart trabalha em estreito contato
com os fornecedores para direcionar o desenvolvimento de produtos, se eles
querem colocá-los nas prateleiras das quase 4.000 lojas da rede nos EUA e 2.200
lojas internacionais.
"Eles têm um imenso potencial, porque não estamos falando só do Wal-Mart.
Estamos falando de toda a sua cadeia de suprimento", disse Jeff Erikson, diretor
da SustainAbility, consultoria de Londres. Erikson disse que o Wal-Mart poderia
exercer pressão semelhante sobre os preços dos produtos orgânicos à que vem
exercendo sobre os demais itens que vende e forçar concorrentes e fornecedores
a adotar práticas de negócios mais sustentáveis e a oferecer mais orgânicos.
"Adoramos ver empresas como o Wal-Mart tomando medidas como essa e fazendo
pronunciamentos como os que fizeram, porque seus tentáculos são tão imensos",
disse Erikson. O Wal-Mart planeja duplicar suas ofertas de legumes e verduras
orgânicas no próximo mês e continua à procura de mais produtos para oferecer em
áreas como hortifrutigranjeiros, têxteis, papel e eletrônicos. Stephen Quinn,
vice-presidente de marketing da empresa, disse que o Wal-Mart teria 400 produtos
orgânicos à venda até o terceiro trimestre deste ano "a preços característicos
do Wal-Mart".
Alguns críticos da empresa classificam o esforço como empreitada de relações
públicas. Mas outros dizem que o Wal-Mart poderia fazer diferença real e forçar
número suficiente de fornecedores a adotar práticas mais ecológicas.
O diretor-executivo do Sierra Club, Carl Pope, que é membro do conselho do
Wal-Mart Watch, uma organização criada por sindicatos para fiscalizar e criticar
a cadeia de varejo, disse que é cedo demais para dizer se a empresa conseguirá
realizar seus planos, mas considera que o impacto ambiental das medidas será
positivo.
"Acredito que a direção que decidiram tomar seja positiva. A questão é: eles
vão agir com força suficiente?", disse Pope. Alguns dos novos produtos serão
frutos do mar capturados por métodos menos danosos. O Wal-Mart no mês passado
anunciou planos para certificar junto a uma empresa especializada no Reino
Unido, a MSC (associada ao WFF), todos os seus frutos do mar apanhados em mar
aberto, garantindo que sejam capturados de modo sustentável. Isso pode levar a
uma mudança na forma de pesca do produto muito mais ampla já que o mesmo barco
pescaria para a rede e outros varejistas.
(Folha de São Paulo, 27/03/06)